Revista Rua


O Invisível em La Ciudad Ausente
(The Invisible in The Absent City)

Livia Grotto

As imagens filtradas pelo olhar duram como se estivessem fixadas para sempre e possibilitam observar a si como se fosse outro. Em "Primer amor", outra narrativa da máquina, um menino, transformado em narrador, afirma: "tengo la imagem de los dos", embora um deles seja ele próprio. O olhar permite uma distância para descobrir-se a si, perpassado pela perspectiva exterior, de um momento congelado, conferido pela observação de outros, "círculo sarcástico": "Una tarde hizo algo heroico y quebró todas las reglas y entró corriendo en el prohibido patio de los varones para venir a decirme que se la llevaban. Tengo la imagen de los dos en medio de las baldosas coloradas y el círculo sarcástico de los otros que nos miran." (PIGLIA, 1995: 53)
Neste relato, conta-se a história de um garoto que se apaixona por uma coleguinha de colégio, e sofre, logo em seguida, uma brusca separação. O menino, cheio de dor, lembra-se da mãe dizendo que é sinal de casamento quando, ao colocar um espelho debaixo do travesseiro, a imagem de quem se quer muito se reflete no sonho. Passados muitos anos, o antigo menino sonha. O espelho finalmente altera a relação da personagem com o mundo, oferecendo seu novo aspecto, depois de envelhecer, em contraste com a imagem da menina fixada pela memória: “Muchos años después, una noche, soñé que soñaba con ella en el espejo. La veía tal cual era de chica, con el pelo colorado y los ojos serios. Yo era otro, pero ella era la misma y venía hacia mí, como si fuera mi hija”. (PIGLIA, 1995: 54)
A relação pai-filha que figurava na primeira página do romance – quando Junior se lamenta por não conseguir abandonar a lembrança da filha – ganha sugestão incestuosa em “Primer amor”: o menino tornado homem vê a imagem da garotinha refletida em sonho. Ele poderia agora casar-se com ela (ou com sua imagem), se esta não fosse como uma filha. A reflexão dos espelhos denota a narração infinita da máquina, produzindo o novo a partir do mesmo – “soñé que soñaba” diz a história – assim como a reescrita permanente do romance, sempre com novos espelhamentos e ancoragens. O tema do pai e da filha ressurge no relato seguinte da máquina, “La nena”, história da pequena Laura que perde gradativamente a capacidade de reproduzir o mundo por meio da linguagem. Seu pai abandona o trabalho para dedicar-se exclusivamente a ela. Depois de algumas tentativas frustradas, resolve contar à filha todas as versões de uma mesma história: a da estátua de Vênus, que toma como esposo aquele que lhe coloca o anel de compromisso no dedo. Repetição como cura, mise en