Revista Rua


Do outro lado do muro: regionalidade e regiões culturais
On the other side of the wall: regionalities and cultural regions

João Claudio Arendt

 

refletido de volta para o espaço regional); o vinho, por sua vez, possui uma força mais centrífuga (a uva que se colhe na região é triturada, fermentada e manipulada de forma a atender não só o paladar regional, mas também o suprarregional). Uma leitura mais detalhada do contexto e do conteúdo dos dois exemplos revelaria muitas regionalidades encobertas (“arte-fatos”) da Serra Gaúcha (selo de origem/controle/qualidade), mas este não constitui o foco central da presente reflexão.
Contudo, é possível avançar na direção pretendida, utilizando o conceito de “loyalidade[2], que clarifica um pouco mais a relação de indivíduos e instituições com regiões (e nações). Utilizada pela primeira vez na década de 1970 nos estudos organizacionais de Albert Hirschman, a loyalidade implica, como sugere o próprio termo (em inglês, loyalty; em alemão, Loyalität), uma atitude de lealdade de uma pessoa para com uma empresa: “Quanto maior for a loyalidade de alguém em relação a uma organização, menores são as possibilidades de se afastar dela e, em razão disso, aumentam as chances de melhorar o seu desempenho” (MÜHLER; OPP, 2004, p. 17 – tradução minha). Trazido para a área dos estudos regionais por Mühler e Opp, o conceito de loyalidade pode ser igualmente empregado para medir o nível de identificação de pessoas com uma região:
Da mesma maneira que alguém pode ser “loyal” a uma firma ou organização, também pode ser “loyal” a uma cidade ou país, na perspectiva de que tem uma relação emocional com eles. (...) Se isso é assim, então a teoria de Hirschman é factível de ser aplicada para predizer alguns efeitos da identificação regional e, igualmente, da “loyalidade” com uma região” (MÜHLER; OPP, 2004, p. 17 – tradução minha).
 
Ora, em todas as formas de regionalidade regionalista residem traços marcantes de loyalidade. E não é outro o propósito das manifestações regionalistas, senão explicitar um sentimento de “lealdade” a uma história e a um modo de ser regionais. Em outros termos, significa assumir um caráter de respeito e fidelidade a princípios e regras que norteiam o comportamento de um grupo social.
Para que a loyalidade (em certo sentido, também sinônimo de “identificação”) dos indivíduos se estabeleça com uma região, Mühler e Opp (2004, p .23-27) levantam três hipóteses, que sintetizo a seguir:

[2]
Em razão de MÜHLER e OPP preferirem o termo Loyalität, que deriva do inglês loyalty, em vez de Treue ou Ehrlichkeit, opto aqui pelo neologismo “loyalidade” e não pelo vocábulo corrente “lealdade”, apenas para garantir o parentesco gráfico e semântico com o conceito original.