Revista Rua


Língua na Rua: Margens do Sujeito
(The language in the street: the margins of de subject)

Carolina P. Fedatto

E a designação é o processo discursivo de construção do referente. Mas o que é a referência quando trabalhamos com a língua acontecendo, na história? Certamente não é uma relação direta entra a linguagem e a realidade. Tratar essa questão discursivamente é dar visibilidade para a produção da ilusão de objetividade e evidência de uma realidade, de um referente, como se um sentido já estivesse lá: como se o lugar ocupado pelas pessoas e o espaço entre os carros, entre as calçadas, entre as ruas significassem, a priori, de uma determinada maneira e a interpretação de possíveis re-ocupações/significações fosse somente uma. Como é construída essa unidade?
Dar visibilidade ao trabalho das discursividades que materializam na linguagem os limites imaginários do sujeito (n)à cidade nos permite compreender a produção consensual de sentidos para cidade: seus espaços e sujeitos. A nomeação, enquanto designação de significações, se constitui por relações de força, por disputas, por imposições, por silêncios. Funciona atestando a existência, designando, descrevendo, qualificando, explicando não só pelo que se diz: também pelo que não se diz. Instala-se no interdiscurso, im-pedindo outras significações, disfarçando as tensões e, ao mesmo tempo, dando corpo à fuga dos sentidos. Como se dá o processo de designação do sujeito-margem no espaço urbano? Meu olhar analítico recai sobre reportagens de jornal e matérias de televisão que circularam no ano de 2004. Em geral, o dizer da mídia trata o espaço-vazio, o vão-livre pela via de um preenchimento urbanamente significado: o sujeito que ocupa esse espaço é marginal-izado como uma questão a resolver. Daí meu interesse pela forma como esses sujeitos são nomeados: um dizer prolixo, explicativo, circular, difícil:
 
Adolescentes moradores das ruas, que perderam os vínculos familiares, vítimas potenciais da violência e do tráfico de drogas (Correio Popular, 02/02/2003)
 
Parcela da população mais vulnerável, que tem poucas chances de conseguir um meio de sobrevivência (Jornal Hoje, Rede Globo, 01/02/2005)
 
O jovem alijado do mercado de trabalho ou que passa o dia pedindo dinheiro nos semáforos (Correio Popular, 07/02/2003)

Essas nomeações tomam a forma da descrição e da caracterização. São nomes feitos de construções sintáticas que descrevem, localizam, determinam o sujeito e mostram a dificuldade que o discurso da urbanização tem em lidar com aquele que ocupa o espaço planejado para ficar vazio, não enxergando a rua como um lugar de