Revista Rua


Do outro lado do muro: regionalidade e regiões culturais
On the other side of the wall: regionalities and cultural regions

João Claudio Arendt

 

cultural”, não tenha valor absoluto. Isso porque as diferentes nacionalidades que se manifestam como regionalidades no espaço social berlinense não coexistem de forma ecumênica. O simples fato de se nomear um espaço como chinês, indiano, turco, grego etc. implica hastear uma bandeira em prol antes da diferença, do que da união. Nomear implica instaurar fronteiras que dão acesso a um (micro)cosmo carregado de significados, os quais remetem tanto aos espaços regional e suprarregional, quanto aos espaços nacional e supranacional. A começar pelos caracteres gráficos nas fachadas e nos cardápios, passando pelos objetos que integram a decoração interna do ambiente, até a expressão linguística dos donos do estabelecimento – tudo tem que contribuir para a criação de uma atmosfera peculiar, dando a impressão de que se está, temporariamente, na Índia, na Turquia, na Grécia ou na China, e não numa ruela qualquer de Berlim.
Fazer parte de uma região ou de uma nação não significa apenas perfilar-se harmoniosamente ao modo de ser tradicional, mas, também ao contrário, esforçar-se ao máximo na marcação de uma diferença que possa ser notada como particularidade positiva. É assim que a proprietária do pequeno restaurante Saigon, por exemplo, situado na Richard-Wagner Strasse, recebe seus clientes para o almoço com um expansivo “Xin chào” e, na sequência, entabula um diálogo em alemão, entrecortado por palavras em vietnamita, difícil de ser compreendido até pelos berlineses nativos acostumados à penosa pronúncia dos milhares de imigrantes. Nas paredes que envolvem as cinco mesas do restaurante, há poucos adereços típicos, mas uma caixa de som sobre o balcão com música vietnamita e o cheiro dos temperos sendo manuseados na cozinha dão a nítida sensação de se estar no Vietnã ou em algum lugar do continente asiático. O cardápio, mesmo com os pratos nomeados de acordo com a origem e seus ingredientes discriminados em língua alemã, não faz menções regionais específicas. Têm-se aí nacionalidades e regionalidades confundindo-se, sobrepondo-se e constituindo uma sempre nova especificidade.
Regionalidades são, assim, especificidades que integram e constituem uma paisagem cultural – e aqui entendemos a região não como espaço limitado do ponto de vista dos seus significados, mas, ao contrário, como paisagem ampla, como potência cujo valor final é de precisão difícil. Há uma década, Pozenato (2001) advertia que a região sofre o injusto (esse adjetivo corre por minha conta) preconceito da limitação geográfica e cultural, ao ser tomada como espaço circunscrito a fronteiras provincianas, periférico em relação a um centro. Mas acredito que isso tudo seja apenas resultado das