Revista Rua


Mídia e Espaço Público

Guilherme Carrozza

 

e nem de pessoas pedindo esmolas. Trata-se de trabalhadores desempenhando suas funções para ganharem seu sustento. E é justamente porque a rua funciona como o espaço no qual os sujeitos são constantemente identificados como consumidores que é possível – e aceitável – a abordagem de um estranho na rua oferecendo algo para consumo.
 
Poluição visual: é disso que estamos falando?
 
Em 2006, a prefeitura de São Paulo apresentou uma proposta de lei que visava acabar com a “poluição visual” da cidade e que passou a vigorar em 2007.
O projeto, que ficou conhecido como “Cidade Limpa”, obrigou a remoção de praticamente toda e qualquer forma de anúncio no espaço público e ainda estabeleceu critérios para a fixação de letreiros nas fachadas das lojas. Nas palavras do próprio prefeito da cidade à época, Gilberto Kassab, o projeto tinha o propósito de “libertar São Paulo de uma das formas mais claras de apropriação indevida do espaço público.”[15] O prefeito se referia aos anúncios em mídia exterior que, segundo ele, tomaram conta do horizonte da cidade nas décadas mais recentes, impossibilitando ao paulistano a visão do que seria a “verdadeira São Paulo”(também segundo o próprio prefeito).
A lei prevê, num primeiro momento, a ordenação de anúncios publicitários e equipamentos públicos, tais como fios elétricos e equipamentos de infra-estrutura que compõem a paisagem urbana. Porém, em seu texto, quando se refere às normas e aplicações, trata especificamente da utilização do mobiliário urbano pelos anúncios, deixando em aberto as explicações quanto à ordenação do que seria de responsabilidade do estado. Isso já nos aponta uma direção que converge na aproximação entre a mídia e a poluição visual, já que “limpar a cidade” aplica-se à retirada urgente de circulação dos anúncios em mídia exterior.
Segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa[16], o termo poluição refere-se à “degradação das características físicas ou químicas do ecossistema, seja por remoção ou por adição de seus elementos”. Em sentido figurado, deriva para a conseqüência do ato de sujar, macular, corromper, no sentido físico ou não. 
Também sobre o termo poluição, vale ressaltar que os dicionários de língua portuguesa[17] não fazem referência à sua utilização enquanto “visual”. O que se encontra são termos como “poluição ambiental”, “poluição das águas”, “poluição do solo”, “poluição sonora”. Ou seja, o surgimento do termo aparece como uma necessidade histórica, que atravessa

 



[15] Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo.
[16] Disponível em http://houaiss.uol.com.br/busca.jhtm?verbete=polui%E7%E3o&stype=k
[17] Chamamos a atenção aqui para a maneira como o dicionário trata o termo, já que o tomamos como “instrumento tecnológico de gramatização”, nas palavras de Auroux (1992). E ainda, segundo Horta (2006), é possível, pelos dicionários, “observar os modos de dizer de uma sociedade e os discursos em circulação em certas conjunturas históricas. [...] os sentidos dos dicionários são considerados na relação indissociável com os sujeitos tomados em seu modo social e histórico de existência.” (id., p. 11-19).