Revista Rua


Sujeitos ambulantes: pistas para uma nomadologia urbana
Wandering subjects: clues to an urban nomadology

Gabriel Schvarsberg

Tal forma de pensamento da interioridade, pela formulação de modelos e sua replicação parece, sem dúvida, caracterizar o pensamento urbanístico desde sua formação como campo disciplinar. A práxis urbanística talvez só seja de fato compreendida enquanto acoplamento a uma forma Estado, atuando somente através da mediação de seu aparato – jurídico, administrativo, modo de organização hierárquica. Mas seguirá limitando-se a esses condicionantes? É no sentido de tensionar esses limites que a inserção do pensamento nômade no campo urbanístico surge como instrumento que busca desligar-se e transpor esses contornos. Não seria o caso de buscar outros espaços, mas investir em outras possibilidades de investigação dos mesmos espaços, das mesmas dinâmicas, mas com outras lentes, escapando às categorias sedimentadas e recorrendo à construção incessante de novas ferramentas de ação. Pode-se pensar, portanto, na infiltração de uma nomadologia urbana no campo do urbanismo.
Os filósofos propõem que a existência nômade realiza um modo singular de se relacionar com o espaço que não seria simplesmente o movimento de vagar sobre a terra ad infinitum. Haveria, segundo os autores, uma distinção entre um caminho sedentário que “consiste em distribuir aos homens um espaço fechado, atribuindo a cada um sua parte, e regulando a comunicação entre as partes” e um trajeto nômade que, ao contrário, “distribui os homens num espaço aberto, indefinido [...]” (DELEUZE ; GUATTARI, 1997, p. 51; grifos originais). Assim, o modo sedentário, segundo a lógica de Estado, seria o do “estriamento do espaço por muros, cercados e caminhos entre os cercados; pela subordinação dos fluxos a condutos onde se pode controlar os movimentos; “fazer valer uma “zona de direitos” sobre todo um exterior” ( Idem, p. 59). O modo nômade, por sua vez, alisa o espaço, que fica “marcado apenas por traços que se apagam e se deslocam com o trajeto.” Num caso “mede-se o espaço a fim de ocupá-lo” e no outro “ocupa-se o espaço sem medi-lo” (Ibid., p. 25).
Se as práticas urbanísticas tomam geralmente por referência a organização dos pontos fixos da cidade e seus canais de comunicação – edificações, espaços edificáveis, parques, praças, etc. –, uma nomadologia urbana estaria mais interessada nos trajetos humanos, suas operações sobre o terreno, suas formas de espacialização, relações de arranjos, considerando-os sempre provisórios, inclusive as maneiras com que se relacionam com os pontos fixos.
Entretanto, a pista fundamental para uma nomadologia urbana, crítica às determinações capitalísticas sobre as cidades parece despontar quando os autores