Apresentação

Com alegria apresentamos o primeiro número do vigésimo oitavo volume da revista Rua. Com alegria, porque ela também é resistência. E celebração. É preciso celebrar que, apesar de tanto, ainda estamos em pé, analisando e fazendo circular sentidos sobre as formações sociais, os espaços e as diferentes práticas que neles se inscrevem, bem como aquelas interditadas. Agradecemos a cada autor e autora e a cada parecerista a manutenção da excelência científica que é em si um gesto político. Agradecemos também a equipe da revista por mantê-la bela e com vigor! Sigamos na Rua!

Nossa seção Estudos conta com 15 artigos. Começamos com A “língua da mineração”: produção de sentidos na comunicação midiática da empresa Braskem S.A. em Maceió-AL, de Paulo dos Santos Nascimento e Helson Flávio da Silva Sobrinho, em que os autores analisam o discurso da Braskem S.A. materializado em folhetos de propaganda institucional de seu site referentes a eventos relacionados ao crime socioambiental que a empresa praticou na cidade de Maceió-AL. Olhando igualmente para discursividades presentes em propagandas, agora de Estado, Elisa de Magalhães e Guimarães e Michel Marques de Faria analisam, no artigo Do passado ao futuro glorioso: discursividade em propagandas ditatoriais no Brasil e em Portugal, as formas como o futuro e o passado são mobilizados na propaganda de regimes ditatoriais, em uma tensão entre um passado considerado glorioso e um futuro tido como promissor, observando peças de propaganda da Era Vargas (1930-1945), da ditadura militar brasileira (1964-1985) e do Estado Novo português (1933-1974). Por sua vez, em Publicidade contra a violência no namoro: uma abordagem discursiva, Christina Barbosa Guimarães Ferreira e Eni Puccinelli Orlandi apresentam uma proposta pedagógica de trabalho com a leitura e a escrita de alunos do 9º. ano do EF2, sustentada por análises de materiais de campanhas publicitárias sobre violência no namoro em Várzea Grande no estado de Mato Grosso. Ainda no espaço discursivo da propaganda, o artigo O discurso do Estado na subjetivação de sujeitos em situação de rua, de Wagner Ernesto Jonas Franco, apresenta análises das discursividades que sustentam o texto da campanha “Não dê esmola, mostre o caminho”, que faz parte de uma política pública da cidade de Pouso Alegre em Minas Gerais. Da propaganda como um modo de dizer que significa no espaço e nos sujeitos que nele vivem, vamos para a arte que diz e faz ver também, construindo, por exemplo, uma imagem de cidade, como no fotolivro Paranoia, de Roberto Piva e Wesley Duke Lee, analisado na interdependência entre fotografia e poesia por Ana Luiza Rodrigues Gambardella e Paulo César Castral, no artigo A cidade fragmento: fotolivro Paranoia (1963). De seu lado, Eso que llaman amor: trabalho, arte e resistência no espaço urbano, de Bruna Vitória Tejada, Virgínia Barbosa Lucena Caetano e Luciana Iost Vinhas, nos aproxima, a partir da produção artística de Ailén Possamay em muros de Buenos Aires, da disputa pelos sentidos hegemônicos sobre o que é considerado trabalho na qual, por exemplo, o trabalho reprodutivo é silenciado pela evidência de representar o amor da mulher. É ao redor também de mulheres que o artigo Testemunho e trauma no julgamento de Larry Nassar, de Giovana Oliveira de Russi e Aline Fernandes de Azevedo Bocchi, envereda sua análise sobre o funcionamento do testemunho articulado à instância do trauma a partir de dois documentários sobre a rede de abusos da seleção estadunidense de ginástica artística. Por sua vez, igualmente com um olhar sobre mulheres, Érica Daniela de Araújo, Gabriela Villela Arantes, Milene Bianchi dos Santos e Sérgio Cardoso Barcelos analisam a representação da mulher no e pelo discurso do esporte, especificamente, no discurso formulado a partir dos Jogos Olímpicos de Tóquio 2021, no artigo Entre verbal e não-verbal: A representação da mulher no discurso do esporte. Por fim, debruçando-se igualmente sobre a representação da mulher, em um espaço discursivo distinto, Vania Maria Lescano Guerra e Willian Diego de Almeida, em Um olhar transdisciplinar de pesquisa e a constituição da subjetividade fronteiriza, procuram problematizar possíveis efeitos de sentidos em relação à representação da mulher, de etnia indígena, e a constituição de uma subjetividade fronteiriza, a partir da obra “Pelas Mulheres indígenas” – idealizada pela ONG Thydêwá em parceria com a Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, publicada no ano de 2015, Por outro lado, mostrando as possibilidades para uma revolução urbana a partir do cotidiano, valorizando as práticas ordinárias e criativas de apropriação dos espaços para um planejamento e política patrimonial não-técnicos, Patrícia Silva Gomes e Mariana Vieira de Mello, no artigo Setor Comercial Sul de Brasília: a vida cotidiana como possibilidade para o planejamento, analisam as formas de apropriação cotidiana, pela população, dos espaços do Setor Comercial Sul (SCS) de Brasília no Distrito Federal. Também mirando seu olhar às práticas urbanas de apropriação de espaços compartilhados, especificamente na relação entre skatistas e artistas urbanos, Bianca Siqueira Martins Domingos, Fabiana Felix do Amaral e Silva e Valéria Regina Zanetti observam ligações entre as práticas de skate, do graffiti e da pichação/pixação à luz do conceito de Citadinidade, em cidades da Região Metropolitana do Vale do Paraíba e Litoral Norte do Estado de São Paulo, no artigo SKATE NO PÉ E SPRAY NA MÃO: Nexos entre o skate, graffiti e pich(x)ação nas dinâmicas culturais urbanas. Por outro lado, flagrando práticas da invisibilização na cidade, ao trazer à tela o que fica à margem, o artigo Relações à margem: Residualidade e estigmatização urbana na Orla Conde, Rio de Janeiro, de Fernando Espósito Galarce e Julia Meira, analisa a área da Orla Conde, no Porto Maravilha do Rio de Janeiro, por meio da noção de espaços residuais – lugares apagados do imaginário coletivo urbano e, muitas vezes, negligenciados pela narrativa na qual se inserem e que sofrem um processo de estigmatização socioespacial vinculado a uma política da exceção. Também observando funcionamentos que marginalizam, o artigo O bem e o direito: o status de cidadão do sujeito-surdo no Brasil e o estatuto da Libras, de Angela Corrêa Ferreira Baalbaki e Luiz Felipe Andrade Silva, analisa textualidades que versam sobre o sujeito-surdo e a língua de sinais no âmbito das ações governamentais e de algumas reações de contra-identificação entre trabalhador e voluntário, profissão e assistencialismo, focalizando especificamente o sujeito-intérprete como aquele responsável pela transmissão de informação (produzida por ouvintes), assimilável ao trabalho de caridade e à missão proselitista (o “Bem”). Também no campo do trabalho, Carla Roselma Athayde Moraes traça elementos caracterizadores da crônica jornalística brasileira com a profissionalização da imprensa no Brasil, nos fins do século XIX e início do século XX, por meio de um dos primeiros escritores, João do Rio, no artigo A crônica jornalística brasileira em João do Rio. E, fechando nossa seção Estudos, temos O peso das questões sociais na noção de scientific literacy no Brasil de Rodrigo Bastos Cunha, no qual analisa a emergência do termo literacy, no final do século XIX, e da expressão derivada scientific literacy, no final da década de 1950, articulando-os aos processos de urbanização e industrialização. Na seção Artes somos brindados com AR_DOR e Par de Vasos de Sérgio Monteiro de Almeida e João da loca de Shara Lopes . E na seção Resenhas e Notícias, temos as notícias relativas ao primeiro semestre de 2022 do Labeurb/Unicamp e a resenha Tensões, dores e incertezas em meio ao genocídio, de Larissa da Silva Fontana e Thaís de Araujo da Costa, que retoma o livro Discursos da pandemia: entre dores e incertezas, organizado por Angela Baalbaki (UERJ) e Luís Felipe Andrade Silva (UFBA), publicado em 2020 pela Editora Pontes.