Revista Rua


A que Tradição Pertence a Tradição Gramatical Russa
(To what tradition does the Russian grammatical tradition belong?)

Patrick Seriot

são calcados nos modelos gregos (Dionísio da Trácia). Bastaria mudar os exemplos mudando a língua. O mesmo ocorre com eslavos-ortodoxos, com o mesmo fenômeno de transferência cultural, com a particularidade de que: a) os modelos a imitar eram no início exclusivamente gregos; b) a língua a descrever e a colocar em regras não era o vernáculo, mas uma língua livresca já quase morta: o eslavo.
As primeiras gramáticas eslavas manuscritas e depois impressas foram abundantemente descritas em inglês (WORTH, 1983), em alemão (JELITTE, 1972; TOMELLERI, 1999), em francês (ARCHAIMBAULT, 1998, 1999). Trataremos aqui unicamente de algumas particularidades da gramatização do eslavo nos eslavos orientais.
Assim, começou-se a traduzir gramáticas nos países eslavos ortodoxos, mas uma questão se apresenta: de que língua se traduziam essas gramáticas e de que língua esses novos produtos eram a gramática?
O mais antigo tratado escrito em língua eslava que nós obtivemos é um manuscrito de uma curta gramática, incompleta, do eslavo, considerada por muito tempo como uma tradução de um tratado gramatical de Jean Damascène que de fato jamais existiu. Ele é designado agora como o “pseudo-Damascène”, compilação de textos mais antigos, realizada na Sérvia no século XV[17]. Trata-se mais de uma compilação do que da tradução de um único texto. Pelo modo de exposição do material, a terminologia, o modo de tratar os fatos gramaticais, o tratado segue muito fielmente a tradição grega. Alguns pesquisadores mostraram que, por exemplo, na ordem da apresentação do caso (NGADV onde o autor fala dos acidentes do nome, enquanto que nas outras passagens ele apresenta a ordem clássica NGDAV), ele segue uma lógica sintática própria a Apolônio, e não uma lógica semântica, própria a Dionísio (NIKOL’SKIJ, 1999). Logo, eles tiveram nessas traduções-adaptações de gramáticas clássicas dificuldades em distinguir as categorias próprias à língua a descrever. Assim, quantos casos havia no eslavo? De fato, tudo depende do modelo seguido: 6 caso se siga o modelo latino (traduzindo uma gramática latina, quer dizer criando um ablativo a partir de um sintagma preposicional confundido com a forma de caso), 5 caso se siga o modelo grego. Foi necessário esperar a gramática de Smotrickij (Viena, 1619) para que os 7 casos do eslavo fossem identificados, desta vez com o instrumental e o preposicional, mas sem ablativo. Quanto ao número dos tempos verbais no passado, ele


[17][ Cf. ARCHAIMBAULT, 1999: 44-45; WORTH, 1983: 14, sqq.