A MPB no regime militar: silenciamento, resistência e produção de sentidos


resumo resumo

Olimpia Maluf-Souza
Fernanda Surubi Fernandes
Ana Cláudia de Moraes Salles



como uma máxima do regime, convocando os brasileiros a amar o seu país pelo samba, enquanto um ritmo reconhecido e apreciado internacionalmente; a amar o país pelo futebol, que recentemente (1970) havia se tornado tricampeão mundial; a amar o país pelo carnaval, um dos maiores espetáculos do planeta e, em contrapartida, a alienar-se a respeito dos desmandos orquestrados pelos militares. Dito de outro modo, o que o slogan propunha era um amor incondicional, cego pelo país, pois quem não pudesse ter por ele essa forma de amor, deveria deixá-lo, ao invés de criticá-lo, de apontá-lo como faltoso, como opressor, como cerceador de toda a forma de expressão que não fosse aquela defendida pelos militares. Assim, se o país, da forma como estava, não fosse suficiente para os brasileiros, estes deveriam abandoná-lo, mas não protestar.

Da mesma forma, a música Flamengo Até Morrer nos mostra o mesmo funcionamento, pois, ao louvar sarcasticamente o amor incondicional dos brasileiros a um time de grande popularidade, como o Flamengo, critica a alienação pelo futebol, enquanto “paus” e “pedras” controlam o que todos sabem, mas fingem não saber. Logo, a música produz efeitos de apagamento da desordem política que imperava no país pela construção de um disfarce cultural e esportivo bem sucedido.

O samba é o ritmo eleito para a canção, entretanto, os modos como a cuíca e os outros instrumentos de percussão são tocados em um dado momento da música também produzem outros efeitos de sentido. A melodia alegre e dançante da música é amenizada e, repentinamente, torna-se lúgubre e suave.

Essas nuances melódicas não podiam sequer ser percebidas pelos censores, porque tinham em mãos apenas os versos da canção, portanto muito se perdia. A análise da DCDP no tocante à música dedicava-se, exclusivamente, ao que era dito, à linguagem verbal, enquanto que o não-verbal era praticamente ignorado. A música é a arte constituída pela harmonização entre sons e silêncio e a ausência de palavras, de maneira alguma, isenta as composições musicais de sentidos. A procura pela imposição do silêncio, feita pela ditadura, era falha, pois o vácuo que tentavam impingir não pode ser obtido. Os sujeitos utilizavam não só das palavras para produzir sentidos de revolta, o que não era dito também significava.

A possibilidade do sentido outro em canções a partir de características não-verbais é argumentada por Souza que discorre a respeito das modulações de voz: