Revista Rua


Reescrevendo espaços: VRBS e natureza nas Silvae
Rewriting Spaces: VRBS and nature in the Silvae

Leni Ribeiro Leite

elemento importante, como no epitalâmio I.2, em que a casa da noiva é descrita em detalhes, ou no jantar de Domiciano (IV.2), em que o detalhamento do salão onde ocorre o jantar se estende dos versos 18 a 37.
Descrever um espaço físico, um prédio ou um jardim, é muito diverso de descrever uma obra de arte. Enquanto a descrição da obra de arte guia o olhar para os diversos aspectos de um objeto apreensíveis pelo olhar de forma concomitante, a descrição da uilla, do templo, do jardim, significa mover-se pelo espaço. Quintiliano reconhecia espaço, ou lugar (locus) e topographia como estratégias particularmente persuasivas (Inst. 4.2.36; 9.2.43-44) uma vez que a construção de espaço através do discurso não apenas situa a audiência, mas define a perspectiva através da qual a audiência “vê” o tema. Os lugares criados na literatura oferecem aos leitores mapas mentais, em que significado, memória e imaginação são organizados. Eleanor Leach (1998) sugere que as paisagens literárias romanas tinham a capacidade de persuadir, de oferecer sentido e de organizar conhecimento para os receptores, construindo um sistema coeso de significado e de ética.
A construção de mapas mentais, e portanto de descrições de espaços, era parte da arte do orador na Roma antiga. Uma das técnicas de organização das ideias para o discurso era justamente a elaboração de um mapa mental em que cada ideia estava associada a um cômodo (ou uma série de cômodos) em uma casa, ou em outras organizações espaciais semelhantes. Essa organização espacial das ideias era também um artifício mnemônico, pois auxiliava o orador a lembrar o discurso: associava-se um lugar a um conceito. (PENNY-SMALL: 1997) Observamos, então, que o hábito da descrição de espaços, e da conexão entre espaço literário e transmissão de conhecimento, ou mesmo persuasão, era suficiente para se considerar a possibilidade de que as descrições de lugares na poesia ocupem uma função semelhante. A significância das metáforas espaciais em Estácio, assim, ganha em importância, e pode ser lida como uma tentativa de remodelar a identidade romana – não a identidade cívica, do homem público e de negócios, mas do homem em um espaço privado.
O paradoxo é um tema caro às Siluae, ou ao menos a antítese e os contrastes. Seria possível fazer uma leitura desta obra a partir dos eixos antitéticos em que ela toca e que muitas vezes une de formas inesperadas. O contraste entre o espaço público e o privado é muito forte, como comentamos, por exemplo, em relação ao poema 3.1, e também em outros, como no poema 2.3. Uma antítese de tal forma plantada na tradição