Revista Rua


Do Repetível ao Historicizado: Notas Sobre uma Prática de Sentidos
(From the Repeatable to the Historicized: Notes About a Practice Of Senses)

Rejane Maria Arce Vargas

Falar em inclusão/exclusão social se tornou um imperativo social perfeitamente ajustado à ‘onda’ do ‘politicamente correto’, tornou-se palavra de ordem, de tal modo que enunciados que outrora se vinculavam fortemente a posições políticas e que configuravam modos de pensar e estar no mundo ganharam tamanha instantaneidade a ponto de determinados sentidos passarem a transitar por cenários antes impensados. Por outro lado, refletir acerca da filiação de sentidos em tempos etéreos impõe-se sobremaneira e requer novas formas de mobilizar a teoria em consonância com as práticas de sentidos contemporâneas. Em face disso, um espaço do urbano foi se apresentando como profícuo para refletirmos acerca dessa problemática. Espaço este que foi desde sua constituição um espaço de litígio acerca do estar nesse lugar, dos sujeitos desse lugar e de sua própria instauração, isto é, de sua nomeação. Foi dele que nos ocupamos em estudo recente e é dele que trataremos aqui.
Trata-se de uma história que podemos re-contar do seguinte modo.
O cenário é a cidade de Santa Maria (RS, Brasil), o ano é 1991, o dia é 07 de dezembro. Famílias lideradas por integrantes do Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM) ocupam uma parte da antiga Fazenda Santa Marta, área de aproximadamente 1200 hectares, de propriedade do Governo do Estado do Rio Grande do Sul, onde em 340 hectares havia a promessa de serem construídas, nos anos de 1980, moradias populares. Tal feito não ocorreu e foi um dos estopins para que ocorresse a ocupação da área.
A trajetória da ocupação foi tensa. A partir da terceira noite da ocupação, a polícia cercou o local, impediu a entrada de novos ocupantes, permitindo somente a saída. No dia 18 de dezembro de 1991, houve o pedido de reintegração de posse da área, o que foi negado seis dias mais tarde, com base no Artigo 5º da Constituição Federal do Brasil que trata dos Direitos e Garantias Fundamentais e Direitos e Deveres Individuais e Coletivos(cf. BOTEGA, 2004).
Essa luta por um lugar de moradia é perpassada por conflitos, entre cadastramentos e sorteios de lotes, olhares atentos e coercitivos da ordem policial, reivindicações por condições básicas de infra-estrutura, água, energia elétrica, transporte público, escolas etc. Em 1993, por exemplo, a água que havia para os ocupantes era a de uma sanga, compartilhada com os animais. Além da sanga e das fontes naturais, havia