Memória e movimento no espaço da cidade: Para uma abordagem discursiva das ambiências urbanas


resumo resumo

Carolina Rodríguez-Alcalá



Esses são os pressupostos que direcionam as pesquisas que realizamos sobre a cidade no interior da área saber urbano e linguagem[1], caracterizada por tomar a cidade como objeto de linguagem e analisá-la através do dispositivo teórico-metodológico da AD. Nossa concepção se distingue, de um lado, daquela da sociolingüística urbana, que pressupõe uma relação não constitutiva, mas de co-variação entre linguagem (sujeito) e cidade: esta seria um fator externo (geográfico), entre distintos fatores (subjetivos e sociais) que determinam a variação e mudança lingüísticas, tais como idade, sexo, estatuto sócio-econômico, origem étnica, entre outros[2] (cf. Rodríguez-Alcalá 2002). Nossa concepção da relação cidade-linguagem tampouco se confunde com a relação de analogia assumida em outras disciplinas que se ocupam do espaço, pois para nós não se trata de definir o funcionamento da cidade tendo como modelo o funcionamento da língua, tomando a Lingüística como “ciência piloto” do mesmo modo que ela inspirara o desenvolvimento da antropologia estrutural de Lévi-Strauss, as elaborações a partir dos conceitos de língua e significante na psicanálise lacaniana, ou certas abordagens semióticas da cidade inspiradas na reflexão instaurada por Ferdinand de Saussure[3], por citar alguns exemplos (cf. id. ibid.). Nosso objeto é outro. Tomar a cidade como objeto de linguagem é defini-la enquanto “espaço simbólico particular, que tem sua materialidade e suas formas específicas de significar” (ORLANDI, 1999), o que faz da língua um observatório dos fenômenos urbanos (e subjetivos).

É possível entrever, a partir do que foi posto, algumas afinidades entre a AD e a perspectiva fenomenológica que sustenta a definição de ambiência, que destacamos a seguir. Não pretendemos com isso, entretanto, e cabe deixar isso muito claro, reduzir uma perspectiva à outra ou empreender um debate mais amplo e aprofundado sobre as mesmas, mas apenas identificar pontos de articulação possíveis, de confluências e divergências, visando contribuir para o debate multidisciplinar que nos propusemos e determinar o interesse que uma reflexão discursiva da linguagem pode vir a ter para a problemática das ambiências.

Podemos dizer que, ao pressupor uma relação constitutiva entre sujeito e espaço, a AD partilha da crítica à oposição positivista clássica entre sujeito e objeto assumida

 


[1] Desenvolvida pela equipe do Laboratório de Estudos Urbanos/Nudecri, da Unicamp.

[2] Como podemos conferir na leitura das definições de sociolingüística, dialetologia ou geolingüística nas obras de referência das ciências da linguagem (cf. Dubois et alii 1973; Hartmann et Stork 1972; Marouzeau 1971; Crystal 1987).

[3] Quem em seu Curso de Lingüística Geral (1916), obra póstuma escrita e publicada a partir das anotações de seus alunos, desenhou os contornos atuais da Lingüística enquanto disciplina científica.