“Cara de empregada doméstica”: Discursos sobre os corpos de mulheres negras no Brasil*
Mónica G. Zoppi Fontana Mariana Jafet Cestari
paramanter a forma,valetsnos restaurantes para estacionar os carros, etc.[...]
Com as classes médias o quiproquó é maior: os seus estratos mais tradicionais e conservadores agem quase como um espelhamento deformado das classes proprietárias e vociferam a “revolta da sala de jantar”: não será estranho se começarem a defender o direito das trabalhadoras domésticas não terem os direitos ampliados. E sua bandeira principal já está indicada: são contrárias à ampliação dos direitos das trabalhadoras domésticas para lhes evitar o desemprego.
Como vimos nas análises, o acontecimento discursivo da “PEC das empregadas domésticas”deu visibilidade a sentidos longamente apagados que trouxeram para a cena política a memóriado discursoescravagista e das lutas do movimento negro e especificamente das mulheres negras contra a exploração.Como efeito dessa filiação de sentido a expressão “cara de empregada doméstica” foi afetada por um processo demetaforizaçãoque deslocou a designação e lhe embaralhouos sentidos, legitimando e enaltecendo a prática desses sujeitos sociais. A partir de março de 2013 a menção às “empregadasdomésticas” ganhou nova e maior circulação no discurso social e,por meiode um processo demetaforização,passou a significar de forma emblemática os sentidos da resistência à opressão. Porém, por efeito de generalização, esta designação também condensou, como metáfora, os sentidos de “ascensão social pelo esforço pessoal”, com o consequente apagamento da memória de luta política.
A imagem da deputada Benedita da Silva discursando no Parlamentona sessão em homenagem ao Dia do Trabalhador Doméstico (acontecida em 29de abril de 2014)pode ser considerada umíconedesse funcionamento metafórico: a empregada doméstica que chegou ao poder e quedá corpo, cara e voz a luta contra a opressão.