Revista Rua


Reescrevendo espaços: VRBS e natureza nas Silvae
Rewriting Spaces: VRBS and nature in the Silvae

Leni Ribeiro Leite

literária, como a do campo vs. cidade, ou espaço natural vs. espaço urbano, era de se esperar que estivesse presente.
O autor em que a tensão entre campo e cidade é marcadamente famosa é Horácio, como todos sabemos, tanto nas Odes como nas Epistulae. Em Horácio, porém, segundo Diana Spencer (2008:70-71), a tensão entre a paisagem poética helenística, rural, e a sua latinização, urbana, transforma-se em uma interrogação: é possível habitar uma cena poética que exclua o urbano, e a Roma Augustana? A paisagística lírica helenística parece não se resolver bem em Horácio ao se complicar com a contraparte urbana, de forma, que pelo menos ao fim do livro III das Odes, o portão do campo sabino se fecha, até que o portão da paisagem Albana de Estácio se abra para novas tentativas e indagações. Tentativas, porque uma das características mais proeminentes das Siluae é seu caráter experimental. As Siluae são poemas ostensivamente casuais, escritos “no calor do momento”, como diz o próprio autor no prefácio ao primeiro livro. No entanto, não se enganam os leitores com os pedidos de desculpas por uma obra pouco trabalhada, como não se enganaram com as nugae de Catulo, Marcial e tantos outros. Estácio está em profundo diálogo com a tradição, não só romana, mas especialmente com a grega, como mostrou Alex Hardie em monografia de 1983.
Talvez a principal característica de Estácio seja justamente este diálogo com a tradição que, ao mesmo tempo, a confirma e a refuta, transmutando elementos tradicionais em algo novo, jamais ouvido, mas que soa como algo já conhecido. Um excelente exemplo dessa força mantenedora-mas-transformadora talvez seja a própria questão do gênero das Siluae. Os poemas destes cinco livros sui generis não podem ser classificados em conjunto como pertencentes ao gênero elegíaco, lírico, epigramático ou qualquer outro dos gêneros tradicionais. Não é difícil, porém, classificar alguns dos poemas isoladamente, seja dentro dos gêneros tradicionais, seja dentro de gêneros retóricos, como Francis Cairns. O conjunto, porém, desafia a classificação. Esta questão genérica específica em Estácio será abordada por mim em outro momento, mas aqui, gostaríamos de mostrar como ele se refere a e incorpora elementos tradicionais de certos gêneros, em especial do lírico, recuperando Horácio, no que diz respeito às questões do espaço e da relação entre espaço urbano e espaço natural.
Alessandro Barchiesi mostrou como o gênero é um fator-chave para se ler as Odes de Horácio, compreendendo a coleção de poemas como uma sofisticada meditação acerca da interrelação complexa entre gênero, voz e identidade política na Roma augustana. Diana Spencer sugere que o interesse de Horácio em localizar a lírica do