Os jogos olímpicos e o direito à moradia: Barcelona 92 e Rio de Janeiro 2016


resumo resumo

Simone Gonçalves de Paiva
Silvia Cristina Franco Amaral
Ana Elisa Spaolonzi Queiroz Assis



Introdução

Quando Pierre de Courbertain recriou os Jogos Olímpicos, na sua fase moderna, ele pretendia estabelecer que o Olimpismo fosse uma filosofia de vida para os indivíduos, cujos princípios (a amizade, a compreensão mútua, a igualdade, a solidariedade e o "fair play" – “jogo limpo”, em inglês) fossem o mote e por isso foram registrados na primeira Carta Olímpica de 19081.

Contudo em 1924, o Barão de Courbertain deixou o Comitê Olímpico Internacional, por não concordar com a profissionalização dos atletas e por sentir que seus valores estavam sendo “violados”. Os ideais do Olimpismo, principalmente os humanos, nunca foram alcançados (CAHILL, 2000).

O esporte, olhado a partir da perspectiva de Coubertin, deveria estar ligado aos Direitos Humanos2; no entanto, ao longo dos anos, esses ideais têm se tornado muito mais um discurso que uma ação:

 

Devido à ascensão dos esportes ao status de um fenômeno de massa relevante da sociedade industrial moderna, desde o começo do século XX, a relação entre esportes e direitos humanos tornou-se um tema ligado à discriminação contra os direitos básicos do indivíduo3 (BUSS, 2000, p. 64, tradução nossa).

 

Desde aquele período até os modelos atuais dos megaeventos esportivos, muito foi mudando. Atlanta foi um marco da tomada do capital privado; Barcelona, da necessidade de tornar as transmissões globalizadas e de deixar um legado para cidade e País sede. Nos dias de hoje, os eventos grandiosos, de muita investidura midiática, econômica e de transformação dos espaços urbanos, se tornaram um grande símbolo do novo modelo, uma forma construída para ir muito além da exibição esportiva. Tornaram-se uma grande indústria capaz de acelerar o “possível” processo de desenvolvimento econômico e de uma determinada classe social de determinados países - ou seja, daqueles que se prontificam a sediar tais eventos têm o interesse de ampliar o seu mercado local e de projetar-se internacionalmente (MATIAS e MASCARENHAS, 2017).

Segundo Tavares (2011, p. 18), “[...] os megaeventos esportivos passaram a ser vistos como oportunidades de promoção para cidades e países em termos de legados econômicos, urbanísticos, sociais, culturais, ambientais e esportivos, entre outros [...]”. De acordo com o autor, esses fatores explicam o envolvimento de governos diretamente nas candidaturas e na organização desses eventos. Isso resignifica o sentido da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos, “que passam a se relacionar muito mais com aspectos financeiros, interesses públicos e privados, impactos sociais entre outros” (TAVARES, 2011, p. 18). Foi nos anos 1980 que esse processo de engrandecimento dos eventos esportivos se tornou mais forte. Em 1984, os Jogos Olímpicos passaram a ser “vendidos” pelo COI como um projeto de marketing multimilionário (PAYNE, 2006), passando a demandar das cidades sedes um projeto grandioso, com uma série de exigências que abrangem desde os aspectos urbanos, esportivos, à isenção fiscais em benefício do próprio comitê e seus parceiros. Segundo Mascarenhas e Oliveira (2018), desde pelo menos a década de 1980, o COI passou a exigir cada vez mais das cidades sedes: maiores investimentos, instalações cada vez mais luxuosas, projetos grandiosos. Como se sediar as olimpíadas significasse a maior conquista de uma cidade.Os países que apresentam sua candidatura a um megaevento geralmente expõem em seu discurso a capacidade de impulsionar o desenvolvimento urbano, social e econômico. Dão ênfase, em particular, ao crescimento econômico, fator interessante a qualquer país, mas principalmente para aqueles em desenvolvimento. Estes encontram nos jogos a oportunidade de vender a marca, a imagem do país, isto quer dizer, atrair o turismo e principalmente, investidores.

De acordo com Bueno (2008), o esporte se tornou uma vitrine irresistível para certas finalidades políticas e/ou para a promoção de ideologias, assim como se tornou inevitável o envolvimento direto do Estado na sua regulação. Os megaeventos ganharam status de política de desenvolvimento. Por exemplo, uma das exigências do COI para sediar os jogos é o planejamento do Legado Olímpico: o país sede deve apresentar um plano pós-jogos, que contemple tanto o legado esportivo (instalações esportivas) e práticas como o legado social, ambiental etc.

Como relatamos, o marco propulsor deste modelo foi Barcelona. Porém, quando aquela cidade foi escolhida sede dos Jogos Olímpicos, em 1986, ela já tinha um plano de reestruturação urbana, pois, independente dos jogos, tinha como objetivo as melhorias urbanas. Os principais objetivos eram: abrir caminho para o mar, limpar suas águas, se tornar um destino para o turismo, entre outros. Os Jogos Olímpicos serviram para que esse processo fosse acelerado, ainda que alocado ao plano inicial. O projeto olímpico acabou proporcionando algumas mudanças no direcionamento do plano de restruturação urbana de Barcelona, que apresentou uma forte característica voltada para um remodelamento em benefício do turismo (AMARAL, 2014).

No Brasil, o projeto de reestruturação urbana da cidade do Rio de Janeiro se apropriou do plano de ser sede dos Jogos Olímpicos para acelerar e efetivar certos interesses. De acordo com Mascarenhas (2010), este projeto começou a se criar desde a primeira candidatura em 2007. Esta foi elaborada com auxílio de uma consultoria catalã e membros da sociedade civil; sua perspectiva era uma intervenção urbana que possibilitasse a distribuição dos equipamentos esportivos, aproveitando de maneira racional os recursos e as infraestruturas existentes, e ainda, possibilitando a revitalização das áreas mais afetadas e obsoletas. Para tanto, nota-se que esse projeto se construiu muito mais com um perfil de mercado, pois ele acabou sendo direcionado as regiões que receberiam os jogos e as “áreas vitrines da cidade” (Mascarenhas e OLIVEIRA, 2018) caracterizando um processo seletivo com a finalidade de “maquiar” a imagem da cidade em benefício dos jogos e principalmente do mercado.

 

Mascarenhas (2004, 2010, 2011) aponta a profunda transformação ocorrida no modo de produzir a cidade olímpica no transcurso do século XX. Examinando várias edições dos Jogos, percebeu o quanto o urbanismo olímpico de nossos dias extrapolou em muito aquilo que seria um conjunto razoável (e muito menos oneroso que o atual) de instalações (esportivas e habitacionais) e de infraestrutura geral para acolher satisfatoriamente o evento. De um lado, a crescente lista de exigências do COI; de outro, o advento do modelo de cidade empreendedorista para, juntos, produzirem edições monumentais e muito onerosas dos jogos (MASCARENHAS, 2016, p. 57).

 

Esse processo de reestruturação urbana é direcionado a regiões centrais abandonadas e/ou degradadas pela gestão pública e, as quais se tornaram, geralmente, lugar de moradia de famílias de baixa renda. Antes renegadas, passam a ser valorizadas, convertendo-se grandes negócios do setor imobiliário. A fim de reestruturar a cidade para os eventos, o Estado e seus parceiros, muitas vezes, invertem suas prioridades. Ancorado em uma política neoliberal, essa reestruturação visa os interesses do grande empresariado e do setor imobiliário. Logo, os direitos sociais são tratados com menor importância, ou seja, muitos aspectos sociais, como a mobilidade urbana e habitação social, são deixados de lado em favor de aspectos urbanísticos e mercadológicos. A cidade passa a ser reestruturada para certos cidadãos e turistas; acontece um processo de “higienização” dessas regiões antes abandonadas, processo denominado como “gentrificação”.

De acordo com Kennelly e Watt (2012 apud ALMEIDA e BASTOS, 2016), o processo de gentrificação tem se tornado algo comum dentro do projeto olímpico e de cidade, tirando o cidadão de baixa renda de regiões centrais e realocando-o em lugares distantes. A explosão urbanística pela qual tanto Rio de Janeiro quanto Barcelona passaram trouxe graves impactos sociais, como ocorreu com outras sedes de grandes eventos. Nesse sentido, o termo “gentrificação” é definido como um processo de tornar nobre uma região degredada, quando se expulsa dela a população de baixa renda; tal região passar a ser, assim, uma área nobre, remodelada e transformada. De acordo com Paradeda (2015), o termo “gentrificação” começou a ser usado na década de 1950, quando Ruth Glass começou a discutir o processo de enobrecimento das regiões mais pobres de Londres.

Segundo Smith (1996), há duas lógicas do entendimento da gentrificação, contudo o autor se filia àquela segundo a qual a produção do espaço urbano é feita pelos agentes do Estado e imobiliários com investimento/desinvestimento e grandes movimentos do capital. Primeiro, gera-se uma degradação do espaço urbano em questão e nem Estado nem iniciativa privada buscam solucionar os problemas emergentes nessas áreas, levando-as a uma desvalorização. Depois, o Estado, coadunado com o capital imobiliário, oferece projetos de grande impacto, que demandam a remoção da população que ali reside. Posteriormente, os espaços que serviram a tais projetos são elevados a um alto valor de exploração imobiliária. Os grandes eventos têm produzido uma gentrificação que se enquadra muito bem nessa definição de Smith.

Para se reformularem, as cidades aqui analisadas (Barcelona e Rio de Janeiro) apresentaram remoções forçadas ou mediadas pelo Estado, mas com um irrisório valor de indenização aos desalojados. Também aconteceu um processo de abandono dos lugares pelo alto custo de vida que passou a impor-se nas áreas reformadas, tornando-se impraticável ao modo de vida e dentro dos limites da renda dos habitantes anteriores. No Brasil, graças aos Jogos e à Copa do Mundo, de acordo com o Dossiê Megaeventos e Violações dos Direitos Humanos, de 2014, mais de 250 mil pessoas foram removidas de suas casas entre as 12 cidades sedes da Copa do Mundo; a cidade do Rio de Janeiro foi a mais afetada, pois também sediaria os Jogos Olímpicos de 2016 (ANCOP, 2014a, p. 21).

 

As remoções são uma ponta de um projeto de transformação profunda na dinâmica urbana do Rio de Janeiro, envolvendo, de um lado, novos processos de elitização e mercantilização da cidade, e de outro, novos padrões de relação entre o Estado e os agentes econômicos e sociais, marcados pela negação das esferas públicas democráticas de tomada de decisões e por intervenções autoritárias, na perspectiva daquilo que tem sido chamado de cidade de exceção (DOSSIÊ DO COMITÊ POPULAR DA COPA E OLIMPÍADAS DO RIO DE JANEIRO, 2014a, p. 8).

 

Em Barcelona, o bairro Vila Icària, que se localizava próximo ao mar, foi “apagado do mapa” para dar lugar à Vila Olímpica. Além de ter sido reconstruído com outro caráter: comercial e turístico, o que antes era moradia de trabalhadores comuns.

 

A estratégia inclui ainda a periferização das comunidades expulsas para longe de suas redes de inserção econômica, social e cultural, em locais carentes de serviços públicos, o que causa total transtorno ou impossibilidade de assimilação, por exemplo, nos postos de saúde e escolas (PAIVA et al., 2013 p. 5).

 

Neste ponto, é importante salientar aquilo que o Artigo 25 da Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU de 1948 afirma:

 

1. Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência fora de seu controle (grifo nosso).

 

Importante salientar que o direito à moradia, assegurado pela DUDH, não defende apenas o direito de ter um espaço físico para viver: Rolnik (2011, p. 38) afirma que moradia tem um caráter muito mais amplo do que os encontrados nos documentos oficiais:

[...] Uma moradia adequada tem que oferecer uma proteção contra o frio, a neve, as intempéries, as chuvas e o calor excessivo: tem que proteger a pessoa. Mas também, uma moradia adequada é aquela que está ligada a uma infraestrutura. Portanto, tem que necessariamente oferecer para quem mora nela, condições de acesso a água segura, de esgoto e de lixo.

 

Vamos além, e afirmamos que uma moradia digna é aquela que garante uma rede de sociabilidade e o acesso aos direitos universais do ser humano, dentre eles o lazer. No caso brasileiro, lazer é um dos direitos sociais, portanto deve ser garantido pelo Estado.

Ainda que o Brasil tenha assinado a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), na qual, como supracitado, o direito à moradia é considerado fundamental para qualquer pessoa que seja parte de um país membro da ONU, e ainda que a Constituição de 1988 assegure que esse é um direito social, fundamental, a moradia não é um direito plenamente garantido no Brasil, pois depende de uma política pública regulamentada (ZACCARA e MASTRODI, 2016). A Política Pública Habitacional no Brasil ainda é inoperante. Assim também é na Espanha, que faz igualmente parte dos países que assinaram a DUDH; ou seja, o direito à moradia se apresenta na sua constituição desde 1978, mas suas políticas públicas também ainda são deficientes (JAURIETTA, 2014). Isto se observa da mesma forma nas políticas públicas de lazer em ambos os Países.

Percebe-se, com isso, que tanto Espanha quanto Brasil apresentam limites em suas políticas públicas de habitação. De acordo com Saraiva (2006, p. 28), as políticas públicas são “um fluxo de decisões públicas, orientado a manter o equilíbrio social ou a introduzir desequilíbrios destinados a modificar essa realidade”. Elas são a soma das ações dos governos, que agem e influenciam o cidadão diretamente, com a função de melhorar, facilitar e possibilitar a ele o acesso a determinados serviços essenciais. Figueiredo (2017, p. 92) afirma “o Estado tem três tipos de obrigações com relação ao direito à moradia adequada: a obrigação de se abster de atos que ofendam tal direito, de proteger a moradia contra a intervenção de terceiros e de atuar para sua realização”.

 

As políticas públicas deveriam ter se tornado o fio condutor do direito à moradia, mas falta uma política abrangente que não se limita a fornecer moradia a certos grupos sociais com base em compromissos orçamentários4 (JAURIETTA, 2014, p. 6, tradução nossa).

 

Há a percepção de que as políticas sociais são projetos políticos de governo, particulares, que se revezam no poder, e não projetos de Estado; não existe uma continuidade. Além disso, a política se altera de acordo com o interesse do momento, e os Jogos Olímpicos têm se apresentado como uma forte influência nesse processo.

Assim, o objetivo do presente artigo é discutir a legalidade e o impacto no direito à moradia dos cidadãos que sofreram com as remoções e como isto afetou suas sociabilidades e fruição do lazer. Para isso, foi realizada uma pesquisa qualitativa, com um levantamento a partir de documentos e relatórios oficiais, além de dossiês dos comitês populares, a fim de verificar como aconteceram essas remoções, e aferir se e como essas remoções violaram os direitos dos moradores atingidos. Em um primeiro momento, caracterizamos os locais impactados e como se realizou o processo de remoções. Na segunda parte, discutimos os dispositivos legais relacionados ao direito à moradia e sua eventual violação, seu modus operandi, que negou qualquer proteção à população que ali vivia. Por fim, tecemos uma reflexão sobre como essa situação afeta a sociabilidade e, como consequência, o direito ao lazer desta população.

 

As remoções: negociação ou exclusão

“Barcelona 1992” se tornou um ícone de projeto urbano e esportivo que “deu certo”. Até os dias atuais, se discursa sobre o projeto perfeito que transformou a cidade catalã, que conseguiu promover mudanças essenciais em sua morfologia urbana e se tornar uma das metrópoles mais visitadas no mundo5 (AMARAL, 2014). Ao longo dos anos, Barcelona serviu de exemplo para as cidades que viriam a ser sedes dos Jogos; no Brasil, a sua influência foi grande, incluindo grande parte dos assessores de Planejamento Urbano do Rio de Janeiro, que eram catalães (AMARAL, 2014).

Quando Barcelona se candidatou à sede, a Espanha se recuperava de um período ditatorial, e a cidade apresentava uma série de problemas urbanos e sociais. O projeto de reestruturação urbana era uma necessidade e foi acelerado devido aos jogos. O projeto inicial previa a participação da sociedade, uma cidade pensada para o cidadão, preocupada com a questão habitacional e com a mobilidade urbana; no entanto, o projeto se ordenou em nome do turismo e da projeção da cidade no mercado internacional (CAPEL, 2007). O grande desejo da capital catalã era abrir a cidade para o mar e se tornar um destino turístico.

O Rio de Janeiro, em 2007, estava na sua terceira candidatura para sediar os jogos, e pela primeira vez chegou à final do concurso, batendo a capital espanhola, Madrid. O bom momento econômico do país e o suporte incansável do então Presidente Lula são reconhecidos como fatores cruciais para a vitória. O Brasil via os Jogos Olímpicos como um catalisador de investimentos, um projeto capaz de acelerar certas necessidades internas e externas. Os governos dos países sedes vêm utilizando os megaeventos como estratégia de empresariamento das cidades; a partir do projeto, eles preparam as regiões e aguardam o interesse do setor privado em investir, principalmente o setor imobiliário. Mascarenhas afirma:

 

Trata-se, pela natureza intrínseca do fato esportivo, de dotar as cidades de instalações específicas, que atendam às distintas modalidades, dentro de padrões normativos internacionais. Mas, trata-se também, de criar condições de alojamento para os milhares de atletas, pessoal de apoio e membros dos comitês olímpicos, bem como para a imprensa. Além disso, quase sempre a cidade-sede requer expansão ou melhorias em sua infraestrutura geral (transportes, telecomunicações, malha viária etc.). Trata-se, enfim, de um amplo conjunto de intervenções urbanísticas preestabelecidas pelas exigências do Comitê Olímpico Internacional (COI) em seu Caderno de Encargos. (MASCARENHAS, 2014, 0. 57)

 

 Como pontuado anteriormente, as regiões que sofreram com as remoções se localizavam em áreas valorizadas das cidades, mas que eram ocupadas pelas classes baixas e/ou estavam degradadas por algum contexto histórico político. Em Barcelona, o Bairro Vila Icária foi o grande afetado por esse movimento de remoções. Próximo à marina e a uma linha ferroviária, o bairro era uma forte área industrial conhecida como Manchester Catalán6. O seu processo de reestruturação já vinha de 1966, quando foi elaborado o Plan de La Ribera, cujo projeto previa transformar essa área em “[...] uma zona residencial e comercial, e assim valorizar as áreas que deixaram de ser estratégicas para as grandes indústrias que antes as ocupavam7 (CABALLÉ, 2010, p. 1, tradução nossa).

De acordo com Rasillo (1988), a população da Vila Icària se formou aos finais do século XIX devido à chegada das indústrias na região; as empresas que ali se instalaram e faziam questão de contratar os moradores que estavam nas suas cercanias. Sua população, em 1988, girava ao redor de 500 habitantes em 142 casas, em sua grande maioria formada por emigrantes. Segundo a autora, boa parte da população do bairro já tinha se mudado ou sido removida quando o Plan de La Ribeira foi apresentado (RASILLO, 1988). Além disso, devido a esse primeiro projeto, várias das indústrias presentes no Bairro Vila Icária se realocaram em áreas afastadas do centro de Barcelona ou, ainda, se mudaram para outras cidades da Espanha. No entanto, esse projeto no final não foi aprovado, mas reformulado, dando início ao processo de transformação do Bairro. Isso corresponde à escolha de Barcelona como sede dos jogos. O Bairro, antes caracterizado por ser uma zona industrial, foi todo modificado, dando lugar a 1834 residências, tornando-se um bairro de caráter residencial e comercial como planejado. Inicialmente, os apartamentos foram utilizados pelos atletas olímpicos; tratava-se da Vila Olímpica (GARCIA, 2017):

 

Em 26 de julho do mesmo ano foi aprovado, o “Plano Especial de Desenvolvimento Urbano da Orla de Barcelona ao setor do Passeio de Carles I e da Avenida Icària”, a gestão abrange a zona costeira do rio Poblenou e a área onde a futura Vila Olímpica será implantada; os Jogos Olímpicos concederam a carta branca para que o projeto não fosse arquivado como as propostas anteriores8 (PERRONE, 2014, p. 5, tradução nossa).

 

No Rio de Janeiro, o número de bairros e famílias afetadas foi muito maior, mas o Morro da Providência e a Vila Autódromo foram considerados os maiores símbolos dessas remoções. O primeiro tem a sua intervenção urbana ligada ao Projeto do Porto Maravilha, relacionado à expansão e remodelação da zona portuária do Rio, por meio do qual se previa a alteração da malha viária, a criação de novas áreas residenciais, de comércio e serviços, cultura e lazer, reurbanização das favelas, entre outros (RAINHA e FONSECA, 2013, p. 1). A região portuária era considerada uma área degradada, mas que apresentava grande potencial econômico e turístico. Lá foi instalado o grandioso e moderno Museu do Amanhã, que custou cerca de 230 milhões de reais e teve o apoio da iniciativa privada; o porte do museu resignificou aquela área da cidade do Rio que até então estava abandonada. Também ali se instalaram hotéis de grandes redes, reformaram-se prédios que serviriam para abrigar grandes corporações de negócios.

O Morro da Providência é uma das favelas mais antigas do Rio de Janeiro. Sua formação se deve a uma promessa política não cumprida. O governo havia prometido aos soldados do exército brasileiro que, quando voltassem da Guerra dos Canudos, vitoriosos, teriam uma casa para viver na cidade do Rio de Janeiro. Sem ter onde morar, os soldados começaram a se estabelecer na região da Providência, em 1897, que futuramente viria a ser ocupada também pelos escravos libertos pela Lei Áurea (O GLOBO, 2017). É considerada uma das favelas mais perigosas do Rio de Janeiro, com uma população de pouco mais de 4000 habitantes.

A Vila Autódromo, por sua vez, se tornou alvo por estar localizada entre o Parque Olímpico (antigo Autódromo) e a Lagoa de Jacarepaguá. Ela teve seu início em meados dos anos 1960, quando pescadores com suas famílias ocuparam a região próxima à Lagoa de Jacarepaguá, uma área sem qualquer infraestrutura para viver (ASSOCIAÇÃO DE MORADORES E PESCADORES DA VILA AUTODROMO - PLANO POPULAR DA VILA AUTÓDROMO, 2016). Em 1975, os moradores começaram a ser empurrados para outra faixa entre a Lagoa de Jacarepaguá e o Autódromo que estava sendo construído. A comunidade se consolidou em 1987, com o aumento da população, devido às grandes obras dos arredores que atraíram inúmeros trabalhadores. Os moradores criaram uma associação e a partir dela conquistaram uma série de direitos, entre eles energia elétrica, abastecimento de água e o reconhecimento dos direitos à moradia dos moradores da vila pelo Governo do Rio de Janeiro (ASSOCIAÇÃO DE MORADORES E PESCADORES DA VILA AUTODROMO - PLANO POPULAR DA VILA AUTODROMO, 2016). As três regiões destacadas se assemelham por serem caracterizadas como áreas degradadas, mas com grande potencial econômico e turístico, e por estarem valorizadas dentro do mercado imobiliário.

Segundo o Dossiê Megaeventos e Violações de Direitos Humanos no Brasil (ARTICULAÇÃO NACIONAL DOS COMITÊS POPULARES DA COPA E DAS OLIMPIADAS - ANCOP, 2014b, p. 14), a estratégia para as remoções passa por uma sequência de fases: inicia-se com a necessidade de melhoria da mobilidade urbana, com a promessa de proteger a população de riscos ambientais, de melhorias de vida, mas, que, ao final, termina com as remoções violentas e ilegais:

 

As estratégias utilizadas uniformemente em todo o território nacional se iniciam quase sempre pela produção sistemática da desinformação, que se alimenta de notícias truncadas ou falsas, a que se somam propaganda enganosa e boatos. Em seguida, começam a aparecer as ameaças. Caso se manifeste alguma resistência, mesmo que desorganizada, advém o recrudescimento da pressão política e psicológica. Ato final: a retirada dos serviços públicos e a remoção violenta (ANCOP, 2014b, p. 14).

 

Não há registro de remoções violentas (uso da força) em Barcelona. Elas ocorreram a partir de pressões e, em último caso, por meio de processos judiciais, o que se constitui como um tipo de violência simbólica. Rasillo (1988) aponta que as famílias realocadas em outras áreas da cidade demonstraram dificuldade de adaptação aos novos bairros, à distância do trabalho ou da escola, e à separação de familiares e amigos, com que conviviam há muitos anos. Em um dos depoimentos recolhidos por ela, uma ex-moradora da Vila Icaria fala da representação de lar que o bairro tinha para ela e sua família, e como a transição para outra região a deixou sem pertencimento:

 

Toda a minha vida foi no bairro, irmãos do meu pai, primos, a minha irmã se casou e foi morar aqui em Poble Nou, não neste pedaço. Nós sempre vivemos nessa parte entre a rua Princesa e a rua Maria Vila, é a minha casa [...] tive que me mudar, ir para o centro, aqui não havia nada, depois colocaram uma mercearia pequena, uma farmácia, só tinha uma padaria 9 (RASILLO, 1988, p. 38, tradução nossa).

 

No Rio de Janeiro, as famílias removidas foram realocadas, na maioria das vezes, em bairros distantes e em situação tão ou mais precária que aquela em que viviam antes. É possível verificar essa situação nas muitas famílias que foram direcionadas da região da Baia de Guanabara para viver próximo a Baia de Septiba, local onde se concentra o Polo Petroquímico e Industrial do Rio de Janeiro e que apresenta altos índices de poluição (AMARAL, 2014). Além disso, é uma área dominada pelo crime organizado. Em outros casos, as famílias foram indenizadas com o “cheque-despejo”, de acordo com o valor venal das casas, ou uma bolsa-aluguel, com um valor irrisório. Além disso, muitas dessas remoções foram realizadas de maneira forçada e/ou arbitrária. Não há números exatos das remoções, mas as estimativas rondam entre 800 famílias no Morro da Providência (RODRIGUES, 2014) e 391 famílias da Vila Autódromo - cerca de 2/3 de toda a população do bairro foi removida (BETIM, 2015). O Plano Estratégico de Governo 2009-2012 da prefeitura do Rio era de remover 119 favelas até 2012, que de acordo com eles “estavam em locais com risco de deslizamento ou inundação, de proteção ambiental ou destinados a logradouros públicos” (ASSOCIAÇÃO DE MORADORES E PESCADORES DA VILA AUTODROMO - PLANO POPULAR DA VILA AUTODROMO, 2016, p. 13).

É igualmente importante lembrar que a cidade de Barcelona tem uma área de pouco mais de 100 km², enquanto o Rio de Janeiro apresenta um espaço 10 vezes maior, cerca de 1200km². Além disso, a população do Rio de Janeiro é maior em 5 milhões (GIANELLA; DE LA GARZA, 2016), ou seja, de fato é difícil comparar os problemas urbanos e sociais entre duas cidades tão distintas em tamanho territorial e na economia, bem como também levando em conta a época em que os Jogos ocorreram. Contudo, pretende-se ressaltar aqui como as duas cidades abriram mão do seu projeto político urbano com viés social em troca de um projeto voltado ao mercado imobiliário e ao turismo, e como esse projeto olímpico promoveu a gentrificação de modo recorrente.

Mascarenhas e Oliveira (2018) afirmam que, no projeto de cidade capitalista, as remoções de comunidades pobres se tornaram usuais, na perspectiva de abrir espaço para o mercado imobiliário e que essas operações não ocorrem apenas devido aos megaeventos, mas se tornaram parte de um processo baseado em uma política neoliberal que busca transformar a cidade em um produto atrativo aos investidores e ao turismo.

 

A remoção dos direitos

O legado de melhorias ao longo do processo de transformação das cidades, para os eventos esportivos prometia uma sequência de impactos sociais importantes: melhoria da mobilidade urbana, habitação social, transporte público. Contudo, como apresentado no decorrer do artigo, esses impactos se apresentaram, principalmente para uma parte da sociedade, de forma extremamente intensa e negativa. Há conflito direto com uma gestão urbana que se diz amparada por políticas públicas sociais, mas que coloca em cheque os direitos dos cidadãos.

Como já levantado anteriormente, a obrigação do Estado é respeitar, proteger e tornar efetivo o direito à moradia adequada de acordo com a legislação (ROLNIK, 2013). As remoções ocorridas no Rio de Janeiro e em Barcelona acusam uma negação dos direitos ao cidadão, infringindo as próprias leis e as políticas de Estado.

A Constituição Brasileira de 1988 apresenta o Direito à Moradia como um direito social, além de responsabilizar o governo pelo desenvolvimento urbano:

 

Art. 6. São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Art. 21. XX – instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos (BRASIL, 1988).

 

Já a Constituição Espanhola de 1978 assegura a todo cidadão do país o direito à moradia como uma garantia do poder público:

 

Artigo 47. Todos os espanhóis tem direito a desfrutar de uma habitação digna e adequada. Os poderes públicos promoverão as condições necessárias e estabelecerão as normas pertinentes para tornar efetivo este direito, regulando a utilização do solo de acordo com o interesse geral para impedir a especulação. A comunidade participará dos ganhos de capital que gere a ação urbanística dos entes públicos10 (ESPANHA, 1978, tradução nossa).

 

Um aspecto importante relacionado à Espanha é o fato de ela se dividir em comunidades autônomas11, como é o caso da Catalunha. Isto dá à província uma determinada liberdade política e econômica em relação ao Estado espanhol, sem ferir a soberania do País. Em 1992, quando os Jogos Olímpicos se estabeleceram em Barcelona, o estatuto apresentava um único artigo relacionado à moradia: “Artigo 9. A Generalitat da Catalunha tem competência exclusiva sobre [...] 9. A ordenação do território e do litoral, urbanismo e habitação12” (tradução nossa). Este não deixava claro como esse ordenamento habitacional deveria ocorrer e como o governo deveria intervir.

A constituição do estado do Rio de Janeiro está de acordo com a Constituição brasileira: nela, o direito à moradia também é um direito social, que alude à implementação das políticas públicas e direciona a responsabilidade e/ou colaboração com o município do Rio. Quanto a este, se observa uma série de leis (Art.12; Art.234; Art.49) referentes à moradia:

 

Art. 422 - A política urbana, formulada e administrada no âmbito do processo de planejamento e em consonância com as demais políticas municipais, implementará o pleno atendimento das funções sociais da Cidade. § 1º - As funções sociais da Cidade compreendem o direito da população à moradia, transporte público, saneamento básico, água potável, serviços de limpeza urbana, drenagem das vias de circulação, energia elétrica, gás canalizado, abastecimento, iluminação pública, saúde, educação, cultura, creche, lazer, contenção de encostas, segurança e preservação, proteção e recuperação do patrimônio ambiental e cultural (RIO DE JANEIRO, 2010).

 

Com o direito à moradia consolidado na lei, é importante destacar outro ponto: a DUDH defende todo o ser humano de qualquer tipo de invasão arbitrária, regra claramente estabelecida pelo Pacto Internacio nal dos Direitos Civis e Políticos13 (PIDCP) de 1966, que é um dos três instrumentos que estabelecem a Carta dos Direitos Humanos, juntamente à DUDH e ao Pacto Internacional dos Direitos Econômicos Sociais e culturais (PIDESC) de 1976.

 

Artigo 12° Ninguém será sujeito a interferências em sua vida privada, em sua família, em seu lar ou em sua correspondência, nem a ataques à sua honra e reputação. Todo ser humano tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques (DUDH, 1948).

 

O PIDESC, por exemplo, no artigo 11, parágrafo 1, estabelece que a responsabilidade de uma vida digna para qualquer pessoa é responsabilidade do Estado:

 

Artigo 11. Parágrafo 1. Os Estados-partes no presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa a um nível de vida adequado para si próprio e para sua família, inclusive à alimentação, vestimenta e moradia adequadas, assim como uma melhoria contínua de suas condições de vida. Os Estados-partes tomarão medida apropriadas para assegurar a consecução desse direito, reconhecendo, nesse sentido, a importância essencial da cooperação internacional fundada no livre consentimento (PIDESC, 1966).

 

Fica claro que as remoções infringiram uma série de direitos adquiridos e legitimados por ambos os Estados. Na leitura da lei, o direito é declarado e está posto; no entanto, as próprias leis apresentam brechas. A Constituição Espanhola, por exemplo, ainda que apresente o direito à moradia como uma garantia do poder público, em seu Artigo 5314 impede que o cidadão recorra à justiça em nome deste. Ele é considerado um direito de segunda ordem na Espanha, isso é, nenhum cidadão pode recorrer à justiça por este, ao contrário de direitos de primeira ordem, como a vida e a liberdade, que são protegidos. Como levantado anteriormente, o Estado espanhol não dá conta das políticas de moradia e, de certa maneira, é amparado pela justiça em sua omissão (JAURIETTA, 2014), o que se caracteriza como uma forma de fuga, indiretamente, dos seus deveres.

Semelhante à Espanha, no Brasil, a ação judicial não se faz obrigatória para o cumprimento do direito (MASTRODI e BAUTISTA, 2015), apesar de o Estado brasileiro ter o dever de implementar políticas públicas de habitação. Segundo Zaccara e Mastrodi (2016), o direito à moradia só será considerado um direito fundamental de aplicação imediata quando o país possuir uma política pública de habitação. Além disso, um dos discursos do governo para as desapropriações no Rio de Janeiro era de que elas seriam alentadas pelo Artigo 5º, que estabelecia “o procedimento de desapropriação por necessidade ou utilidade publica, o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição” (BRASIL, 1988). Como pode ser visto, não foi uma política adotada, já que as remoções ocorreram de forma truculenta e com valores indenizatórios irrelevantes.

  Não se trata apenas do descaso com a sociedade e o descumprimento em relação às leis e aos direitos de ter uma moradia: todo esse transcurso de “negação” de direitos, por fim, acaba atacando o princípio da Dignidade Humana. Assis (2012, p. 32) afirma que o Princípio da Dignidade Humana engloba todos os direitos fundamentais; não defendendo unicamente o direito de ter direitos, mas que estes sejam efetivos.

Azevedo (2002, p. 116) afirma que o princípio jurídico da dignidade exige como pressuposto a intangibilidade da vida humana; a violação disso fica explícita no momento em que as remoções impactam negativamente a vida dos cidadãos, sem que eles tenham qualquer possibilidade de decisão. As remoções afrontam diretamente este princípio.

Além disso, Azevedo (2002, p. 116) também ressalta que mesmo o princípio da dignidade humana tem a necessidade de se ajustar; isto é, “é preciso compatibilizar a dignidade de uma pessoa com a de outra (e, portanto, alguma coisa da dignidade de uma poderá ficar prejudicada pelas exigências da dignidade da outra)”.

O grande questionamento é que esse ajuste não ocorre. Na situação aplicada, os moradores atingidos já não apresentavam uma “dignidade humana” aceitável, pois estes se encontravam em áreas degradadas, sem infraestrutura, esquecidas pelo poder executivo, ou seja, ali não se aplicava nenhuma política social que lhes transmitissem a efetivação dos direitos. Pelo contrário, a falta de direitos era ainda mais acentuada.

O procedimento de gentrificação dessas cidades é acompanhado por uma série de políticas antidemocráticas, quer dizer, as decisões são tomadas sem participação da sociedade, principalmente do grupo afetado, facilitam a contravenção e o estrangulamento dos direitos. Rolnik (2011) afirma que, quando está para acontecer uma remoção, deve existir um processo de diálogo com a comunidade afetada: esta tem o direito de participar das discussões sobre as possibilidades de permanência e, em último caso, de seu futuro destino, se a remoção for irredutível.

As ações antidemocráticas nada mais são que o resultado de uma série de políticas públicas inoperantes ou inexistentes. A desigualdade da economia, de educação, de informação entre os cidadãos prejudica fortemente a constituição de uma democracia deliberativa (VENEGAS, 2003). Segundo Rolnik (2013, p. 17):

 

O planejamento urbano inclusivo é essencial para promover a integração das comunidades e garantir a disponibilidade de moradias bem localizadas para os pobres. O zoneamento inclusivo exige que uma proporção dos ativos na área seja alocada para habitação para pessoas de baixa renda; e, acordado em contrato para manter a habitação acessível ao longo do tempo, podendo fornecer habitação adequada para os pobres das zonas urbanas (tradução nossa)15.

 

Pode-se pensar que a inexistência desse tipo de diálogo junto à sociedade civil facilita as mudanças e a quebra de “promessas” dos governos, “consentidas” por uma população, muitas vezes, desinformada e/ou mal instruída. As remoções supracitadas ocorreram dentro de um planejamento urbano que não permitiu ao morador dos bairros afetados receber parte dos ganhos e das melhorias que o plano previa; pelo contrário, foi-lhe tirado o direito, entregue a outro.

Um fator importante abordado por Zaccara e Mastrodi (2016, p. 860) é quanto à questão da desapropriação, por meio da qual “o proprietário é indenizado, mas ao morador sem justo título nada é devido pela perda do direito à moradia”. Isso revela que, apesar de se apresentar como direito, a habitação não é garantida; isso porque o direito à moradia, dentro da lei, é assegurado pela “garantia e preservação do direito à propriedade, pois é o que confere ao titular potencial para proteger a coisa contra quem quer que seja” (ZACCARA; MASTRODI, 2016, p. 865).

Na DUDH, o artigo 17 estabelece “1. Toda a pessoa, individual ou coletivamente, tem direito à propriedade. 2. Ninguém pode ser arbitrariamente privado da sua propriedade”. Ainda de acordo com = Zaccara e Mastrodi (2016), o PIDESC defende a moradia como uma garantia de posse, e não de propriedade, como uma forma que garanta proteção legal contra perda judicial, remoção forçada, assédios e outras ameaças (ZACCARA; MASTRODI, 2016, p. 860).

Percebe-se que, apesar de as Constituições de ambos os países analisados fortalecerem o discurso dos direitos humanos, estes são desviados e contrapostos muito em vantagem do mercado e do caráter econômico. Não se desrespeita apenas o direito à moradia, mas o simples direito do cidadão de pertencer a um lugar, que em muitos casos era muito mais que apenas a casa em si: era o contexto de uma comunidade construída em conjunto, uma família. Histórias foram apagadas sem qualquer hesitação.

 

Considerações Finais

Conclui-se que não somente o direito à moradia foi infringido nos contextos analisados, mas isto também acarreta a perda de vários direitos subsumidos a interesses do capital privado e do mercado imobiliário. Um impacto apontado pelo estudo é a perda de uma rede de sociabilidade e, consequentemente, um forte impacto sobre a fruição do direito ao lazer, já que este se constrói como uma ação em sua maioria coletiva e no decorrer de uma vida, e é influenciado pelas oportunidades dos grupos aos quais as pessoas pertencem, bem como pela formação com a qual tem contato.

Barcelona não apresentou remoções forçadas, mas desmantelou todo um bairro em prol dos jogos. Isto beneficiou o turismo que, hoje, se tornou um problema para os moradores, de acordo com a prefeitura da cidade (BLANCHAR, 2017). Os antigos moradores foram realocados em regiões distantes, o que reserva o direito à cidade em grande parte à classe média espanhola e ao turista. No Rio de Janeiro, registraram-se uma série de remoções violentas ou forçadas; ainda que muitas famílias tenham resistido e conseguido permanecer, grande parte se viu obrigada a sair ou foi arrancada sem chance de escolha.

O modo como as remoções se colocaram em Barcelona e no Rio de Janeiro demonstra como o projeto de reestruturação das cidades está intimamente ligado ao processo de empresariamento das mesmas; ele está subordinado ao interesse do grande capital. Nos últimos 30 anos, o Modelo Olímpico tem sido responsável por uma série de intervenções urbanas, vinculadas à valorização e a gentrificação da região (MASCARENHAS, 2014). Harvey (2006) afirma que os megaeventos foram transformados em commodities, ou seja, “tipos especiais de mercadorias culturais que possuem cotação negociabilidade globais”. Importante ressaltar que este modelo de cidade tem se tornado um Modelo Global.

Ainda que não se sedie um evento esportivo, a gentrificação das cidades tem ganhado força, caracterizando-se como um processo de higienização, ao tirar as camadas mais pobres dos grandes centros ou regiões demarcadas como potencialmente lucrativas e remodelá-los como espaços valorizados e destinados às camadas mais ricas. Nessa sequência de ilegalidades, cada dia mais constantes, vemos os direitos sendo esmagados e as cidades se construindo em volta de um modelo de exclusão. O estabelecimento de direitos tem se tornado cada dia muito mais um discurso que uma ação, e pouco se observa de um movimento contrário a este modelo de cidade.

 

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Data de Recebimento: 19/04/2021
Data de Aprovação: 04/05/2021


1  A Carta Olímpica resume os princípios fundamentais do Olimpismo e define a organização e funcionamento do Movimento Olímpico. É o documento que contém as regras que governam as atividades do Comitê Olímpico Internacional e suas entidades afiliadas (COMITÊ OLIMPICO BRASILEIRO, 2009).

2  Após as duas grandes guerras, do início do século XX, a questão dos direitos humanos muda sua perspectiva e o que era antes ligado aos estados nacionais passa a ser afirmado como direito universal. “Em 1948, a Declaração dos Direitos Humanos, da Organização das Nações Unidas (ONU), formalizou o reconhecimento da validade de direitos universais, cujos titulares não são os cidadãos de estados particulares, mas todos os homens” (FERREIRA e FERNANDES, 2015, p. 139). Isto, entretanto não se refletiu tão rapidamente nos esportes, foi somente nos Jogos Olímpicos de 2016 que houve uma equipe de refugiados competindo.

3  No original em inglês: “Due to the rise of sports to the status of a relevant mass phenomenon of the modern industrial society, since the beginning of the 20th century, the relationship between sports and human rights became a theme in relationship to discrimination against the basic rights of the individual”.

4 No original em espanhol: “Las políticas públicas deberían haberse constituido en hilo conductor del derecho a la vivienda, sin embargo se echa en falta una política integral que no quede limitada a proporcionar viviendas protegidas a ciertos grupos sociales en función de los compromisos presupuestarios”.

5  A cidade de Barcelona foi a 23º mais visitada no Mundo, de acordo com a Euromonitor International - http://www.euromonitor.com/about-us. Acesso dia 10 de maio de 2018.

6  Em referência aManchester, cidade inglesa, conhecida por seu caráter industrial.

7  No original em espanhol: “[...]una zona residencial y comercial y así revalorizar unos terrenos  que ya habían dejado de ser estratégicos para las grandes industrias que los ocupaban (tradução nossa)”.

8  No original em espanhol: “El 26 de julio del mismo año, se aprueba el "Pla Especial d´ordenació urbana de la façana al mar de Barcelona al sector del Passeig de Carles I i de l`Avinguda d`Icaria" que abarca la ordenación de la zona costera del Poblenou y el área donde se implantaría la futura Vila Olímpica; las olimpiadas concedieron entonces, la carta blanca para que el proyecto no sea archivado como las anteriores propuestas”.

9  No original em catalão: "tota la meva vida era al barri, germans del meu pare, de cosins, la meva germana es va casar i va anar a viure aqui al Poble Nou, no en aquest tros. Sempre hem viscut per aquell tros des del carrer Princesa al carrer Maria Vila es la meva casa [...] et tenies de desplaçar, anat al centre, aqui no hi havia res, despres es va posar una merceria, petita, una farmacia, nomes hi havia un forn”.

10  No original em espanhol: “Artículo 47. Todos los españoles tienen derecho a disfrutar de una vivienda digna y adecuada. Los poderes públicos promoverán las condiciones necesarias y establecerán las normas pertinentes para hacer efectivo este derecho, regulando la utilización del suelo de acuerdo con el interés general para impedir la especulación. La comunidad participará en las plusvalías que genere la acción urbanística de los entes públicos”.

11  “Artigo 2. A Constituição se fundamenta na indissolúvel unidade da Nação espanhola, pátria comum e indivisível de todos os espanhóis, e reconhece e garante o direito a autonomia das nacionalidades e regiões que a integram e a solidariedade entre todas elas” (ESPANHA, 1978, tradução nossa). No original em espanhol: “Artículo 2. La Constitución se fundamenta en la indisoluble unidad de la Nación española, patria común e indivisible de todos los españoles, y reconoce y garantiza el derecho a la autonomía de las nacionalidades y regiones que la integran y la solidaridad entre todas ellas”.

12  No original em espanhol: “Artículo 9. La Generalitat de Cataluña tiene competencia exclusiva sobre [...] 9. Ordenación del territorio y del litoral, urbanismo y vivenda”.

13  Artigo 17 - Ninguém será objeto de ingerências arbitrárias ou ilegais na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência, nem de ataques ilegais à sua honra e reputação. Toda a pessoa tem direito a proteção da lei contra essas ingerências ou esses ataques (PIDCP, 1966, p. 7).

14  “O reconhecimento, o respeito e a proteção dos princípios reconhecidos no Capítulo Terceiro informarão a legislação positiva, a prática judicial e a atuação dos poderes públicos. Somente poderão ser alegados diante da Jurisdição ordinária de acordo com o que disponham as leis que os desenvolvam” (ESPANHA, 1978, tradução nossa). No original em espanhol: “El reconocimiento, el respeto y la protección de los principios reconocidos en el Capítulo Tercero informarán la legislación positiva, la práctica judicial y la actuación de los poderes públicos. Sólo podrán ser alegados ante la Jurisdicción ordinaria de acuerdo con lo que dispongan las leyes que los desarrollen”.

15 No original em espanhol: “La planificación urbana inclusiva es fundamental para promover la integración de las comunidades y asegurar la disponibilidad de viviendas bien ubicadas para los pobres. La zonificación inclusiva requiere que una proporción de los bienes de la zona se destinen a viviendas para personas de bajos ingresos; y, si se combina con un mandato para que las viviendas sigan siendo asequibles con el paso del tiempo, puede proporcionar viviendas adecuadas a los pobres de las zonas urbanas”).