Revista Rua


Um glossário contemporâneo: a língua merece que se lute por ela
A contemporany glossary: the language that deserves to fight for it

Vanise Gomes de Medeiros

 

(15) (Bibi dos Boy): Em alusão ao bairro classe A da elite paulista, o Itaim     Bibi. 
 
Em (12), (13) e (14) temos o processo de formação de palavras por um caso de abreviação da palavra: a redução. No exemplo (12) e (13) pela supressão de uma parte fonética final ou inicial da palavra (responsabilidade: responsa; paranóias: nóias); no outro caso (14) pela abreviação em sigla (Boletim de Ocorrência: B.O). No exemplo (15), a criação se dá pelo jogo sonoro na formulação da expressão “Bibi dos Boy”: a aliteração da consoante “b” com o corte do nome do bairro, de Itaim Bibi para Bibi, e acréscimo de palavra, “dos Boy” (sem a marca do plural na palavra inglesa), resulta em uma ironia sutil ao bairro de ricos. Há que se observar que estes procedimentos não ocorrem sem que haja deslocamentos de sentidos (em todos os verbetes que se incluem nestes dois eixos), além de deslocamentos como de classe gramatical (“responsa” funciona como adjetivo e não como substantivo) e de personificação (caso de “nóia” que passa a indicar o ser e não um tipo de distúrbio psíquico).
As novas formações e os jogos de palavras trabalham então a potência e autonomia da língua que está em jogo – que forma palavras como qualquer outra língua – e materializam no deslocamento uma disputa pela forma da língua e pelos sentidos. Não se trata de derivar ou de formar novas palavras tão somente, mas de dobrá-las, torcê-las e de fazê-las significar diferentemente. O glossário de Buzzo põe em cena o léxico (e também a ortografia como veremos adiante) num movimento de luta na e pela língua. Movimento que ocorre na torção dos sentidos – com os trocadilhos e jogos de palavras – e na torção da palavra – com as abreviações, siglas. A palavra não é aí o espaço do erro e do acerto como observei nas revistas da ABL nos anos 50 (MEDEIROS, 2008). É arena de luta.
Antes de passar ao quinto eixo, cabe observar que a definição de “B.O.” inscreve o discurso policial como fonte etimológica da palavra. O recurso à etimologia se faz presente em apenas dois itens lexicais – neste (14) e no seguinte:
 
(16) (enquadraram): A gíria vem da revista policial, de ser enquadrado.
 
Em ambos, é o discurso policial apontado como origem da palavra. Não se pode deixar de lembrar a presença constante da polícia nos espaços da periferia; afinal, conforme Orlandi (2007, p. 8), “uma língua é um corpo simbólico-político que faz parte