Memória e movimento no espaço da cidade: Para uma abordagem discursiva das ambiências urbanas


resumo resumo

Carolina Rodríguez-Alcalá



nos estudos sobre a ambiência, nos quais tal crítica é formulada a partir do postulado da não separação entre organismo e ambiente de Dewey (cf. THIBAUD, 2004). Para Dewey, o organismo e o ambiente não têm existência autônoma, não são “existências ou formas de existência substancialmente separadas” (DEWEY, e BENTHLEY, 1949, p. 123 apud THIBAUD, 2004, p. 231-232, tradução nossa), mas são antes duas vertentes complementares de um mesmo processo, constituindo uma unidade. A ambiência teria a ver com essa unidade do “monde environnant expériencé”, ou situação, base da experiência humana. O que faz com que, como afirma Thibaud (ibidem, p. 231), possamos estar numa ambiência “mas jamais frente a ela”, que não possamos “propriamente falando contemplá-la, observá-la à distância ou circunscrevê-la precisamente”. O que nós postulamos é que a linguagem tem um papel central na constituição dessa relação sujeito/espaço, o que pode contribuir para determinar a natureza e o funcionamento da dimensão simbólica das ambiências urbanas. Isso exige, porém, que nos situemos frente à relação entre a linguagem e a percepção sensível tal como estabelecida nesse campo de estudos.

É na definição do caráter imediato da experiência situada que a questão da linguagem se coloca. A ambiência, enquanto fenômeno perceptivo, remeteria ao “sentimento da situação”, isto é, ao impacto primeiro e global, anterior à representação consciente e a qualquer tentativa de discriminação dos diferentes elementos sensoriais envolvidos, sendo possível nesse sentido aproximá-la, como sustenta Thibaud, da noção de qualidade difusa de Dewey:

 

A impressão dominante global vem primeiro, talvez na apreensão do esplendor da paisagem, ou pelo efeito que tem sobre nós a entrada numa catedral, quando a luz tênue, o incenso, o vidro colorido e as proporções majestosas se fusionam num tudo indistinto. Nós dizemos a justo título que uma pintura nos toma. Há um impacto que precede todo reconhecimento preciso daquilo de que se trata.

[L’impression dominante globale vient en premier, peut-être dans le saisissement de la splendeur du paysage, ou par l’effet qu’a sur nous l’entrée dans une cathédrale quand le faible éclairage, l’encens, le verre coloré et les proportions majestueses fusionnent dans un tout distinct. Nous disons à juste titre qu’une peinture nous saisit. Il y a un impact qui précède toute reconnaissance précise de ce dont il s’agit.] (DEWEY, 1980, p. 145, apud THIBAUD, 2004, p. 239) (grifos nossos)

 

É importante destacar que essa afirmação do caráter imediato da experiência não deve ser remetida a uma visão empiricista, mas sim entendida no sentido de que ela não é mediada pela representação consciente: