Revista Rua


A placa na entrada da cidade: a (re)nomeação dos seus sujeitos
A sign at the entrance of the city: the (re) naming of its citizens

Stella Maris Rodrigues Simões

Devemos refletir aqui no conceito pechêutiano de memória discursiva que seria “aquilo que, face a um texto que surge como acontecimento a ler, vem restabelecer os ‘implícitos’ (quer dizer mais tecnicamente, os pré-construídos, elementos citados e relatados, discursos transversos, etc.) de que sua leitura necessita: a condição do legível em relação ao próprio legível” (Pêcheux 2010).  A memória discursiva é atravessada por interpretação, repetição e representação, um jogo constante entre o que lhe constitui internamente e o que a provoca externamente, seja com deslocamento ou silenciamento (ORLANDI, 2005). 
A placa torna-se, assim, a tentativa (simbólica e imaginária) de materialização da memória discursiva local, a somatória de distintos modos de sobredeterminação. O nome da cidade – sobredeterminação primeira - adicionadoao enunciado – sobredeterminação segunda – padroniza os sujeitos que se significam no espaço, e distingue-os dos sujeitos de espaços outros: homogeneidade e heterogeneidade constitutivas da formação imaginária sobre uma cidade. É a busca pelo imaginário fechamento do sentido, a cidade completa, acabada, saturada.
 
O enunciado da placa: a busca pela completude
Foram analisadas placas fixadas na entrada de três cidades do Sul de Minas Gerais: em Borda da Mata, em São João da Mata, e em Itajubá. A escolha dessas placas é justificada pela filiação de nosso trabalho ao grupo de pesquisa “Discurso, individuação do sujeito e processos identitários – espaço, acontecimento e memória no sul mineiro (DISUP)”, da Universidade do Vale do Sapucaí.
Refletimos sobre os sentidos que circulam e se (re) produzem, nos enunciados associados ao nome da cidade, e como esses enunciados funcionam na (re)nomeação do espaço urbano. Devemos considerar que, como afirma Pêcheux (1993), “(...) é impossível analisar um discurso como um texto, isto é, como uma sequência linguística fechada sobre si mesma, mas que é necessário referi-lo ao conjunto de discursos possíveis a partir de um estado definido das condições de produção (...)”.  
No município de Borda da Mata (Figura 1), a placa foi fixada na rodovia MG 290,que atravessa a cidade. O viajante, ao ser atravessado pelos sentidos circulantes na placa, é atravessado também pelos “valores” que circulam no espaço-cidade, pela memória discursiva local.