Revista Rua


Rememoração/Comemoração no Discurso Urbano
(Rememoration/commemoration in the urban discourse)

Maria Cleci Venturini

O mesmo ou o diferente dependem da filiação do sujeito a FDs ou a lugares que legitimam os dizeres. Dissemos, então, que a rememoração ocorre no eixo da verticalidade e irrompe no eixo da horizontalidade, pelo interdiscurso, como um efeito sobre si mesmo, segundo Pêcheux (1997: 167), “uma interioridade inteiramente determinada como tal ‘do exterior’”. É pela exterioridade, portanto, que a rememoração funciona como um espaço discursivo interpretado pela força do presente.
 
COMEMORAÇÃO: DISCURSO SOBRE
 
O discurso sobre, a comemoração, sustenta-se em um discurso de e materializa-se na dimensão linear do dizer, o fio do discurso. Segundo Orlandi (1990), é uma modalidade discursiva que institucionaliza os sentidos. Um dos efeitos do discurso sobre é, de acordo com Mariani (1999), tornar objeto o nome ou evento sobre o qual fala o sujeito do discurso. Trata-se de um discurso doutrinário, que fornece e impõe a realidade aos sujeitos da formação social, marcando o discurso por uma aparência de estabilidade e de homogeneidade, que aproxima o fazer discursivo do fazer histórico, na ilusão de poder realizar, segundo Pêcheux, “o apagamento seletivo da memória histórica”.
Uma das marcas do discurso sobre é a modalização deôntica do dizer, materializada, no fio do discurso, pelos verbos dever e ter, próprios dos discursos institucionais em que os sujeitos atuam como porta-vozes, isto é, falam de um lugar autorizado, em nome de, como mediadores. Segundo Conein (1980), o sujeito mediador é próprio do discurso político, onde se constitui como sujeito porta-voz, “como agente coletivo em movimento”, que exerce duas funções enunciativas: a primeira, de agente (aquele que fala em nome de) e a segunda, de mediador (aquele que realiza uma ação, em nome do coletivo que representa).
Pêcheux (1982/1990: 17) faz uso dessa noção para pensar as contradições em torno das revoluções do século XIX e XX e define o sujeito porta-voz como o sujeito que “se expõe ao olhar do poder que ele afronta, falando em nome daqueles que ele representa, e sob seu olhar. É aquele que se [...] coloca em posição de negociador em potencial, no centro visível de um “nós” em formação [...]”. O sujeito porta-voz, nessa perspectiva, circula entre três posições: a de profeta, a de dirigente e a de homem de Estado, nessa última posição, ocupa um lugar institucional.Ainda de acordo com