A língua, os museus e os espelhos


resumo resumo

Larissa Montagner Cervo



Nos museus, como temos afirmado (CERVO, 2012), o espelho reflete a forma material da guarda, constituindo-se no modo como os museus têm simbolizado a responsabilidade pela preservação, alternativa profícua diante da falta física dos bens tangíveis. Já para Nunes (2013), em estudo também a respeito do espelho no Museu da Língua Portuguesa, olhar-se para o espelho é outra forma de individuação do sujeito com o Estado. Nessa individuação, o sujeito assume sua forma-sujeito histórica, de direitos e deveres, bem como exerce o imaginário de origem de si.

Mas, afinal, o que é o espelho? O espelho é uma placa que retém um raio, sem o absorver e sem o espalhar. O que ele reproduz e reflete é o que é patenteado aos nossos olhos. Se, com a reflexão de Henry (1992) a respeito do buquê invertido e do espelho esférico, as diferenças entre as imagens refletidas nos serviram para mostrar que o sujeito nunca pode ser reduzido a si mesmo como neutro, uma vez que a neutralidade e a objetividade são representações que o sujeito têm do real em si e que partem das distintas posições-sujeito assumidas ao longo da história, no espelho plano o que vemos é uma imagem direta, que não cria efeitos distoantes, mas que, mesmo assim, mascara a constituição do sujeito como afetado pelo real e pelo ideológico. A imagem do espelho é uma evidência da identidade que não mascara o fato de que esta resulta de processos de identificação-interpelação (ORLANDI, 2001) e de que somos um constructo de representações, construído no/pelo trânsito por entre diferentes posições-sujeito na e pela história.

Quanto mais centrado, quanto mais cego e preso à ilusão da obviedade, mas certeza se tem de que nem língua nem sentido podem ser falhos (Ibid.). O sujeito, na frente do espelho, vendo-se refletido no lugar do cérebro, vê-se no comando, como origem de si, em uma relação transparente com o pensamento, tal qual o imaginário como efeito do arquivo do Mundolingua. Sujeito sempre assujeitado a um obscuro funcionamento de sua natureza, funcionamento esse do qual ele se constitui, mas que ele não acessa.

 

Considerações finais

Dois museus, dois arquivos, a língua como objeto histórico, o recurso do espelho e uma mesma matriz de sentido que redunda em uma mesma confusão sobre a temática de origens. E a historicidade das línguas, nessas condições de produção e no interior dos arquivos, persistindo em posição marginal.