Revista Rua


Rememoração/Comemoração no Discurso Urbano
(Rememoration/commemoration in the urban discourse)

Maria Cleci Venturini

Analisamos essas materialidades em torno de dois eixos: o de “fazer crer”, descrito por De Certeau (1994), pelos procedimentos de “fazer-ver”, em relação ao que ele chama de “imaginário do ver” e o de lugar de memória[4], constituído pela própria rememoração/comemoração e pelos lugares institucionais que o atualizam e sustentam. Esse lugar de memória é sustentado por outros lugares, quais sejam: museu Érico Verissimo (como o lugar que organiza os demais lugares), a Unicruz (Fundação Universidade de Cruz Alta), o Poder Público da cidade e a mídia, que organiza o imaginário urbano. 
O primeiro eixo, em que analisamos os procedimentos de “fazer-crer”, satura o discurso, fazendo “ver” por que Cruz Alta se representa para dentro e fora de seus limites como “a terra de Érico Verissimo”, compõe-se de uma placa que identifica a cidade, e ao mesmo tempo e “faz-ver” pela delimitação de fronteiras a razão desta designação e imagens da cidade hoje. A primeira materialidade é essa placa, na qual estão inscritos os dizeres: “Cruz Alta: bem-vindos à terra de Érico Verissimo”. A segunda materialidade, que designamos de mobiliário social, compõe-se de prédios com o nome do escritor, de suas obras e de personagens de suas obras e faz “ver” Érico Verissimo e a cidade, pela rede de identificação “tecida” no espaço urbano, como um mesmo objeto, como se um pudesse ser lido/interpretado/compreendido pelo outro, pelas “semelhanças”, instituídas pelas relações metafóricas, sustentadas pela rememoração como memória e também como texto fundante. Os prédios e monumentos sinalizam para o escritor e para a sua obra como discurso fundante, especialmente Solo de Clarineta I, texto autobiográfico, e O Tempo e o Vento, trilogia que representa, na ordem da ficção, mais de duzentos anos de história do Rio Grande do Sul.
Em relação à rememoração/comemoração como lugar de memória, observamos que “esse lugar” funciona em rede com outros lugares e constitui de um lado o sujeito rememorado/comemorado, e, de outro, o imaginário urbano por um processo metafórico e não metonímico. Dissemos isso porque os valores que o representam pela sua obra e pela memória são imaginariamente transferidos[5] aos sujeitos/cidadãos do espaço urbano, num processo em que um é o simulacro do outro. Assim, o discurso de rememoração/comemoração pelos efeitos de identificação e de pertencimento constitui


[4] Neste trabalho o lugar de memória é lugar em que a FD dominante (a da rememoração/comemoração) organiza, atualiza e faz circular o que pode e deve ser dito ou ritualizado em torno do sujeito idealizado, constitutivo do imaginário urbano, no caso por nós analisado, o de Cruz Alta/RS.
[5] A transferência a que nos referimos advém da psicanálise e significa o processo pelo qual os desejos se atualizam sobre objetos do desejo (no caso o objeto da rememoração/comemoração).