Revista Rua


A enunciação da cidade: práticas discursivas sobre a São Paulo do início do século XX
The city enunciation: discourse practices about São Paulo at the beginning of XX century

André Luiz Joanilho, Mariângela Peccioli Galli Joanilho

Porém, de que adiantaria todo esse preparo se o campo de aplicação não estivesse em condições? É assim que se volta para o espaço físico da cidade, procurando higienizá-lo, e não se trata apenas de uma política sanitária. Higienizar o espaço urbano significa limpá-lo de tudo aquilo que é indesejável, de eliminar justamente o que contradiz as imagens de progresso e modernidade.
Neste aspecto, um dos elementos fundamentais passa a ser a água. Elemento de limpeza e desinfecção. As discussões a respeito do abastecimento da cidade na passagem do século indicam a preocupação. De onde ela deveria vir, a sua qualidade, a quantidade, os custos, e assim por diante, passam a ser freqüentes. Esse problema só é resolvido de modo satisfatório após o aproveitamento da represa de Guarapiranga já nos anos dez.
Autores de um folheto que discutia o fornecimento de água para a capital, Ataliba Valle e Fonseca Rodrigues, medem a pureza da água pela incidência de tifo segundo uma tabela específica. À parte a questão técnica, a preocupação com a pureza incide sobre as preocupações das doenças. Assim, esse problema não é assunto exclusivo de técnicos, mas também dos serviços sanitários, tanto que “a falta de agua assignalada em todos os bairros desta cidade impõe o augmento de seu abastecimento e a engenharia sanitária tem ahi um dos seus mais interessantes problemas” (VALLE e/ou, O Estado de São Paulo, 18/11/1903).
Pereira Barreto toma parte do debate, e acredita que as águas das montanhas são puras, tanto que:
 
o filtro traz em si a sua propria condemnação: quanto mais perfeito, tanto mais condemnavel [...] E, emquanto não cessa de todo o funccionamento, as materias organicas retidas alteram-se e apodrecem infeccionando toda a massa de agua que atravessar a espessura filtrante poluida; o filtro converte-se em um horrivel caldo de cultura (BARRETO, O ESTADO DE SÃO PAULO, 09/12/1903).
 
 
Além do pitoresco fornecido pela imagem que Pereira Barreto tinha dos filtros em usina de captação, isto é, para ele seriam imensas velas parecidas com os filtros domésticos, o problema da captação e da pureza das águas traz consigo a discussão bacteriológica, as formas de transmissão das doenças, questões da reprodução dos germes etc. E o debate é recente, pois