Revista Rua


A Farsa e El-Rei Junot, subversão e decadência
A Farsa e El-Rei Junot, subversion and decline

Débora Renata de Freitas Braga, Otávio Rios

A concepção de história do autor, como o relato dos mortos silenciados pelo discurso dos vencidos, também é uma mostra da descrença no positivismo e no historicismo como regulação do mundo, como se pode perceber no fragmento abaixo, retirado de El-Rei Junot:
 
Procuremos as figuras que estão por trás dessa figuras e os gritos – que só se ouvem, nesses momentos de torvelinho magnético em que as fórmulas não existem e a vida artificial se reduz ao mínimo – os gritos que estão por trás desses gritos. Escutas enfim a tua voz? Assistes enfim ao teu próprio drama? Ousas reconhecer-te naquela figura de espanto, que só vive alguns minutos fugazes, e que reaparece de séculos a séculos, logo sepultada em camadas que têm léguas de espessura, e que és tu! és tu, que nem a ti próprio és capaz de narrar o que sofreste desde séculos e séculos, e que já esqueceste de todo monólogo desarticulado e angustioso, com que vens comentando a vida, sempre baixinho, sempre lá no fundo mais recôndito da tua alma? (BRANDÃO, 1982, p. 85-86).
 
A Farsa é marcada pelo hibridismo de gêneros, estilos e valores, por um pessimismo e um horror da realidade, que geram imobilidade, fuga para o sonho e adoração da morte. Candidinha, “figura amolgada pela desgraça, com o chapéu depenado e um riso postiço” (BRANDÃO, 1992, p. 19), retém por anos o ódio pela irmã, depois pelo cunhado, pela nora, pela beata Felícia e por todos os que conseguem enriquecer, todos a quem atribui a culpa por suas desgraças. Sua luta interna contra a hipocrisia contrasta com as circunstâncias em que é obrigada a viver, assim como a vida com que fora acostumada a ter, nascida e criada na aristocracia. De repente, vê-se jogada para o lado oposto, dos pobres e oprimidos. Deseja dinheiro, poder, mas projeta os sonhos em seu filho e não admite que este tenha os seus: “O filho era muito mais que um cadáver – o filho era o Sonho” (BRANDÃO, 1992, p. 155). Após a morte de Antoninho, acalenta uma última esperança, um sonho a ser realizado, o descanso eterno:
 
É de pedra e ódio. [...] Enorme, vestida de trapos, mergulha na trágica absorção, confundida com as fragas ásperas dos montes. Todos os dias se deita a caminho da vila para o casebre onde o filho morreu. Se lhe falam nem desvia o olhar. Com a mão afiada achega ao peito seco o xale esfarrapado, empedernida como se fora talhada no bloco granítico da serra. Tem os cabelos negros. Não morre (BRANDÃO, 1992, p. 121).
 
Há uma carta que devemos citar: 1º de dezembro de 1920, dezessete anos após a primeira publicação da obra, uma editora de Madrid, a Casa Calpe, solicita a Teixeira de