Revista Rua


Identidade e Pertença: Estilo de vida e disposição morais e estéticas em um grupo de jovens

Mauro Guilherme Pinheiro Koury

Uma relação delicada porque sujeita a interpretações e expectativas várias da ação ou da intenção pelo outro da relação ou do próprio sujeito da ação. O que tenciona a ação e aumenta a pressão pessoal e grupal sobre os sujeitos em cena. Proporciona, ao mesmo tempo, um aumento do autocontrole ou autodisciplina e um aumento dos mecanismos de segurança individual e grupal como forma de defesa daquele que impulsiona a ação e do outro, alvo da ação.
Relação sempre tensa porque movimentada por sentimentos de não correspondência de suas ações ao buscado e erigido pelo grupo. O grupo, deste modo, parece se situar além das ações individuais, esperando que os indivíduos a ele pertencentes sempre aprimorem o seu comportamento pessoal e suas atitudes em relação ao outro relacional.
É interessante notar que um dos elementos figurativos da expressão tenso, constante no Dicionário Aurélio de Língua Portuguesa, é muito aplicado. A busca do acerto das ações e a tentativa de confiar e ser confiável torna a relação entre os atores envolvidos tensa. O receio de errar ou não ser bem interpretado pelo outro da relação provoca um movimento de aprimoramento das ações e um crescimento do exercício crítico sobre o outro e sobre si mesmo, que aparece no momento da observação e análise como um misto de obediência, ou sujeição às normas e padrões morais do grupo, e de disputa silenciosa sobre quem melhor exprime e aprimora os valores grupais.

                Disciplina e Poder
Disputa silenciosa porque não confessada, ou não ousada afirmar, por cada membro individual dos Deltas. Muito embora o grupo promova uma espécie de pontuação sobre as ações consideradas exemplares realizadas por seus membros, e que servirão de espelho para os demais. Cada membro busca se orientar, ou guiar, na expressão do grupo, por essas ações-modelo. Ações, por sua vez, que se tornam motivo de orgulho para o grupo em geral e são contadas e exteriorizadas por todos como afirmação do ser Delta.
Em quase todos os depoimentos colhidos as ações-modelo são contadas para exemplificar o espírito Delta. Nestes depoimentos, idéias de sacrifício pessoal, de enobrecimento do outro, da autodisciplina e rigor disciplinar, são relatadas como forma de exemplificar o sentido de pertença ao grupo e o caráter nobre desta pertença. Ao mesmo tempo em que indicam a dificuldade de ser um Delta e o renascimento pessoal provocado pela pertença, visto quase como um rito de passagem (Van Gennep, 1978), onde a opção de se tornar um Delta coloca o sujeito da opção em um antes e um depois dela e situa esse mesmo sujeito em um lugar no mundo através e a partir dessa integração e reconhecimento.
               Galinha D’água é um cara da porra. Eu me miro nele toda vez que acho que vou fraquejar e não conseguir os meus intentos. Uns caras quiseram botar ele pra correr de uma parada, ameaçaram ele, mas ele conseguiu dobrar os caras e ainda trouxe depois três dele pra juntar-se aos Deltas... A gente não quis logo aceitá-los, mas ele foi demonstrando pra cada um que confiança se adquire dando