Revista Rua


Sujeitos e sentidos no espaço urbano: o escrito "dá o ar da sua graça"
(Subject and meanings in urban space: writing shows up)

Aline Torrizella Périgo, Juliano Ricci Jacopini, Noemi Lemes, Soraya Maria Romano Pacífico, Lucília Maria Sousa Romão

produzindo o desconforto e a falta que remetem o sujeito ao lugar de não poder e de não dizer.
Observamos o mesmo movimento em alguns dos sujeitos que estavam na rodoviária diante da propaganda do sorvete; a não-identificação desses sujeitos com algumas palavras e sentidos possíveis instalados na/pela propaganda faz os mesmos se colocarem em uma posição inferior, atribuindo o desconhecimento dos enunciados do portador de texto àquilo que seria seus baixos níveis de escolaridade, como se isso fosse natural. Observamos que tal naturalidade acaba silenciando (ORLANDI, 1997) que há uma distribuição desigual de saberes e poderes em nossa sociedade e aqueles que não tiveram acesso a isso acabam, pelo efeito da ideologia, responsabilizando a si próprios pelo não-saber. Esse deslocamento do não-saber individual para as questões estruturais e conjunturais fica apagado e o que aparece é o sujeito responsabilizando-se por um acesso que ele não teve, culpabilizando-se pelo seu não-saber, tomando-o como causado por ele mesmo. Para que melhor entendamos, seguem-se alguns recortes dos discursos de sujeitos-mototaxistas que trabalham na referida rodoviária.
 
“Ah, você estudou só até a 4ª Série, você também não sabe não.” (Mototaxista 1 falando para Mototaxista 2)
“Isso aí é feito pra pessoa estudada, agora pra nós assim, isso aí não serve não.” (Mototaxista 2)
“Negócio de religião, né?” (Mototaxista 2)
 
Expõem-se nítidas, não apenas pelas falas, mas também pelas demonstrações de insegurança, de estranhamento, que esses sujeitos davam diante da possibilidade de responderem alguma coisa “errada”, as sensações de inferioridade dos mesmos diante de uma expressão desconhecida e a ilusão de que existe apenas um sentido possível e correto para ser atribuído ao texto publicitário. Sentido esse permitido para pessoas que freqüentaram a escola, como se esta fosse a única forma de acesso ao saber, como pode ser observado pelo enunciado “Ah, você estudou só até a 4ª Série, você também não sabe não”, em que o uso do advérbio “também” nos permite interpretar que este sujeito é um dentre os tantos que freqüentaram só até a 4ª série, uso este que deixa implícito que o baixo grau de escolaridade (4ª série) tolhe o poder de participação e inserção social dos sujeitos, que lhes bloqueia o poder dizer/escrever. Também nos chama a atenção a repetição do advérbio de negação “não”, “você também não sabe não”, em que a repetição cria um efeito de sentido de ênfase naquilo que deve ser ressaltado, que