Revista Rua


Rememoração/Comemoração no Discurso Urbano
(Rememoration/commemoration in the urban discourse)

Maria Cleci Venturini

a forma de pré-construído, o já-dito [...] sustentando cada tomada de palavra”. Em resumo, para a autora a memória discursiva sinaliza para o interdiscurso.
     Courtine (1981) retomou essa noção e a relacionou à existência histórica do enunciado no seio de práticas discursivas reguladas por aparelhos ideológicos, na esteira de Foucault (1969). Para ele a memória discursiva constitui-se de enunciados que retornam e instauram a repetição ou a transformação do sentido, reinscrevendo os dizeres a domínios de memória. Nesse sentido (id.: 53), a memória discursiva comporta o interdiscurso (memória) e também os domínios da atualidade e da antecipação, instaurando “efeitos de memória” no eixo da formulação.
A memória discursiva em funcionamento no discurso de rememoração/comemoração no espaço urbano analisado constitui-se de dois eixos – o vertical e o horizontal – em um movimento em que a memória (rememoração) comporta as repetições e irrompe na comemoração (atualidade), às vezes, sustentando o mesmo e, em outras, rompendo com o já-dado, num movimento de sentidos que se relaciona a filiações e a lugares institucionais, que sustentam o lugar de memória. Dissemos isso tendo em conta que a memória discursiva não é simétrica, nem fechada e os sujeitos e as instituições, apesar dos efeitos de evidências de saturação do discurso institucional, não controlam o trabalho da memória, nem os espaços discursivos que ela reclama e faz funcionar, constituindo pelo discurso um imaginário urbano.
Como dissemos nas considerações iniciais, os procedimentos discursivos constitutivos do discurso de rememoração/comemoração no discurso urbano foram observados nas materialidades discursivas analisadas em nossa tese. Para isso recortamos um espaço comemorativo – Cruz Alta – em um espaço temporal que se estende de 1969 a 2006, que nos possibilitou observar os movimentos desse discurso em torno de Érico Verissimo, como sujeito  idealizado nesse espaço. Nosso corpus abarcou diferentes materialidades, dentre as quais analisamos: a placa de boas-vindas afixada nas rodovias que dão acesso à cidade, as imagens de Cruz Alta hoje (prédios com o nome do escritor, de suas obras e personagens), dois documentários (um de inauguração do museu, realizado pela RBS TV e outro em que o responsável pelo Museu apresenta o escritor aos visitantes, realizado pela TV Unicruz), peças publicitárias, um painel colocado no portal da prefeitura e outro que circulou no vidro traseiro de um coletivo urbano de Cruz Alta[3].


[3] As materialidades analisadas podem ser visualizadas em nossa tese de doutorado, disponível no banco de teses da UFSM.