Revista Rua


A Farsa e El-Rei Junot, subversão e decadência
A Farsa e El-Rei Junot, subversion and decline

Débora Renata de Freitas Braga, Otávio Rios

parceria, seja em forma de difusão e propaganda de personagens; por exemplo, destacamos a carta de 27 de abril de 1926, sobre as protagonistas d’A Farsa:
 
A Joana e a Candidinha são duas criações sublimes. Duas almas saídas das mãos dum Deus diabólico, dum Deus autor do Céu e do Inferno. A Joana é de origem divina. A Candidinha é de origem demoníaca. A Farsa é uma Divina Comédia. Toda a sua obra é a Divina Comédia do nosso tempo (1994, p. 141).
 
A sociabilidade também pode ser a parceria direta ou indireta na elaboração de textos literários. A parceria direta entre Brandão e Pascoaes resultou na peça teatral Jesus Cristo em Lisboa; mas é a parceria indireta que nos importa verificar, com auxílio das cartas, o processo de criação d’A Farsa e de El-Rei Junot. A longa amizade de Brandão e Pascoaes rendeu bons frutos. Por conseguinte, não se abstinham em oferecer sugestões, que eram sempre solicitadas e bem vindas.  Ilustramos com a carta 109, de 12 de outubro de 1925, em que Brandão opina sobre o título de um livro de Pascoaes, Memórias dum pobre tolo: “Estou com grande curiosidade nas suas Memórias. Sobre o título falaremos – mas parece o título duma coisa romantizada” (1994, p. 136). O interessante é notar que, de fato, a obra passou a chamar-se Livro de memórias e que os dois escritores, às vezes, até eram criticados juntos, como na epístola de novembro de 1927: “Viu uma descompostura que nos pregou o nosso amigo João de Ameal? Mandaram-ma por o correio. Diz o visconde que o meu amigo não é poeta e que eu não sei gramática. Sinto-me honrado por levar a descompostura na sua companhia” (1994, p. 171).
Segundo Rios (2008a), Pascoaes era o principal intermediador entre Brandão e seus editores. Lia todos os seus livros, conhecia perfeitamente o conteúdo de cada um e sempre se referia à obra do amigo com letras maiúsculas, em sinal de respeito e admiração profundos. Raul Brandão, por sua vez, reconhecia a importância de Pascoaes na divulgação de suas obras, dentro e fora do país, como podemos constatar em carta de 3 de janeiro de 1921: “a si é que devo este interesse repentino dos espanhóis pelos meus livros” (1994, p. 67). Nove anos depois, ainda não relutava em agradecer ao amigo, ainda que com duvidosos resquícios de humildade: “o que eu lhe agradeço o interesse por mim e pelos meus livros! Fá-los traduzir, dá-os a ler aos seus amigos e trata esses pálidos reflexos do meu ser como se tivessem uma grande importância” (1994, p. 235). E a humildade também assomava a Pascoaes quando aludia à obra brandoniana: “No próximo nº da Águia sairá o meu pobre artigo sobre o El-Rei Junot. Desculpe a sua