Revista Rua


Futebol no Brasil: sentidos e formas de torcer

Simone Hashigutti

 

contrapartida, por exemplo, os são-paulinos são chamados pelos outros times de “bambis”, por representarem imaginariamente a classe média alta.
 
(24) (...) em relação ao Ricardinho, esse cara não merece vestir novamente o manto sagrado e msm q faça um gol de placa na bixara não vai apagar aquela imagem dele ajoelhada e beijar o simbolo dos bambis.
 
(25) (I10) Por que sou vascaíno? Eu sei ler e escrever, meu irmão.[18]
 
            Entre as torcidas, portanto, em suas provocações, na “zoação”, sempre ocorre referência aos traços sociais que a princípio as caracterizam, num jogo de palavras e representações simbólicas que provocam a permanência do sentido da rivalidade e dos próprios sentidos de suas identificações – “times de ricos”, “times de pobres” –, reforçando os sentidos que sustentam os processos de identificação social-exclusão.
 
O funcionamento das torcidas organizadas
 
O primeiro time a ter um grupo de torcedores se organizando institucionalmente foi o Corinthians, da cidade de São Paulo. O Grêmio Gaviões da Fiel foi fundado em 1969 e, segundo Pimenta (2003: 54), o que o caracterizou e diferenciou das “charangas”, por exemplo, que eram bandas musicais que vestiam roupas iguais e animavam seus times com tom carnavalesco a partir da década de 1940, foi a organização “burocrática/militar” e seu objetivo na fundação, “fiscalizar todos os erros praticados pelos dirigentes do S. C. Corinthians Paulista”, auto-intitulando-se “os representantes da nação corintiana” junto à Instituição-Clube”. O fato de que se constituíram como grupo para fiscalizar os dirigentes do time mudou a relação da torcida com a organização burocrática do próprio time: a torcida organizada passou a ser uma voz que se quis fazer ouvir e participar nas decisões do clube, isto é, ela pretendeu mexer nas relações de poder no futebol e tornar-se visível.
Para provocar o efeito de visibilidade, a torcida organizada instituiu novas práticas de torcida: coreografias, músicas, utilização de bandeiras, bandeirões, faixas, desenhos. Algumas delas, atualmente, se organizam também em escolas de samba, e levam suas “baterias” para o estádio. Essa nova organização provocou como efeito uma reorganização também do próprio espaço do estádio e da forma de controle da polícia, como é possível apreender no trecho de


[18]Numa referência aos flamenguistas, muitas vezes, nos relatos, identificados como “analfabetos”.