Revista Rua


Políticas de Autoria - Entre Regulação e Falha
(Authorship Policies - Between Regulation and Failing)

Ana Silvia Couto de Abreu

Temos, nos recortes acima, sentidos diversos que circulam: o copyright apaga as diferenças, funcionando como ferramenta de controle do mercado cultural; há novas redes econômicas periféricas de distribuição e há modelos mais flexíveis de licenças autorais; um movimento de maior inserção estatal no campo dos direitos autorais vem se fortalecendo, nas bordas da discussão sobre maior equilíbrio entre direito do autor e acesso coletivo à obra.
            Para pensar essa questão da legislação sobre direitos autorais e as novas práticas e formas de organização na construção cultural, busco Pêcheux (1990) com sua importante reflexão sobre normatização e equívoco, desenvolvida no capítulo Ciência, Estrutura e Escolástica; reflexão essa que nos ajuda a compreender a relação entre o jurídico e seu exterior discursivo.
O sujeito pragmático tem uma imperiosa necessidade de homogeneidade lógica, de um mundo semanticamente normal, normatizado (PÊCHEUX, 1990: 33), acreditando no controle sem risco de interpretação, sem falhas. Há uma busca por transformar saber acumulado em saber administrável (PÊCHEUX, 1990: 53).
Surgem, então, “técnicas de gestão social dos indivíduos”, marcando-os, identificando-os, a fim de trazer-lhes os chamados benefícios, como, por exemplo, instruí-los e protegê-los. Ainda segundo Pêcheux (1990: 30), este espaço administrativo apresenta as aparências da coerção lógica disjuntiva: “é ‘impossível’ que tal pessoa seja solteira e casada”. E é aí que se inscreve o campo do jurídico.
O jurídico funciona na forma de arquivos, no sentido dado por Zoppi-Fontana (2004: 3), a partir da leitura de Orlandi (2003):

Orlandi (2003:15) distingue memória discursiva de arquivo, definindo este último como memória institucionalizada, estabilização e atestação de sentidos que produz um efeito de fechamento. Assim, o arquivo, à diferença da memória discursiva, se estrutura pelo não-esquecimento, pela presença, pelo acúmulo, pelo efeito de completude. E pela autoria em relação a práticas de escrita, de legitimação, de documentação, de indexação, de catalogação, de permanência, de acessibilidade. Conforme a autora, “enquanto arquivo, a memória tem a forma da instituição que congela, que organiza, que distribui sentidos. O dizer nessa relação é datado[...] Enquanto interdiscurso, porém, a memória é historicidade, e a relação com a exterioridade alarga, abre para outros sentidos, dispersa, põe em movimento”.