Revista Rua


As coisas-a-saber sobre uma cidade na Wikipédia e na Desciclopédia: Pouso Alegre entre edifícios e buracos
The 'things to know' about a city at Wikipedia and Desciclopedia

Ana Cláudia Fernandes Ferreira

 

silêncio ou silenciamento, que se subdivide em silêncio constitutivo, no qual uma palavra apaga outra necessariamente, e silêncio local, ou censura.
Neste trabalho, a forma mais observada é a do silenciamento, mais especificamente a do silêncio constitutivo, sem deixar de considerar, no entanto, na história da constituição dos saberes no Brasil, os possíveis efeitos de sua relação de tensão com o silêncio local. Assim, pensar os modos de constituição dos saberes sobre as cidades nessas enciclopédias é pensar também sobre o que é posto em silêncio sobre elas.
Os saberes são sempre divididos, re-divididos e hierarquizados em diversos tipos e de diversas maneiras. Na história da constituição destes saberes, a ciência teve, no positivismo do século XIX, uma posição de destaque. A ciência significa como o saber mais legítimo entre os demais saberes.
Pêcheux (1983), ao discutir como as diferentes ciências e técnicas lidam com o real para melhor administrá-lo, fala do funcionamento das “múltiplas coisas-a-saber”, tomadas como parte desse real. Elas são definidas como aquilo que representa “tudo o que arrisca faltar à felicidade (e no limite à simples sobrevida biológica) do “sujeito pragmático”” e, ao mesmo tempo, como “reservas de conhecimento acumuladas, máquinas de saber contra as ameaças de toda espécie”. Ou seja, ao mesmo tempo em que há uma busca pelo conhecimento das coisas-a-saber, elas significam como uma ameaça e, por esse motivo, precisam ser administradas, geridas. Há, aí, uma regulação do modo como algo a saber é apresentado, que produz espaços “logicamente estabilizados”.
O autor nos leva a compreender como o projeto de uma ciência régia, construída no interior das ciências humanas a partir do modelo das ciências exatas, está relacionado a uma demanda desse “sujeito pragmático” pela unificação da “multiplicidade heteróclita das coisas-a-saber em uma estrutura representável homogênea”.
Em outro trabalho, Pêcheux (1997) toma a relação entre os sujeitos e os saberes a partir de uma discussão sobre a construção do arquivo e sua leitura, tendo em vista a materialidade da língua e a divisão dos saberes na história.
Neste estudo, o autor começa por analisar a questão da leitura de arquivo através de uma história das ideias de duas culturas, designadas como “literária” e “científica”. Pêcheux busca observar, nessas culturas, como a língua é concebida, as maneiras distintas de ler o arquivo e o abismo que foi se ampliando entre elas. Ele observa que em ambas as culturas o fato da língua é contornado. A materialidade da língua é