Mostra de Pesquisas IV - Uma leitura discursiva da textometria hoje
Gravado em 28/11/2019

Completos cinquenta anos da publicação de Análise Automática do Discurso (AAD 1969), de Michel Pêcheux, a lexicometria ganha lugar de especial atenção no que diz respeito à sua história dentro da Análise do Discurso (AD) e, sobretudo, aos efeitos que provoca dentro da disciplina, independentemente se as análises toquem diretamente no tema da análise automática. Com o objetivo de compreender o panorama atual em que se confrontam os métodos e os resultados de programas utilizados para análises de textos, propomos apresentar a plataforma de textometria TXM, de acesso aberto, em suas múltiplas funcionalidades, como objeto que, em seu funcionamento, permite-nos abordar questões concernentes à problemática dos limites entre língua e discurso. O TXM é uma plataforma francesa, utilizada, assim como outras similares a ela, para análises de corpora de grande tamanho. Suas diversas ferramentas, voltadas para a leitura automatizada de arquivos, permitem uma reflexão sobre os desafios que uma perspectiva discursiva tem hoje ao lidar com esse modo, hegemônico, de fazer ciência, cuja caução se encontra nos “dados”, objetivamente aferíveis. A partir do Fundo Michel Pêcheux, do Centro de Documentação Urbana (CEDU), do Laboratório de Estudos Urbanos (Labeurb) da Universidade Estadual de Campinas, construímos um corpus formado por dezoito textos de Pêcheux et al. e Orlandi. Inserimos a massa textual desse corpus na plataforma e geramos uma nuvem de palavras em um plano fatorial, ilustração chamada de Análise Fatorial de Correspondências (AFC). A leitura dessa AFC, como objeto de conhecimento fabricado teoricamente, é o artefato sobre o qual nos detemos para pensar sobre o dispositivo analítico e o dispositivo teórico da AD para a compreensão desse dispositivo técnico de leitura. A prática de análise é pensar como a construção do corpus se reflete nesse artefato de leitura (como o resultado já é o que o analista gostaria de encontrar) e como os resultados desse artefato de leitura levam o pesquisador a encontrar determinadas formas de pensar o texto (como o analista é levado pelo o que a máquina “quer”). Sobre os efeitos da digitalização do arquivo, enquanto alguns pesquisadores centram seus argumentos na deslinearização do texto, nossa análise permite ver que, um dos destacados efeitos de cunho positivista é o de contraste. Esse efeito, descrito por Courtine (2016) como o “a cada um sua ideologia”, é alinhado a uma concepção identitária unívoca que apaga a contradição dos processos sociais e empobrece a pluralidade de sentidos. O utilitarismo de produções científicas que não contemplam a complexidade da natureza da linguagem converge com uma ideologia saneadora dos textos e dos afetos. Assim, a léxico/textometria não se imobiliza em um passado, mas se abastece de problemáticas que não deixam de pensar as condições de produção do saber e a heterogeneidade do futuro (Benjamin apud Derrida, 1995) promovida por determinada tomada do arquivo.