Ranhura na Vidraça


Eduardo Guimarães
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7066-2814

 

 

Estridente rangido

desagrado dissonante

punhal cravado

no olhar

 

Cemitério

arame farpado

urubus

sentinelas

 

Cério

e não sério

não se é

senão

o não ser

a história

sem volta

mesmo que violenta

 

Necrotério

ranhura

desalento

 

Problemas de memória

cólica

aborto imotivado

fraqueza muscular

 

Resistimos

porque somos

por viver

a vida

 

O vidro não quebra

só não deixa ver

inútil

de tantos arranhões

 

E vemos

e continuamos vendo

e vivendo

a desistência mataria

 

O corvo

sobre que corpos putrefeitos

voeja messiânico

desejoso do mal cheiro que produz

 

O corte

vontade palpitante de morte

mata um dia quem o desferiu

 

A ranhura não cessa

engole o próprio punhal

como seu maior desejo

 

O caminho único é o caminho do penhasco

 

Só não cai

quem encontra

outras veredas

 

Cicatrizes

são o que a vida

nos dá a viver

 

 

 

 

 

Eduardo Guimarães nasceu em Prata - MG, tendo ido viver em Uberaba, onde se formou em Letras. É poeta, linguista, e professor da Unicamp. Doutorou-se em Letras pela USP. Publicou Cidade; Corte; Cicatriz (poesia); e Texto e Argumentação; Semântica do Acontecimento; História da Semântica, Sujeito, Sentido e Gramática no Brasil; Análise de Texto; Semântica: Enunciação e Sentido, entre outros (Ciências da Linguagem)

Em um dos poemas de Cicatriz está:
Nada que me venha / é indiferente. / Como saber o que chega / Se vai ou se some / na fumaça cinza / que cobre a cidade?

E-mail para contato: eduardo@unicamp.br




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