Revista Rua


Políticas de Autoria - Entre Regulação e Falha
(Authorship Policies - Between Regulation and Failing)

Ana Silvia Couto de Abreu

Vivemos mudanças nos modos de construção e de circulação de bens culturais, trazendo efeitos quanto a novas possibilidades de acesso a esses bens. De um modelo centrado na relação editor e autor, temos agora maneiras de produzir e fazer circular uma obra que implicam diferentes relações de mediação, surgindo outros envolvidos no processo – o webmaster e o provedor, para ficar em alguns exemplos.
Entendemos, assim, que os sentidos de Direitos Autorais instituídos por leis, acordos e tratados nacionais e internacionais estão em movimento, em um confronto entre regulação e transgressão. Esse confronto coloca às vistas um jogo de forças entre discursividades, como a do copyright e a do copyleft, passando por outras não tão visíveis, mas fortemente presentes na sociedade; esse entrecruzamento de discursividades em conflito atinge o atual modelo brasileiro de garantias ao autor, no que se refere, especialmente, aos seus direitos quanto à reprodução de sua obra.    
Diversas práticas realizadas cotidianamente vêm sendo tratadas, em face da atual lei brasileira de direito autoral – n. 9610/98 –, como transgressão, contrafação nas palavras da referida lei, em seu artigo 5°. Essas práticas tidas como ilegais são possíveis graças aos modernos recursos de convergência tecnológica, configurando-se em troca de arquivos em redes, escaneamento de obras, download, arquivamento no computador, entre outras.
É nessas condições que pretendemos tecer algumas considerações iniciais, tendo como objetivo compreender como vêm se estabelecendo os limites entre proteção ao criador e acesso às obras, na sociedade atual.
Transformações nas relações de autoria – com novas práticas, especialmente no ambiente digital –, têm colocado questões ao arquivo jurídico vigente sobre direitos autorais. Ocorre que essas transformações são entendidas, por muitos, como manifestações que precisam ser silenciadas para que o arquivo se mantenha na falsa aparência de estabilidade; quando, para nós, essas práticas são entendidas como falhas, falas desorganizadas, no sentido construído por Orlandi (2004: 61): “lugares onde sentidos faltam, incidência de novos processos de significação que perturbam ao mesmo tempo a ordem do discurso e a organização social”. As falas desorganizadas funcionam como “rupturas que se dão pela falta e pelo excesso”(ibid.: 61). Entendemos que as novas possibilidades de convergência tecnológica pulverizam práticas, muitas, quase todas sem condições de controle por associações e entidades responsáveis pelos direitos