Revista Rua


A enunciação da cidade: práticas discursivas sobre a São Paulo do início do século XX
The city enunciation: discourse practices about São Paulo at the beginning of XX century

André Luiz Joanilho, Mariângela Peccioli Galli Joanilho

dicotomias simplistas entre comunidades isoladas e integradas e a vida secularizada e individualizadora da cidade. Entretanto, se em nossa história de São Paulo nos detivermos face à metrópole que brotava em 1890 e a compararmos com a cidade agrária de 1820, encontraremos confirmada um progressão linear no sentido da ‘desintegração’ social. Ainda mais, mesmo um olhar apressado na cidade do século XX sugere que a tendência não se reverteu nem se enfraqueceu, que a vida está permeada, mais que nunca, por relações transitórias, parciais, individualizada; pela urgência neurótica de poder, prestígio e riqueza. (MORSE:274).
 
Esta tendência notada por Richard Morse é acompanhada, desde finais do século XIX, pelos discursos a respeito da modernidade e do progresso. A indústria, o trânsito intenso de carros e pessoas, os prédios, as avenidas, as instituições culturais, associativas e econômicas, a ferrovia são sinais evidentes de que a cidade se modernizava, criando a ilusão cosmopolita que a metrópole poderia oferecer. No entanto, esta oferta tinha o seu preço, que era justamente o contrário do que se oferecia: o isolamento na metrópole.
As relações que se estabelecem na cidade tornam-se “esquizofrênicas”, já que não há uma ordem prévia transmitida tradicionalmente. A profusão de linguagens, antes de ser o sinal da Cosmópolis, é o sinal da impossibilidade de comunicação, já que ela marca a tendência de isolamento dos grupos sociais específicos em guetos.
Desta forma:
 
tais aglomerações urbanas podiam expandir-se e de fato expandiam-se cem vezes, sem adquirir mais que vestígios das instituições que caracterizam uma cidade, no sentido sociológico - isto é, um lugar no qual a herança social encontra-se concentrada, e onde as possibilidades de continuado intercurso e interação social elevam a um nível potencial mais alto as atividades dos homens (MUNFORD, 1961: 172).
 
 
À parte as saudades do autor das pequenas vilas rurais, ele nota que o processo de urbanização do século XIX foi feito com base na industrialização e no deslocamento massivo de populações.
A garantia de suprimentos permitiu o crescimento espetacular das cidades durante o século XIX. O seu modelo era logístico, o mesmo que serviu para os grandes deslocamentos de tropas como o exército napoleônico. Isso provoca profundas alterações nas relações entre a