Revista Rua


De "garganta do diabo" para "ponte sobre o vale do menino Deus": reflexões acerca das práticas sociais e dos modos de designar o espaço público
From "Devil's Throat" to the "Bridge over The God Boy Valley": Reflections about the social practices and the ways to designate the public space

Verli Petri

apaga pela substituição do nome. Na mídia é possível ver isso, pois embora o que é institucionalizado como novo nome passe a aparecer em primeiro plano, o que é da ordem da memória faz-se presente: seja pela imagem (que, mesmo que se altere, ainda é a mesma), seja pelo vestígio lingüístico que é apresentado de modo resumido e entre parênteses. É preciso aproximar o nome novo, atribuído à velha imagem, do sujeito, para que ele se identifique e possa produzir sentidos, possa renomear para designar. A mídia, como um todo, encarrega-se disso, cede à “tentação” e ainda menciona o antigo nome entre parênteses, mas esperando que isso venha a desaparecer. Esse movimento vai promover o apagamento na materialidade da língua, mas os sentidos permanecerão no interdiscurso e poderão emergir a qualquer tempo.
De fato, desta mudança de nome parece emergir um gesto de interpretação marcado política e religiosamente, a partir do qual se tenta instaurar uma nova ordem interpretativa com pelo menos dois movimentos de sentidos observáveis: 1) apaga-se um passado memorial local e, com isso, lutas e conquistas, nomes e partidos políticos; e 2) fecha-se “a garganta do diabo”, lugar de profanadas ações suicidas, abrindo-se um espaço para o sagrado “menino deus”. Assim, ficaria a imagem destituída de memórias, a imagem “limpa” revelada no cartão postal... a natureza exuberante é vinculada ao sagrado (Menino Deus, para nós entre parênteses). É a ponte que liga, mas que é fronteira, que é fisicamente fixa, mas simbolicamente movente; construída no limite do urbano e do não-urbano, do bem e do mal. Trata-se, agora da ponte que liga Santa Maria a Itaara, ao resto do Brasil e do mundo, mais um espaço público incorporado ao urbano. Os sentidos pejorativos ou quaisquer outros sentidos podem e devem desaparecer.
Este é um interessante exemplo de funcionamento dos esquecimentos número 1 e número 2 de Pêcheux. É como se fosse possível determinar a origem de um nome, fundando este lugar num dado momento histórico, via língua. Neste caso é a refundação/reinauguração do nome do ponto turístico, via língua. Do mesmo modo que se realiza a ilusão de que a mudança do nome, na língua, possa controlar os sentidos sobre o que é dito. No entanto, o funcionamento ideológico não cessa, não se dá a esperada ruptura, pois o novo nome não tem essa força. De fato, a produção dos sentidos não está vinculada apenas ao politicamente correto, mas sim a uma memória que promove o retorno dos enunciados semanticamente estabilizados. Além da língua, a memória está produzindo