Revista Rua


O Invisível em La Ciudad Ausente
(The Invisible in The Absent City)

Livia Grotto

autômatos, e por Macedonio Fernández, seu esposo, cujo desejo era resgatá-la da morte, como Orfeu a Eurídice. Piglia resume o núcleo da trama mencionando dois acontecimentos aparentemente inconciliáveis: “un hombre ha perdido a una mujer y en su lugar arma un complot” (2000a: 145). Essa conspiração, pode-se acrescentar, restituiria a cidade, na medida em que seus habitantes estão despojados de algo a que conferiam grande importância. Sentem falta, por exemplo, da antiga pátria, perderam um ente querido, possuem uma faculdade física ou mental que se debilita pouco a pouco.
A maneira de olhar a cidade possibilita diversas considerações a respeito desse romance. O olho que não apenas vê, mas imagina, diferentemente de uma câmera que não pode proteger-se ou escolher uma visão: “cierro los ojos y veo” (PIGLIA, 1995: 181), diz a máquina na penúltima página de La ciudad ausente. O olho que espia muitas vezes sem entender, ainda que não descarte uma insistência em desvelar e libertar. O olhar através do qual confiamos no que é verdadeiro e afastamos o que é ilusório, forma privilegiada de conhecer, ganha novos rumos e significados nos diversos momentos em que surge, como na frase que intitula um dos livros de Macedonio Fernández, No toda es vigilia la de los ojos abiertos.
Algumas personagens de Macedonio e sua concepção do que é a literatura são apropriadas ou reformuladas em La ciudad ausente. Os poucos dados seguros a respeito da vida desse escritor, assim como ele próprio, transmutam-se em ficção. Desse modo, retoma-se parte dos versos que dedicou à esposa, Elena de Obieta, logo após a sua morte, em 1920. Intitulado "Elena Bellamuerte", o poema sublinha a idéia de que não houve morte alguma. Como se tudo o que se passara fosse um sonho, um fingimento ou um capricho, a morte ganha aspas, pois Elena é a “menina do Despertar Amanhã”, do “fingido morrer”. Apesar de oculta, em seu “último humano querer”, submete a Luz, o Tempo e a Morte. Nos versos de Macedonio, também os olhos são convocados. Os de Elena, "olhos e almas tão donos do amanhã", contrapostos aos de todo o resto, “secos teve seus olhos: tudo em torno chorava”. O Museo de la novela de la Eterna(editado postumamente, em 1967) sugere parte da história dessa “já hoje não humana”, que em La ciudad ausente torna-se máquina, guardada viva num museu, como uma relíquia. O conflito entre dois espaços no texto de Macedonio Fernández – aquele nomeado Romance, onde estão as personagens, situado no campo, “estância” do “Sonho” e do “Ser”, e a Cidade, centro do outro mundo, do lado da “Realidade” e do “Eu” – é