Apresentação

 

Chegamos no segundo número do vigésimo sétimo volume da revista Rua, o quarto número publicado em meio à pandemia. Quase sem palavras e sem fôlego, ainda é preciso continuar, apesar de tamanho desassossego frente a tudo o que vivemos junto com a pandemia no Brasil e no mundo. As lutas são inúmeras e se travam em espaços múltiplos. Resistimos com a ciência, pela ciência, na manutenção da revista Rua com sua pungência porque traz à tela aquilo que normalmente não tem visibilidade em um mundo semanticamente estável; e com sua potência porque mobiliza compreensões fundamentais para que novas possibilidades de sentido se façam visíveis e desejadas. Gesto coletivo. Agradecemos aos autores, pareceristas e à equipe técnica por continuarem fazendo laço conosco nessa travessia! Muito obrigada!!

Contamos com doze artigos na seção Estudos. O primeiro, Plurilinguismo e cartografia discursiva do estado do Rio de Janeiro de Tania Conceição Clemente de Souza e Rodrigo Pereira da Silva Rosa, propõe uma cartografia discursiva das diferentes línguas faladas no Rio de Janeiro, pensando no atravessamento do urbano pela sonoridade de tantas e diferentes línguas. Olhando também para a multiplicidade de práticas no espaço urbano, A cidade resultante da construção histórico-social do negro e da mulher no Brasil, de Karla Victória Nunes da Silva, Stéphane Mariana Cunha Lima de Sousa, Maria de Jesus Britto Leite e Julieta Maria de Vasconcelos Leite, traz a ver a formação da sociedade brasileira, histórica e socialmente, sob o ponto de vista do racismo e do machismo, salientando algumas das consequências dessa formação na constituição do espaço urbano contemporâneo. De seu lado, Pessoas em situação de rua e o “centro do universo”: tensões entre a cidade planejada e a cidade praticada, de Natália Alves dos Santos e Andréa Vieira Zanella, problematiza as relações que a cidade de Florianópolis/SC estabelece com as pessoas em situação de rua, entrecruzando um olhar cartográfico e flâneur ao Plano Diretor da cidade, dando a ver efeitos da lei nos corpos das pessoas em situação de rua e o lugar que a elas é destinado na tessitura da cidade. Sob outro recorte arguto, Empresas-aplicativo de delivery e sujeitos-entregadores: relações de trabalho e mobilidade na cidade pandêmica, de Deborah Pereira e Vinícius Brito, se pergunta como o discurso das empresas-aplicativo de delivery significa as relações de trabalho e mobilidade na cidade pandêmica, buscando flagrar (des)vínculos trabalhistas entre empresas de delivery e sujeitos-entregadores nesta conjuntura afetada por um sistema digital. O espaço como potência das forças moleculares: O calçadão da Av. São João, de Hélio Hirao e Camila Komakome, explora outros modos de se pensar as metrópoles, o espaço público, a partir do pensamento rizomático da experiência e prática da deriva e cartografia, identificando e reconhecendo as singularidades locais e as territorialidades que habitam os espaços da cidade contemporânea. Olhando também para o micro, em busca de compreensões mais globais, Parque Jambeiro/Campinas: rua, espaço e paisagem como possibilidades pedagógicas, de Juliana Damas C. Silva, Vera Santana Luz e José Roberto Merlin, apresenta aspectos educadores referentes à cidade em suas instâncias socioespaciais e ambientais, indicando a potencialidade de locais públicos como elementos fundamentais para a formação de cidadãos como agentes da comunidade. Em A relação dialógica entre a Rua e a Cidade: panorama histórico no desenho urbano de Haniel Israel, Isabela Giannella, André França e Valter Caldana, explicita a configuração do traçado viário como instrumento de formação das cidades, partindo do pressuposto de que as ruas ocupam papel de destaque e influência nas relações sociais em diversas representações da vida urbana. De seu lado, em Existe amor no país das maravilhas? O sujeito discursivo, o digital e a cidade, de Lucília Maria Abrahão e Sousa e Bruno Monteiro Herculino, a obra literária “Alice no país das maravilhas” de Lewis Carroll, é tomada como materialidade metafórica para pensar o sujeito nas malhas do digital e na digitalização inscrita na cidade, avançando em um gesto de análise em que o sujeito do discurso comparece enquanto um efeito de uma denúncia. Adentrando ainda mais na relação com o campo literário, Vista parcial (das ruas) de São Paulo em Eles eram muitos cavalos de Luiz Ruffato, de Camila Galvão de Sousa e Humberto Fois-Braga, analisa a representação da capital paulista sob o viés da rua, em que há uma fusão entre a degradação urbana presente nas labirínticas ruas de São Paulo, a caracterização de personagens ruffatianos e a estrutura fragmentada das narrativas e do livro como um todo. Ainda no campo da arte, Completude e oscilações do olhar: Performance de Iemanjá à beira mar do Rio Vermelho, Salvador-Ba, de Jurema Castro Couto Caldas e Liliane Vasconcelos, mostra-se como a arte se manifesta sendo um “caminho do meio”, assim como perceber as relações entre a cidade, a arte e o sujeito, compreendendo a performance como uma obra de arte capaz de apreender o olhar do que é ver e ser visto. Por seu lado, Uma análise argumentativa do sentido de “homofobia” na enunciação de Jair Bolsonaro (2014), de Wellton da Silva de Fatima, traz uma análise de uma postagem no Facebook em que o deputado Jair Bolsonaro, em sua enunciação, mobiliza a palavra “homofobia”. Encerrando a sessão Estudos, temos Ser ou não ser (feito de) palhaço? A performatividade de enunciados que denunciam, de Romulo Santana Osthues e Mónica Graciela Zoppi Fontana, em que, a partir de fotografias de manifestações de rua no Brasil (2011-2015), descreve-se o funcionamento da performatividade de enunciados nos quais a designação de palhaço ocorre.

Na Seção Artes, contamos com a crônica "Geografia Umbilical" de Telma Domingues da Silva e a mostra fotográfica "Abandonos" de Vitória Trevizan Botelho, Alessandra dos Santos Penha e Renato Salgado de Melo Oliveira e o poema "Ranhura na Vidraça" de Eduardo Guimarães.

Fechando a revista, temos a seção Resenhas e Notícias que tradicionalmente faz uma síntese das principais atividades do Labeurb no semestre em curso e que conta, neste número, com a resenha sobre “A ignorância da Revolta” de Edgar Cézar Nolasco, apresentada por João Paulo F. Tinoco.

Finalizamos o ano 2 da pandemia desejando que nossas fibras resistam como árvores que aguentam a ventania, que nossos braços tenham força para recolher os galhos que se quebram na tormenta, que nossa voz não cesse de levar palavras que acolham, lutem, abracem. Precisamos muito do coletivo em rede que se faz em inúmeros espaços. Agradecemos a todas as redes que insistem e resistem. Sigamos juntas, juntos, juntes!

Boa leitura!



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