Revista Rua


Separação e mistura: alusões utópicas e imaginação espacial no filme A Vila
Separation and mixing: utopians allusions and spatial imagination the movie The Village

Antônio Carlos Queiroz Filho

devoradores de pessoas. O intuito era fazer com que os moradores não quisessem atravessar a floresta em direção às cidades. Eles utilizaram o imaginário da época em que eles escolheram viver para conseguir isso. Transformaram, primeiramente, a floresta num lugar de risco iminente. Associado a isso, fizeram do além-floresta – a cidade – um lugar do mal. Sua política se efetivava na produção do desejo e da imaginação como força mobilizadora do pensamento e da ação.
Essa é a imaginação espacial que o filme dá existência. Isso ficará mais claro nas descrições, imagens e interpretações realizadas a partir desse espaço fílmico. Cabe a pergunta: quê imagens podemos chamar para conversar com essas d’A Vila? Aproximações de sentidos que se estabelecem no movimento que se realiza de colocar em contato imagens outras que permeiam o universo cultural do espectador-pesquisador e as imagens do filme propriamente. Esse “colocar em contato”, é aproximar sentidos.
O pequeno vilarejo teve nas suas idealizações o alicerce de uma nova comunidade, de um novo modo de vida e isso só poderia ocorrer de uma única forma: para aqueles que produziram o lugar, é na separação daquilo que se deseja negar que existe a possibilidade de realização do projeto, do sonho em questão. É com esse pensamento que faço a primeira aproximação: o mundo das utopias. Ao tocarmos nele – pensamento utópico – somos remetidos para a ilha imaginária, descrita por Thomas More, no livro chamado Utopia. A vila nos colocou diante de uma espécie de atualização dessa obra literária.
A ideia da atualização ocorre quando, de alguma forma, as imagens do filme aludem algo presente na nossa cultura, mas que está fora dele. Quando aproximamos essas imagens e seus sentidos se coadunam, dizemos que o filme “atualiza” aquele pensamento ou aquela imagem. Quando afirmamos que a vila atualiza o pensamento utópico, não significa dizer que ele está no filme intacto, inteiro.
Atualizar é, portanto, tributário da própria interpretação; foge do tempo da história cronológica, pois não há uma fila, sequência ou ordem lógica a ser seguida. Um está no outro como se fosse uma ruína, muito mais na forma de traços e indícios. Cabe, então, olhar para esses indícios e realizar uma conversa mais próxima sobre a organização desses dois locais – utópicos – e, por conseguinte, sobre a relação de cada um deles no que diz respeito à sua forma de existir. Por esse motivo, não faz sentido para nós lidarmos com uma perspectiva de utopia que é bastante comum: aquela que assume a utopia um não-lugar, portanto a-espacial. Essa é uma perspectiva, por demais,