Revista Rua


Tecnologias do corpo: metáforas da sutura e da cicatriz
Technologies of the body: metaphors of suture and scar

Aline Fernandes de Azevedo

independentemente. Esse funcionamento instaura, pelo jogo imaginário, um efeito de verdade universal (todos sabem que...). Na discursividade analisada, o fone do DJ cria um espaço de potencialização para o corpo, fazendo da tecnologia um elemento de constituição fundamental para a significação do corpo, uma vez que é em torno dela que o sujeito é interpelado.
A constituição do sujeito como unidade (imaginária), sua interpelação ideológica, acontece por meio de sua identificação com os elementos do interdiscurso, dos quais a tecnologia funciona como pura evidência. Isso quer dizer que o sujeito se identifica com os sentidos da tecnologia construídos nesse funcionamento discursivo, marcando seu lugar (posição) nessa formação discursiva que, não obstante, é heterogênea.
Assim, na fotografia o fone do DJ marca a prótese anexada ao corpo híbrido e repleto de signos, e coloca a questão da tecnologização do corpo, a analogia ao corpo-máquina. Esse é um primeiro ponto que convém enfatizar: os modos como a tecnologia, pensada enquanto mecanismo de individuação, sobredetermina os espaços e os sujeitos. Há um “movimento de tecnologização da vida” (DIAS, 2012) que não pode, entretanto, ser reduzido a uma apropriação da tecnologia, mas como mecanismo de constituição que incorre em modos específicos de individuação e de identificação (ORLANDI, 2012).
 
4. O pós-humanismo
Em decorrência das possibilidades que as tecnologias incorporadas ou acopladas ao corpo instauram, surge o conceito de pós-humano: um novo humanismo que se efetiva a partir do ideal de transparência do corpo e da sociedade, e que ocupa a imaginação profícua dos artistas e a mente dos teóricos dispostos a significar o corpo pela possibilidade da imortalidade.
Segundo Santaella (2003), a convicção de que o humano está imerso em uma era pós-biológica ou pós-humana nasceu junto com o corpo biocibernético, um híbrido entre o orgânico e a máquina cuja forma já se delineava em “Cibernética ou controle e comunicação no animal e na máquina”, no qual Norbert Wiener (1948) apresenta a história dos autômatos no Ocidente. A contemporaneidade é a era da comunicação e do controle, antecipa Wiener, na qual há uma mudança de uma economia da energia para uma economia centrada na reprodução de sinais, o que possibilita um modelo do corpo como sistema eletrônico. “A cibernética propunha que o corpo e também a mente fossem concebidos como uma rede comunicacional” (SANTAELLA, 2003, p.182).