Revista Rua


A que Tradição Pertence a Tradição Gramatical Russa
(To what tradition does the Russian grammatical tradition belong?)

Patrick Seriot

manuais pagãos, sem todas essas gramáticas, retóricas, dialéticas e outras perfídias vãs propriamente demoníacas: ela suscita a simplicidade e a humildade" (VISENSKY, 1955:23-24, citado por FRINCK, 1985: 31-32, tradução nossa).
 
            No entanto, a posição de Visenskij não é desprovida de contradições, pois às vezes ele tenta estabelecer a dignitas do eslavo principalmente comparando suas qualidades com as do grego e do latim. Em uma outra passagem, com efeito, ele defende o ensinamento da gramática e da retórica como um programa de estudo ortodoxo. (ibid.: 175-176).
 
            2) Um outro tipo de reposta a Skarga é constituído pelas tentativas de defender a dignitas do eslavo e de fundar sua norma gramatical: os letrados rutenos tendo freqüentemente efetuado sua formação nos estabelecimentos católicos lançam-se a fazer gramáticas do eslavo ruteno controvertido. Estas gramáticas são impressas sob os cuidados das confrarias ortodoxas, organizações culturais laicas, que receberam do patriarca de Constantinopla o direito de questionar a hierarquia religiosa. Um dos paradoxos característicos dessa época e desse lugar é que elas eram baseadas no modelo das confrarias religiosas católicas. É então pela recepção e imitação das estruturas “ocidentais” que elas pretendiam opor uma resistência eficaz à influência ideológica e religiosa, da qual essas estruturas eram precisamente os vetores. É preciso assinalar ainda que na Rússia moscovita a instituição das confrarias era totalmente desconhecida (cf. BARDACH, 1982).
            É por isso que o problema de saber se as três grandes gramáticas do eslavo publicadas na Polônia-Lutuânia ao final do século XVI e início do século XVII (L'Adelphotes, Lvov, 1951; a gramática de Zizanij, Vilna, 1596 e a de M. Smotrickij, Vilna, 1619) são inspiradas na tradição grega (Dionísio da Trácia) ou na tradição latina (Donato) não parece tão fundamental. É que as gramáticas gregas que Zizanij ou Smotrickij traduzem não provêm das bibliotecas bizantinas (quer dizer do Império Otomano), mas sim desse ocidente latino abominável: trata-se essencialmente da gramática grega de Lascaris (Milão, 1476) e daquela do luterano alemão Philipe Melanchton[21] (1497-1560) publicada em Lião, em 1554.
            Pode-se dizer que até o início do século XVI, se os tratados sobre a língua em Russo moscovita ou ruteno imitam ou traduzem os textos gregos, é menos a “tradição


[21]Seu nome Schwarzed foi helenizado como Melanchton.