Revista Rua


Maquinaria da privacidade
Machinery of privacy

Marta Mourão Kanashiro, Fernanda Glória Bruno, Rafael de Almeida Evangelista e Rodrigo José Firmino

3. Big data e alguns elementos para análise
Na passagem da soberania para a disciplina, o direito de morte que detinha o soberano é deslocado para um poder que gera a vida, e passa a vigorar a administração dos corpos e a gestão calculista da vida. (Foucault, 1988). Taxas de nascimento e morte, níveis de saúde, de longevidade surgem como uma série de intervenções e controles reguladores que penetravam os corpos de maneira detalhada e controlavam as populações de modo global, caracterizando aquilo que Foucault chamou de biopolítica das populações. “A estatística como ciência do Estado” ligava a detenção das informações sobre as pessoas pelo Estado e por seus técnicos, e por instituições, hospitais, escolas, exércitos, prisões etc.
A possibilidade de coletar dados[9], arquivar, monitorar, conhecer, reconhecer, identificar, classificar e perfilizar não é mais uma prerrogativa do Estado, nem de seus técnicos e instituições, tanto quanto não se opera mais por meio de mecanismos disciplinares, mas pelo controle exposto por Deleuze (2000). E da mesma forma, arquivar, conhecer, classificar não têm mais o mesmo sentido ou funcionamento que tiveram em outras épocas.
Estamos lidando com processos automatizados voltados para um gigantesco volume e fluxo de informações, em segundo lugar, com um espraiamento das possibilidades de monitoramento, identificação e classificação que se dão pelo uso cotidiano e corriqueiro de tecnologias de informação e comunicação, dos celulares a internet.
A quantidade e variedade de dados disponíveis na internet e as ferramentas para lidar com esse universo vem sendo chamadas de big data. O tema é tratado de forma geral por especialistas voltados para áreas como marketing, administração, ou aqueles interessados em oportunidade de negócios, aumento da competitividade e inovação. Nesse meio são proclamados como componentes necessários para a definição de big


[9] Da mesma forma não é mais possível reconhecer nos saberes produzidos hoje a estatística de que nos falava Foucault (1988). “(...) Estatística e Computação. Essas áreas são como caminhos que em relação com outros ou com áreas distintas, mas reunidos sob a mesma epistème, acabam por precipitar-se em outros rumos. São como linhas em uma dança e movimento não retilíneo, que ora se entrecruzam e ora se afastam, e nos momentos em que se tocam, criam várias outras vias, com tonalidades diversas entre si e também diferentes quando compradas com o que as formou” (Kanashiro, 2011: 56).