Revista Rua


Guerra Fria, Sangue Frio: As Conexões entre o Cinema de Terror e a Paz Armada
Cold War, Cold Blood: The Connections between Horror Movies and the Armed Peace

Marcelo Eduardo Marchi

Rosemary, para citar apenas dois sucessos), o filme não se encaixava no filão que marcara a década de 1960 e a seguinte: a exploração do oculto e do sobrenatural.
Em meio a possessões diabólicas, meninas levitando e bebês demoníacos, o filme de Tobe Hooper destacou-se de forma inesperada. A temática não entra em terrenos místicos. Os “demônios” do filme são pessoas sem poderes sobrenaturais. As mortes são perpetradas por ferramentas domésticas, como martelos e a serra elétrica do título (na verdade, uma motosserra).
Esta preocupação em ancorar-se à realidade (dentro do possível, em se tratando de uma película de terror) faz do filme representante de algo que poderia ser chamado de “terror-verdade”: não apenas no tema, como também na forma como as cenas foram registradas (a opção estética, os ângulos e planos), pode-se notar a escolha em trabalhar em um formato quase documental. Além disso, por ter sido rodado em 16 milímetros e depois ampliado, o resultado é uma estética característica de filme amador, intensificando, assim, os atributos documentais.
O filme estabelece este pacto de veracidade com o espectador desde a abertura, que, através de créditos acompanhados de uma narração sóbria, porém grave, como a de um apresentador de programa jornalístico, mostra um breve resumo do que será visto durante a projeção. Nomes, datas, lugares: está tudo ali, como em um documentário ou uma matéria da imprensa, ajudando a forjar a veracidade dos fatos. Afinal, a película é inspirada, em parte, pelos crimes reais do assassino serial americano Ed Gein, ainda que numa adaptação mais do que livre.
Não devemos esquecer que é uma produção independente, com um orçamento considerado muito baixo mesmo para os padrões da época. A falta de recursos financeiros que arcassem com grandes efeitos visuais e de maquiagem pode ter influenciado a opção por uma abordagem mais realista, menos “pirotécnica”, por assim dizer.
Outra característica marcante no filme é a ambientação. Desenrola-se em Travis, uma cidadezinha no interior do estado do Texas. A crueldade com que o cenário é retratado constitui outro fator que torna o filme atípico. Ele não faz concessões ao mostrar aquele ponto perdido no mapa americano como uma terra inóspita, atrasada e retrógrada, onde uma família consegue permanecer impune durante gerações mantendo hábitos como assassinato, canibalismo e violação de sepulturas. O grupo de jovens forasteiros que chega