A língua, os museus e os espelhos


resumo resumo

Larissa Montagner Cervo



Orlandi (2009) afirma que as indagações sobre as origens podem ter caráter operatório na teorização da língua, funcionando no quadro teórico da Análise de Discurso e da História das Ideias Linguísticas pela via do conceito de arquivo. E sim, elas contribuem para estes campos do conhecimento, mas é também por meio deles que sabemos que, enquanto os museus resistem e insistem no meio do burburinho, do tumulto, da multidão e do silêncio, as línguas vão acontecendo, em sua unidade e em sua variação, em sua ordem e desordem, em estado de segunda-feira e estado de domingo, comportadas e descomportadas, escabeladas e bem arrumadas, sem se olhar no espelho[7]. Em outras palavras, há sentidos sobre as línguas que, talvez, jamais poderão ser apreendidos por museus.

Iniciando o prefácio da obra Análise do Discurso Político, de Jean-Jacques Courtine, Pêcheux (2009 [1981], p. 21) cita a seguinte epígrafe: “Estou convencido de que, se não víssemos as pessoas movimentarem os lábios, não saberíamos quem fala em uma sociedade, tampouco saberíamos qual é o objeto real em uma sala de espelhos” (G.C. Lichtemberg). Parafraseando Pêcheux, para sair da imbecilidade, já é hora de quebrar os espelhos. Quebrando-os, podemos começar a nos fazer outras perguntas a respeito de como esses museus significam e do que querem e podem ‘dizer’ sobre língua para nós.

 

Referências

AUROUX, Sylvain. A questão da origem das línguas, seguidos de a historicidade das ciências. Traduzido por M. P. G. Joanilho. Campinas: RG, 2008. p. 15-122.

AUTHIER-REVUZ, Jacqueline. Entre a transparência e a opacidade: um estudo enunciativo do sentido. Traduzido por M. Teixeira e V. do N. Flores. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004. p. 7-81.

BALDINI, Lauro José Siqueira. O que nos une é o que nos separa. Letras, v. 23, n. 46, Santa Maria/RS, jan.-jun.2013, p. 189-202.

CERVO, Larissa Montagner. Língua, patrimônio nosso. 199f. Tese (Doutorado em Letras – Estudos Linguísticos). Programa de Pós-Graduação em Letras, Universidade Federal de Santa Maria. Santa Maria, RS, Brasil: UFSM. 

______. O tempo da língua ou a língua no tempo? Considerações sobre língua, história e memória. Letras, v. 24, n. 48, Santa Maria/RS, jan.-jun.2014, p. 211-225.

CHAGAS, Mario. Memória e poder: dois movimentos. Cadernos de Sociomuseologia. Museu e Políticas da Memória. n. 19. Centro de Estudos de Sociomuseologia, ULHT, Lisboa - Portugal, 2002, p. 35-68.

 



[7] Aqui, parafraseamos Scherer e Romão, quando as autoras tratam da “língua em estado de domingo, descomportada e descabelada, sem se olhar no espelho” (2013, p. 350).