Mascarados no espaço urbano: discurso jornalístico sobre Jornadas de Junho e pandemia de Covid-19


resumo resumo

Vinicius Brito



1. Introdução

— Quem é você? / — Adivinha se gosta de mim! / (...) Mas é Carnaval / Não me diga mais quem é você / Amanhã tudo volta ao normal / Deixa a festa acabar, / Deixa o barco correr (Chico Buarque - “Noite dos Mascarados”)

 

As palavras significam na relação com a exterioridade, um fora-dentro que se inscreve no texto e produz efeitos nas práticas discursivas. Os sentidos não têm origem “nem no sujeito (onto) nem na história (filo)” (ORLANDI, 2008b, p. 49), porque o que constitui as discursividades são os efeitos de sentido para locutores (PÊCHEUX, 1997; ORLANDI, 2007), uma linguagem em movimento. É de se pensar, então, que o gesto simbólico de usar máscara signifique diferentemente na história, por condições de produção que investem sentido na língua. A partir desse quadro teórico inicial, busco compreender aqui como sujeitos mascarados e máscaras no espaço urbano significam no discurso jornalístico? Com tal questão de pesquisa, que situa a significação ideologicamente, enquanto trabalho da interpretação no sujeito, o objetivo desta análise será compreender o discurso sobre máscara e mascarados na imprensa em dois momentos distintos, seja na interpretação dos jornais sobre as Jornadas de Junho — especialmente quanto à tática de black blocs — em 2013, seja na cobertura midiática sobre a pandemia de Covid-19, que assola o país e o planeta, perturbando um mundo logicamente estabilizado, desde dezembro de 2019.

Nesse processo, as condições de produção são indispensáveis para o dizer jornalístico funcionar, implicando as dimensões material, institucional e imaginária do discurso, em situação histórica ampla (constituição) e circunstâncias específicas de formulação e circulação (ORLANDI, 2008a, 2009). Pensando, justamente, as condições de produção que significam o sujeito mascarado em eventos recentes da história brasileira, o espaço urbano, atravessado pela linguagem, resulta como pano de fundo para compreender as relações sociais “nesse espaço simbólico específico que é a cidade” (ORLANDI, 1999, p. 3). Entre a organização (reprodução) e a desorganização (ruptura) citadinas, irrompem “falas desorganizadas que significam lugares onde sentidos faltam, incidência de novos processos de significação que perturbam ao mesmo tempo a ordem do discurso e a organização do social” (ORLANDI, 1999, p. 3).

O discurso jornalístico, por sua vez, significa “redes interdiscursivas, por meio de retomadas, réplicas, atualizações e deslocamentos de outros tantos já-ditos, de dizeres oriundos de campos diversos” (SCHWAAB, ZAMIN, 2014, p. 53). A imprensa, ao significar um acontecimento, interpretando o contraditório citadino, (re)produz “um já-dito cristalizado no senso comum e que assume aspecto de verdade incontestável, porque ‘evidente’” (MENDONÇA, DAEMON, 2014, pp. 39-40). Mas a retomada/atualização dos já-ditos no discurso sobre as Jornadas de Junho e a crise epidêmico-político-social causada pelo novo coronavírus, por exemplo, é possível pela narratividade jornalística (MARIANI, 1996, p. 107), memória discursiva que institucionaliza o dizer, “tece e conduz nos jornais o ecoar das repetições parafrásticas”, “misturando passado, presente e futuro”. Os discursos “sobre” na imprensa também regulam sentidos, reduzem a memória, autorizam versões sobre o real, estruturam a polifonia do espaço urbano e são um “lugar importante para organizar as diferentes vozes (dos discursos ‘de’)” (ORLANDI, 2008b, p. 44). Afetada pelos discursos “sobre”, a narratividade produz efeito de estabilidade nos textos jornalísticos de forma que, antes de folhear um jornal, “o sujeito-leitor tem para si um modo de encarar o periódico e suas seções, uma maneira de organizar os discursos sobre o espaço urbano, na percepção imediata das folhas volantes” (BRITO, 2020, p. 36). Por outro lado, o funcionamento da narratividade possibilita ao analista do discurso observar no arquivo jornalístico repetições linguageiras, podendo construir  um corpus discursivo.

Sabendo, diante do dispositivo teórico-analítico da Análise do Discurso, que a interpretação dos materiais relacionados ao corpus não deve apontar, segundo Pêcheux (2011, p. 291), “‘o’ sentido dos textos, mas somente construir procedimentos expondo o olhar-leitor a níveis opacos à ação estratégica de um sujeito”, neste trabalho reúno recortes[1] dos jornais Folha de São Paulo e O Estado de São Paulo, dois dos maiores veículos de jornalismo profissional do Brasil, que significam sujeitos e máscaras no espaço urbano no período das Jornadas de Junho e da pandemia de Covid-19. Apesar de os textos terem sido compilados, inicialmente, a partir da busca do termo “máscara” (associado, pelo mecanismo de “+”, a termos como “black bloc”, “jornadas de junho”, “manifestação”, “protesto”, “coronavírus” e “Covid-19”) no arquivo dos dois jornais paulistas (nos sites https://www.folha.uol.com.br/ e https://www.estadao.com.br/, respectivamente), compreendo texto enquanto materialidade significante, modo pelo qual o sentido é formulado (LAGAZZI, 2010), em um processo contínuo de verbal e não verbal simbolizando o gesto “mascarado” no urbano pela narratividade jornalística.

 

2. Do acontecimento discursivo das Jornadas de Junho ao da pandemia de Covid-19

Questões ligadas às Jornadas de Junho e à pandemia de Covid-19 podem ser lidas pelo discurso científico de diferentes modos, a partir do olhar do sujeito-cientista e da institucionalização das disciplinas do saber, na produção do conhecimento humano. No entanto, nesta análise, considero os dois fenômenos sociais um acontecimento discursivo, constituindo uma memória social (PÊCHEUX, 1999) que funciona nas práticas linguageiras. Nesse sentido, o acontecimento discursivo ocorre no “ponto de encontro de uma atualidade e uma memória” (PÊCHEUX, 2015, p. 17) ou, em outras palavras, se dá no momento de formulação do discurso pelo sujeito, no cruzamento do interdiscurso com o intradiscurso. Essa noção implica, também, a possibilidade da formulação enquanto série de pontos de deriva, de forma que “todo enunciado é intrinsecamente suscetível de tornar-se outro, diferente de si mesmo, se deslocar discursivamente de seu sentido para derivar para um outro” (PÊCHEUX, 2015, p. 53). Metaforização de sentidos na língua, historicamente, tecendo outras interpretações possíveis em uma rede significante.

Desse modo, o acontecimento discursivo das Jornadas de Junho, expressão que nomeia os protestos que ocorreram em todas as regiões do Brasil durante e após a realização da Copa das Confederações, em 2013, contribui para “reformatar os protestos de rua conferindo-lhes a aparência de novidade que desloca os sentidos pré-existentes do/sobre o ativismo político-social, agora sob a modalidade de webativismo, estabelecendo novas formas de subjetivação política” (UCHÔA-FERNANDES, 2019, p. 35). As Jornadas de Junho, cuja primeira pauta colocava em questão o aumento da tarifa do transporte público na cidade de São Paulo, são um “objeto ainda em jogo que, ao mesmo tempo em que se inscreve na memória política e social do país, aponta para a latência de um acontecimento ‘em progresso’” (UCHÔA-FERNANDES, 2019, p. 297). O autor defende, ainda, que a discursividade sobre os protestos de junho de 2013 na imprensa, no cruzamento do inter e do intradiscurso, segue produzindo derivas “cujos efeitos incidem sobre os modos de dizer e os processos de subjetivação política” (UCHÔA-FERNANDES, 2019, p. 35).

A atualização da memória social pelo acontecimento discursivo das Jornadas de Junho — e dos mascarados black blocs, em tática que se tornou bastante conhecida dos brasileiros, pela circulação de discursos midiáticos à época — afetou, segundo Uchôa-Fernandes (2019), amplamente, o processo de mobilização coletiva, sendo os sentidos desses protestos disputados, a partir de 2013, por diferentes forças institucionais, incluindo grupos políticos, como o Movimento Brasil Livre e o Movimento Vem pra Rua, e conglomerados de comunicação, como a Folha e o Estadão, na tentativa de produzir interpretações, com efeito de unidade/homogeneização de pautas diversas, para as reivindicações sociais na cidade brasileira. Inicialmente, os protestos de 2013

 

foram capazes de ameaçar os sentidos aparentemente tão estabilizados até aquele momento: o sucesso das administrações de Lula, Dilma e Cabral; a “evidência” de que o Brasil finalmente se tornava protagonista na ordem política e econômica mundial; a “felicidade” e o “orgulho” dos brasileiros (e principalmente dos cariocas) por receber a Copa do Mundo e as Olimpíadas, entre outros. Tal ameaça simbólica, por sua vez, acaba por acionar um contradiscurso “violento” por parte da grande imprensa, cujo objetivo implícito será o de tentar reassumir o controle discursivo pelo direito de nomear o mundo. (MENDONÇA, DAEMON, 2014, pp. 41-42)

 

Enquanto acontecimento discursivo, as manifestações que tomaram as ruas do Brasil naquele ano ressoaram para além das Jornadas de Junho, fazendo “emergir uma nova discursividade, única e múltipla, singular e polifônica” (SOUZA, 2019, p. 129), metaforizando os sentidos de protesto urbano no país e fortalecendo, segundo Souza (2019, p. 129), a “repressão do aparelho estatal e jurídico às mobilizações que se seguiram em 2014 nos protestos contra a Copa do Mundo” e o “discurso da polarização política, que ganhou força nas eleições de outubro de 2014”. No discurso, por ser a metáfora da divisão social, e no urbano, por “catalisar” essa divisão da sociedade (ORLANDI, 1999), os modos de simbolizar o real são atualizados e, regularmente, há uma injunção repressiva do Estado a medidas de contenção à desorganização (inscrita em falas desorganizadas) na cidade. A disputa de sentidos, então, não reflete, mas, sim, constitui a rede complexa de relações subjetivas em uma formação social.

Finalizando a década de 2010, porém, outro acontecimento discursivo perturbaria um mundo logicamente estabilizado, pela estrutura capitalista neoliberal, no processo de individuação dos corpos, fazendo irromper novos sentidos de máscara e sujeitos mascarados no espaço urbano pela narratividade jornalística. Ao final de 2019, uma doença altamente contagiosa surgiu em uma região central da China (Wuhan), espalhando-se rapidamente por outros países e continentes. Diante do novo coronavírus, causador da doença Covid-19, até então desconhecida da humanidade, as “palavras se encharcam de sentidos de pandemia e as nossas interpretações se espalham inquietas, sentidos fogem” (ORLANDI, 2020, n. p.).

Por sua vez, o momento de ruptura (crise/s) provocado pelo novo vírus pode ser lido, de acordo com Orlandi (2020, n. p.), enquanto acontecimento discursivo, pois, historicamente, pelo trabalho da interpretação em nós, o sentido de pandemia passa a dominar as discursividades: “sobretudo, no que dizemos paira a metaforização dessa ameaça global”, diante da possibilidade de contágio pelo novo coronavírus, afetando tanto as posições sujeito quanto as práticas discursivas, na transferência de sentidos equívocos, de forma consciente ou inconsciente, segundo a autora. “Esse pode ser um ponto de partida, a metaforização da pandemia atravessando fronteiras na linguagem e distinguindo sentidos, irrompendo em palavras que surgem de qualquer parte” (ORLANDI, 2020, n. p.). Conforme escrevemos alhures (BRITO et al., no prelo), no que enunciamos transborda os sentidos de pandemia, simbolizando a doença e a ignorância sobre as complicações da SARS-CoV-2 (nome para a síndrome respiratória desencadeada pelo novo vírus) em nossos corpos. E, como o discurso é um “índice” de agitação na identificação dos sujeitos (PÊCHEUX, 2015), podendo vir a ser um discurso outro, pela determinação histórica dos sentidos, “algo do mesmo está nesse diferente; pelo processo de produção de sentidos, necessariamente sujeito ao deslize, há sempre um possível ‘outro’, mas que constitui o mesmo” (ORLANDI, 1996, p. 81). Diante do “susto global” e da injunção a simbolizar o acontecimento, a ordem do discurso se impõe, em um processo, concomitante, de atualização do dizível.

Desta forma, os acontecimentos discursivos das Jornadas de Junho e da pandemia de Covid-19 atualizam sentidos sobre mobilização social no Brasil (com rostos mascarados perturbando a lógica/organização capitalista da cidade) e a maneira de conviver com o “outro” no espaço urbano (a partir da imposição de uso de máscara, da adoção de quarentena e das medidas de isolamento social/físico e distanciamento social/físico[2], devido ao risco de contágio por coronavírus). Tanto no primeiro fenômeno (os protestos de 2013 e a tática black bloc) quanto no mais recente (a pandemia de Covid-19), não podemos assumir que os sentidos se constituem do “zero”, muito pelo contrário, já que a significação se estabelece pelo encontro do eixo vertical (estrutura interdiscursiva) com o horizontal (intradiscurso), funcionando no dizer. Seja na discursividade sobre as Jornadas de Junho, seja nos discursos afetados/contaminados pela pandemia na mídia, a máscara irrompe como um elemento comum, repetível, uma materialidade significando sujeito e espaço em relação a acontecimentos discursivos, o que pode contribuir para a compreensão de que o “mesmo” e o “diferente” significam historicamente, atando sentidos de “máscara” não à palavra em si, mas em relação às condições de produção histórico-ideológicas, no ecoar das séries parafrásticas (e do deslize, significando diferentemente) nos jornais.

 

3. Mascarados em “confronto”: black blocs na cidade

As Jornadas de Junho gritaram, inicialmente, contra o encarecimento do acesso ao transporte público em São Paulo e, ao longo do segundo semestre de 2013, as reivindicações se dispersaram, transcendendo, parcialmente, o aspecto econômico das pautas. Mas, diante da polissemia[3] dos protestos urbanos naquele ano, um grupo, geralmente composto por manifestantes mascarados e vestidos de preto, ganhou protagonismo por intervir na cidade radicalmente, depredando, de acordo com Dornelas (2015, p. 12), elementos que simbolizam o universo financeiro (bancos, concessionárias de carros, lojas etc.), “uma maneira simbólica de demonstrar oposição ao capitalismo”, e o patrimônio público (como prédios administrativos, placas de sinalização, lixeiras etc.), inscrevendo a “insatisfação com as instâncias governamentais vigentes” nas ruas. Essas intervenções no espaço urbano, em geral, após as “manifestações pacíficas”, estão intimamente relacionadas a

 

uma tática de ação direta denominada ‘black bloc’ (do inglês, bloco negro). Não se trata de um movimento, mas de uma maneira de agir coletivamente. Os grupos que dela se utilizam estão espalhados por inúmeros países. Agem prioritariamente vestidos de preto e com os rostos cobertos, para evitar identificações e possíveis repressões por parte da força policial, bem como para conferir unidade aos adeptos. (DORNELAS, 2015, pp. 12-13)

A tática black bloc surgiu, pela primeira vez, entre militantes do movimento autonomista de Berlim Ocidental nos anos 1980, ao decidiram se impor a uma evacuação forçada de imóvel, sob força policial. Em três décadas, grupos de black blocs, nomeação dada pelos policiais alemães naquele primeiro momento, foram organizados em várias nações, a partir de uma reunião inicial para consolidação de táticas e, depois, da apresentação dos manifestantes na cidade com roupas e máscaras negras, elementos que significam o grupo enquanto contingente e dificultam tanto o reconhecimento de uma liderança quanto a prisão de um integrante especificamente. Um objetivo importante para um black bloc na rua seria “expressar uma presença anarquista e uma crítica radical no interior de uma manifestação. Assim, oferece a militantes a possibilidade de realizar ações diretas, pois a massa na qual eles se fundem lhes garante uma solidariedade política e protege seu anonimato” (DUPUIS-DÉRI, 2016, pp. 68-69). Apesar de nas Jornadas de Junho o grupo ser significado pela imprensa, em grande parte, enquanto “vândalo” e “baderneiro”, as ações black blocs podem compreender desde o arremesso de coquetéis Molotov em lojas até a formação de um corpo de enfermeiros voluntários, para ajudar manifestantes feridos.

No Brasil, podemos situar as Jornadas de Junho como acontecimento discursivo, reorientando sentidos, na tentativa (ideológica e, possivelmente, não completamente consciente por parte dos jornalistas) de a imprensa definir o sentido das manifestações populares no país em 2013; houve, por exemplo, relações parafrásticas, tecidas por jornalistas e fontes jornalísticas, entre aqueles protestos e outros movimentos sociais pelo mundo, como a Primavera Árabe, em 2010, e o Occupy Wall Street, em 2011 (DORNELAS, FRANÇA, 2016), com pautas político-econômicas similares e coincidência do webativismo. A respeito da tática black bloc, também se pode observar a disputa de sentidos na narratividade jornalística, recortando a memória e enquadrando-a em já-ditos. Na imprensa, segundo análise de Dornelas e França (2016, n. p.), por um lado, “a maioria das falas rotulou as ações como ‘baderna’, ‘arruaça’ e responsáveis por transformar nossas cidades em ‘verdadeiras praças de guerra’”, implicando o “dualismo que tomou conta de quase todos os relatos sobre o acontecimento: manifestantes pacíficos e vândalos”. Por outro lado, “houve quem defendesse a tese de que o grande vândalo seria o próprio Estado brasileiro, responsável por uma polícia sanguinária, e abusiva e incapaz de prover a população de serviços públicos de boa qualidade” (DORNELAS, FRANÇA, 2016, n. p.).

Na incompreensão sobre o acontecimento discursivo, sentidos entram em disputa nos jornais, constituindo consensos imaginários sobre as manifestações de 2013 e a tática black bloc no país, significando sujeitos (mascarados) no espaço simbólico da cidade pela oposição entre “punks” e “ativistas do paz e amor”, por exemplo, em R1.

 

R1: Com flores amarelas e brancas nos cabelos, um grupo se reunia aos pés da escadaria do Theatro Municipal de São Paulo na última quinta-feira. No topo da escada, conversava uma turma de cortes moicanos, jaquetas pretas com símbolos anarquistas e toucas cobrindo todo o rosto. (...) Uniram ali suas diferenças para lutar contra ao menos uma coisa em comum: o aumento na tarifa dos transportes públicos (...). Apontados como membros da ala violenta, os punks do topo da escada se defendiam (...). Mas o grupo reconhecia ter realizado em outros atos o Black Bloc - uma forma de ativismo que defende ações “para causar danos materiais às instituições opressivas”. Na prática, picham paredes e quebram vidros de bancos (BEDINELLI, 2013, n. p)
R2: Sentado num banco da praça da República, Danilo Henrique, 32, mexe no suspensório e deixa à mostra uma cicatriz que começa no cotovelo e termina no ombro. “Foram cinco pinos”, conta. “Porrada de cassetete na Marcha da Maconha de 2011.” (...) Ele defende agir contra a lei e depredar patrimônio privado se as ações tiverem “finalidade”. No caso, “derrubar bancos e corporações que exploram gente vulnerável” (SENRA, 2013, n. p.).

 

Neste recorte inicial, retirado de uma das primeiras matérias da Folha sobre as Jornadas de Junho, a narratividade costura as diferenças entre um grupo “com flores amarelas e brancas nos cabelos” e uma “turma de cortes moicanos, jaquetas pretas com símbolos anarquistas e toucas cobrindo todo o rosto”, significando-os enquanto “ativistas do paz e amor” e da “ala violenta”, respectivamente. O discurso jornalístico trata de enquadrar o acontecimento, chancelando-o como verdade, gesto que se materializa, por exemplo, na formulação “Na prática, picham [os black blocs] paredes e quebram vidros de bancos”, desautorizando (discurso “sobre”) o que o grupo de black blocs defendera — em trecho, entre aspas, marcado pelo discurso “de” (do “outro”, da fonte jornalística) —, “‘causar danos materiais às instituições opressivas’”. Com efeito, nesse texto, a manifestação, apesar de reunir grupos distintos, possibilitaria aos manifestantes unir diferenças[4] para “lutar contra ao menos uma coisa em comum”.

Já em R2, na matéria “‘Depredar fast-food tem um significado’, diz manifestante ‘black bloc’”, a Folha faz uma entrevista/perfil com um membro do grupo black bloc em São Paulo (marcado/inscrito de “porrada de cassetete” no seu corpo), que trata de atribuir “um significado” (disputa por sentido) às táticas, seja “derrubar bancos e corporações que exploram gente vulnerável”. É interessante que o jornal tenha feito circular, já em outubro de 2013, esse dizer “dos” black blocs, que não assumem uma liderança específica, reivindicando/significando outro lugar (com uma “finalidade”) para as ações do grupo nas Jornadas de Junho, diante de uma memória sobre os protestos Black blocs saturada pela ideia de “baderna”.

No entanto, a narratividade jornalística, em grande medida, significa as Jornadas de Junho (e as manifestações que se seguiram em 2013) pelos momentos de “confusão” (quando se encerra a ala do “paz e amor”) entre manifestantes e forças policiais, a exemplo de R3, no qual se lê que um homem foi “detido por se recusar a retirar a máscara que usava e se identificar para os policiais”; a máscara é aí um elemento que impede o reconhecimento do sujeito pela polícia, podendo levá-lo à detenção, em demonstração de força dos aparelhos do Estado e de seus mecanismos punitivos. O texto também desassocia o “grupo mascarado” dos “demais manifestantes” por os “mascarados” não portarem “elementos que os ligassem às centrais sindicais”, centrais estas que, de forma similar ao gesto da polícia, passaram a exigir que os manifestantes mascarados retirassem a máscara, cabendo, caso não fosse a medida acatada pelo sujeito, a punição de deixar o protesto.

R3: A confusão começou pouco após um homem ser detido e logo depois liberado pelos policiais. Quando ele foi solto, manifestantes que estavam no fim do protesto começaram a atirar objetos em direção aos policiais, que reagiram usando jatos de spray de gás de pimenta. (...) O homem tinha sido detido por se recusar a retirar a máscara que usava e se identificar para os policiais. A passeata estava começando, mas o grupo mascarado que o acompanhava -em torno de 60 pessoas- se afastou dos manifestantes- (...). O grupo se distinguia dos demais manifestantes por não carregar cartazes com reivindicações ou elementos que os ligassem às centrais sindicais organizadoras da passeata. (...) Do alto dos carros de som, organizadores da passeata pedem para que as pessoas tirem as máscaras ou saiam da manifestação. (MANIFESTANTES..., 2013, n. p.)

R4: O protesto, convocado na página “Black Bloc RJ” no Facebook, reuniu cerca de 50 pessoas, muitos mascarados, em frente a um hotel em Copacabana onde Cabral seria homenageado pela Câmara de Comércio França-Brasil (...). A confusão começou por volta das 20h, na altura da Praça do Lido, onde os manifestantes teriam arremessado dois explosivos (popularmente conhecidos como “cabeção de nego”) contra os policiais (GOMES, 2013, n. p.)

R5: Cerca de 60 pessoas participaram do ato, que começou às 17 horas. A confusão começou quando um grupo tentou entrar por um portão lateral do Fórum e foi barrado por policiais e seguranças. O portão automático foi acionado e manifestantes o seguraram, impedindo que fosse baixado. Houve tumulto e pancadaria entre policiais, seguranças e manifestantes. Ovos, lixeiras e placas foram atirados contra policiais e seguranças, que jogavam cavaletes de ferro. (PROTESTO…, 2013, n. p.)

 

Em R4, a notícia sobre o protesto contra Sérgio Cabral (hoje, ex-governador do Rio de Janeiro e preso pela Operação Lava Jato), marcado para ocorrer no mesmo dia em que o político carioca compareceria a uma solenidade, não descreve exatamente a pauta reivindicatória (a posição contrária dos manifestantes ao governo de Cabral e os motivos pelos quais essa posição se sustentaria) e, sim, formula a “confusão” no momento em que os “manifestantes teriam arremessado dois explosivos (...) contra os policiais”. O texto marca, então, uma posição de confronto, ainda que formulada pela suposição (pois os manifestantes “teriam” arremessado esse explosivo na polícia, em que o modo verbal mostra a tensão dessa versão sobre o ocorrido na narratividade jornalística), entre os manifestantes black blocs (“muitos mascarados”; a máscara simbolizando um efeito de união para o grupo tático organizado via Facebook) e a força policial.

Por sua vez, R5 relata apenas que “cerca de 60 pessoas participaram do ato, que começou às 17 horas”, situando o movimento no espaço-tempo, pela dêixis, e, a partir daí, formula sobre o aspecto de “confusão” desse “ato”, com “tumulto e pancadaria entre policiais, seguranças e manifestantes”. Interessante notar, nesse texto, que elementos do espaço urbano, como lixeiras e placas, são deslocados do lugar da organização citadina (em que a lixeira comporta os descartes de lixo urbano e as placas orientam o tráfego) para serem “atirados” (como uma arma) “contra policiais e seguranças”, os quais “jogavam cavaletes de ferro” (elementos estes que, cotidianamente, marcam a restrição da população a determinados espaços na cidade) nos manifestantes.

Ao mesmo tempo, a matéria “Protesto em frente ao TJ-RJ termina em pancadaria” (R5) e as matérias “Caetano cobre o rosto e pede paz” (R6) e “Ação da polícia para registrar mascarados tem confusão no Rio” (R7) são publicadas e passam a circular na semana da Independência do Brasil, desde 4 até 7 de setembro, divulgando, à época, uma decisão da justiça do Rio de Janeiro para identificar, obrigatoriamente, manifestantes mascarados na cidade. Naquele momento, administradores de páginas associadas à tática black bloc foram presos e o grupo respondeu com ações no espaço urbano, geralmente descritas pela imprensa pelo sintagma nominal “confusão”, no embate direto com a polícia.

R6: De rosto coberto com uma camiseta preta, só com os olhos de fora, tal qual um Black Bloc, Caetano Veloso postou foto nesta sexta-feira, 06, nas redes sociais Twitter e Instagram clamando por paz nas manifestações convocadas para este sábado. “Em favor da paz, no dia 7 de setembro, todos deveriam sair mascarados como no carnaval, respondendo à violência simbólica, sem usar a violência. Proibir o uso de máscaras numa cidade como o Rio de Janeiro é uma violência simbólica”, escreveu o compositor (PENNAFORT, 2013, n. p.)

R7: Houve confusão ontem à noite no Rio quando policiais militares puseram em prática a decisão da Justiça que os autorizou a identificar criminalmente quem estiver mascarado em protestos. Cerca de 50 manifestantes, segundo a PM, promoviam um “baile de máscaras” na Cinelândia, contra a decisão, quando policiais chegaram com formulários para identificá-los. Muitos usavam máscaras de carnaval em sátira à decisão. Um homem estava fantasiado de Batman. Na primeira abordagem, houve confusão. Manifestantes tentaram bloquear a avenida Rio Branco, mas foram impedidos pelos policiais. (...) Um manifestante foi detido, um menor apreendido e os policiais voltaram a identificar os mascarados. (AÇÃO..., 2013, n. p.)

 

Nos recortes, materializa-se a disputa de sentidos pelo uso ou pela proibição de máscara, um elemento que significa historicamente e que, na cidade do Rio de Janeiro, está associado à cultura do Carnaval (como na música “Noite dos Mascarados”, de Chico Buarque, que abre este artigo). Assim, R6, reconhecendo o cantor Caetano Veloso “tal qual um Black Bloc”, devido ao seu rosto “coberto com uma camiseta preta, só com os olhos de fora” (camiseta preta metaforizando a máscara, um distintivo black bloc), publica a entrevista do artista afirmando que “todos deveriam sair mascarados como no carnaval, respondendo à violência simbólica, sem usar a violência”. Veloso, pela memória carnavalesca, associa a proibição de máscaras no Rio (a cidade maravilhosa), naquela condição de produção, a uma “violência simbólica”.

Por último, R7 narra um “baile de máscaras” conduzido por manifestantes contra a decisão da justiça do Rio, a qual, de forma coercitiva, proibira sujeitos mascarados de protestar na cidade. A máscara, em condições de produção que tensionam a memória carnavalesca nas Jornadas de Junho, se converte em uma forma de “sátira à decisão” judicial, possibilitando que um homem “fantasiado de Batman” seja lido pela polícia enquanto manifestante (não folião) naquela situação. Assim, e apesar desse possível deslocamento de sentido no uso de máscara, por parte dos black blocs, em 2013, “os policiais voltaram a identificar os mascarados”, silenciando a versão da máscara carnavalesca no protesto e interpretando-a enquanto objeto que significa, no acontecimento discursivo das Jornadas de Junho, um grupo, responsabilizado pela “confusão” no espaço urbano.

4. Pandemia de Covid-19 e discurso sobre máscara

            Com o acontecimento discursivo da pandemia de Covid-19 no planeta e, lamentavelmente, no Brasil, um dos países com maior número de mortos em decorrência da Sars-CoV-2, as palavras se encharcam de sentidos relacionados ao novo coronavírus, como propõe Orlandi (2020), metaforizando a pandemia nas interpretações inquietas, em meio à volatilidade da circulação de discursos pelo digital — afinal, o surgimento dessa recém descoberta enfermidade aumentou a leitura de notícias online nacional e internacionalmente, conforme o Observatório da Imprensa (GALHARDI, 2020). As palavras, então, atravessam os sujeitos e fazem “irromper sentidos latentes” (ORLANDI, 2020, n. p.), nos jornais e no espaço urbano. O gesto de usar máscara, por exemplo, frequente em protestos black blocs no ano de 2013, volta a ser interpretado pela imprensa durante a atual pandemia, filiando-se, porém, a dizeres outros, a discursividades agora afetadas pelo acontecimento da doença altamente contagiante entre nós.

Inicialmente, as notícias da Folha e do Estadão sobre a pandemia de Covid-19 recorreram a especialistas (médicos infectologistas, principalmente) e à Organização Mundial da Saúde (OMS), fontes acreditadas para a produção do consenso (imaginariamente) no jornalismo profissional, com o objetivo de explicar a necessidade ou não do uso da máscara facial pela população enquanto método de combate ao vírus. Em R8, por exemplo, que circulou antes de a OMS declarar o estado de pandemia — no início de março, quando havia 118 mil casos e 4.291 mortes registradas em decorrência da doença em mais de 100 países —, descreve-se que, “apesar de o Brasil não ter nenhum caso confirmado da infecção” naquele momento, a máscara, sendo retomada no texto por “produto”, havia sumido das farmácias. O jornalista ouviu um consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia, que, à época, recomendou o uso de máscara cirúrgica apenas para “caso de suspeita de coronavírus”.

R8: A epidemia de um novo coronavírus no mundo já causou uma corrida por máscaras descartáveis em São Paulo, apesar de o Brasil não ter nenhum caso confirmado da infecção. Em farmácias, o produto praticamente sumiu das prateleiras (...). Não há, porém, motivos para o uso de máscaras no Brasil - pelo menos por enquanto. Leonardo Weissmann, médico infectologista e consultor da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia), afirma que, no momento, somente pessoas que se enquadrem em caso de suspeita de coronavírus devem usar máscaras cirúrgicas até serem colocadas em isolamento. (WATANABE, 2020, n. p.)

R9: Todos os dias, imagens de pessoas usando máscara são publicadas por jornais, inclusive por esta Folha. Diante disso, circula também a informação de que se deve usar máscara para se proteger do vírus. Drauzio [Varella, médico] afirma que o uso de máscara não impede a infecção de acontecer porque também é possível ser contaminado ao coçar os olhos, por exemplo, caso o vírus esteja na mão. O médico aponta que a máscara deve ser usada apenas por pessoas que estão com sintomas (BORGES et al., 2020, n. p.)

R10: A máscara foi um dos primeiros itens a entrar no radar de quem quer evitar o coronavírus, mas especialistas e a Organização Mundial de Saúde (OMS) alertam que deve ser usada por pessoas infectadas, profissionais de saúde ou pessoas que estão cuidando de doentes (...). As máscaras de tecido, sugeridas pelo ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e pelo secretário executivo, João Gabbardo dos Reis, dividem os especialistas. Alguns consideram o item diante do desabastecimento e outros afirmam que a proteção não é adequada. (FELIX, 2020, n. p.)

 

Após cerca de 2 meses desde a publicação da matéria “Coronavírus já provoca corrida às farmácias, e máscaras somem em SP” (R8), o texto em R9, baseado em entrevista do médico Drauzio Varella, conhecido do público brasileiro pela divulgação científica na grande mídia, “afirma que o uso de máscara não impede a infecção de acontecer” e repete a recomendação, naquele momento, também defendida pela OMS, de que “a máscara deve ser usada apenas por pessoas que estão com sintomas”. Nesse material, cujo título é “Drauzio Varella desmonta 14 fake news sobre coronavírus”, o uso de máscara é associado a uma fake news, falsa notícia (imaginário de notícia metaforizando a verdade), apesar de, “imagens de pessoas usando máscara” serem publicadas pelos jornais “todos os dias” (imaginário de que os jornais afetam os leitores por publicarem a interpretação fiável). Em R10, porém, o uso obrigatório de máscara contra a Covid-19 deixa de ser uma fake news e passa a repercutir como sugestão do então ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, para evitar o contágio por coronavírus na população. Neste texto, percebemos que a máscara é retomada por “um dos primeiros itens a entrar no radar de quem quer evitar o coronavírus”, sendo, ainda, um elemento que dividira a opinião de “especialistas”, “diante do desabastecimento”, já noticiado em R8, e da ideia de que essa “proteção não é adequada”, afirmação repercutida por R9.

 

R11: “É uma barreira física. Vamos deixar as máscaras descartáveis para serem utilizadas pelos hospitais e profissionais de saúde”, disse João Gabbardo dos Reis, secretário executivo do Ministério da Saúde. “A máscara, para a população que quer impedir de contaminar outras pessoas, é uma barreira. Faz com pano, quem não tem alternativa”. (BORGES, LINDNER, 2020, n. p.)

R12: O diretor-geral do Hospital Sírio-Libanês, o cirurgião Paulo Chapchap, 65, defende o uso obrigatório de máscaras em ambientes coletivos em todo o país como forma de diminuir o contágio do novo coronavírus (...), ele diz que é preciso que os profissionais de saúde façam um mea-culpa pela demora em não preconizar o uso de qualquer tipo de máscara, inclusive as de pano. “A gente tinha carência de equipamento de proteção individual para os profissionais de saúde, e ficou muito assustado de propor a utilização de máscara para a população como um todo, com medo que faltasse [nos serviços de saúde]”, afirma o médico. (COLLUCCI, 2020, n. p.)

R13: Distanciamento de pelo menos 1 metro e o uso de máscaras e proteção para os olhos ajudam a diminuir a transmissão da Covid-19, aponta um estudo que revisou 172 pesquisas relacionadas à infecção por Sars (Síndrome respiratória aguda grave), Mers (Síndrome respiratória do Médio Oriente) e Sars-CoV-2, o vírus causador da Covid-19. A pesquisa foi publicada nesta semana na revista médica inglesa The Lancet. (DISTÂNCIA…, 2020, n. p.)

 

A polêmica (versões conflitantes) sobre o uso obrigatório de máscara contra a propagação de Covid-19 entre os brasileiros parece arrefecer nas falas, costuradas pelo discurso “sobre” da imprensa em R11-R13. Em R11, divulgando entrevista com uma fonte oficial, o então secretário executivo do Ministério da Saúde João Gabbardo dos Reis, a máscara (caseira/reutilizável) é lida como “barreira física”, convertendo-se em uma maneira de “impedir de contaminar outras pessoas”, desde que a população deixasse “as máscaras descartáveis para serem utilizadas pelos hospitais e profissionais de saúde”. Já R12, a partir da entrevista com um médico (profissão à qual os recortes se referem, recorrentemente, quando tratam desse tema) de um dos maiores hospitais privados da cidade de São Paulo, formula a defesa do “uso obrigatório de máscaras em ambientes coletivos em todo o país como forma de diminuir o contágio do novo coronavírus” e pede, ancorando-se na autoridade da fonte jornalística e na importância do hospital de onde o médico ouvido pela reportagem é diretor-geral, um “mea-culpa” — que evoca uma memória do jurídico, o qual, assim como o processo linguístico, funciona no sujeito-capitalista (ou sujeito moderno) responsável e responsabilizado pelas suas práticas (HAROCHE, 1992) — dos profissionais de saúde pela “demora em não preconizar o uso de qualquer tipo de máscara, inclusive as de pano”. R13, por fim, justifica o “uso de máscaras”, junto ao distanciamento e à proteção para os olhos, para “diminuir a transmissão da Covid-19” pelo discurso científico, autorizado por determinadas instituições (“revista médica inglesa The Lancet”) e produzindo evidências a partir de “172 pesquisas” sobre tipos de coronavírus no mundo.

 

R14: Ignorando orientações dadas por ele mesmo na semana passada, o presidente da República incentivou os atos desde cedo em suas redes sociais (...). Sem máscara, participou das manifestações em Brasília, tocando simpatizantes e manuseando o celular de alguns apoiadores para fazer selfies. Bolsonaro também contrariou orientação da equipe médica da presidência. Ele havia sido aconselhado a evitar locais com aglomeração (CARVALHO, 2020, n. p.)

R15: O flá-flu que já deu as caras na forma de “coxinhas x mortadelas” e “bolsominions x petralhas” vestiu nova máscara na pandemia do coronavírus, com uma divisão agora colocada entre “cloroquiners” e “quarenteners”. As visões divergentes sobre o combate à crise reinventam a polarização política e adicionam ingredientes inéditos. (...) os partidários da cloroquina são aqueles que estão fechados com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Eles superdimensionam o papel do medicamento usado no tratamento da Covid-19, ainda sob testes, e fazem pirraça diante da quarentena. No outro grupo, que defende aguerridamente o isolamento social, o remédio é visto com reservas. Na dicotomia entre economia e vidas humanas, a parcela acha que a segunda opção é soberana (TAVARES, 2020, n. p.)

R16: A desembargadora Daniele Maranhão Costa, do TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região), derrubou a decisão liminar (provisória) da primeira instância da Justiça Federal que obrigava o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) a utilizar máscara de proteção facial ao sair às ruas do Distrito Federal, como forma de prevenção contra o novo coronavírus. O uso de máscara é obrigatório no Distrito Federal. Mas em diferentes ocasiões o presidente saiu às ruas sem o equipamento de proteção. No último sábado, o presidente viajou para Araguari, em Minas Gerais sem usar máscara no rosto e causou aglomeração na beira de uma estrada. Em vez de usar a máscara cobrindo nariz e boca, como recomendado para se evitar a propagação do coronavírus, ele a carregava nas mãos. (AMORIM, 2020, n. p.)

 

Por outro lado, R14 significa a disputa simbólica da presidência para ignorar ou seguir orientações científicas de combate ao coronavírus no Brasil. Ao mesmo tempo em que essas orientações para combater a pandemia são divulgadas pelo presidente Jair Bolsonaro nas suas redes sociais em março, “o presidente da República incentivou os atos”, reunindo manifestantes contra a democracia na Esplanada em meio à pandemia. Ainda que tivesse sido “aconselhado a evitar locais com aglomeração”, o político “contrariou orientação da equipe médica” e, “sem máscara”, “participou das manifestações” e tocou “simpatizantes”. Usar máscara facial, nessas condições de produção, seria uma forma de seguir a orientação dos especialistas para combater a transmissão viral por gotículas de saliva, por exemplo.

Em R15, por sua vez, a questão do novo coronavírus, e do combate à doença enquanto política de saúde pública, é lida pelo viés partidário, que, na interpretação da Folha, reinventa “a polarização política” com “ingredientes inéditos”, seja pelos “partidários da cloroquina” (medicamento defendido por Bolsonaro para conter os danos da Covid-19 nos infectados, apesar de não ter eficácia comprovada cientificamente), seja pelo “grupo” que “defende aguerridamente o isolamento social”, para o qual as “vidas humanas” são uma opção “soberana” — e não a economia, que, paralelamente, seria uma defesa prioritária dos “cloroquiners” durante a pandemia. O jornal formula, assim, a polarização política à brasileira (“flá-flu”, memória da rivalidade futebolística entre os times cariocas flamengo e fluminense), associada a “coxinhas x mortadelas” e “bolsominions x petralhas”, metaforizando os espectros de direita e esquerda na política para significar esses dois grupos antagônicos no momento atual da crise sanitária (e político-administrativa) no Brasil.

Com o discurso científico produzindo evidências sobre o uso de máscara no combate ao coronavírus, e silenciando versões contrárias a esse tipo de proteção, como inicialmente fizeram alguns especialistas (ver R8 e R9), Estados e Distrito Federal tornaram obrigatório, por mecanismos legais, o uso desse objeto em locais públicos. Mas, durante a escalada de casos positivos e mortes por Covid-19 no Brasil, o presidente compareceu a atos públicos sem máscara no rosto (R14), ainda que tivesse convivido[5] com pacientes ativos para Covid-19. Em resposta ao gesto de Bolsonaro, que poderia suavizar ou desacreditar os mecanismos legais (a lei vale para todos, sendo o sujeito moderno responsabilizado, necessariamente, pelas suas práticas sociais), a Justiça Federal, em um primeiro momento, obrigou o presidente a “utilizar máscara de proteção facial ao sair às ruas do Distrito Federal, como forma de prevenção contra o novo coronavírus”. A decisão, no entanto, foi derrubada no Tribunal regional Federal da 1ª Região, como divulga R16.

Diante do impasse judicial, e do efeito de ambiguidade dos dispositivos punitivos no país, o presidente, de certa forma, passou a usar máscara em eventos públicos (seguindo, parcialmente, a decisão judicial), carregando-a “nas mãos” ao invés de “usar a máscara cobrindo nariz e boca, como recomendado para se evitar a propagação do coronavírus”. Esse recorte formula sobre os gestos do presidente da República na pandemia, seja saindo às ruas “sem o equipamento de proteção” no rosto (“equipamento de proteção”, aqui, metaforizando a máscara), seja causando “aglomeração na beira de uma estrada”. Em um aceno à polarização política — agora, reinventada por “cloroquiners e quarenteners”, mas que, segundo Souza (2019), se deve ao acontecimento das Jornadas de Junho —, Jair Bolsonaro, eleito democraticamente em 2018, consegue se manter no poder[6] “sem partido”, ainda que o legislativo brasileiro (na figura dos representantes da Presidência, Congresso, Câmara de Vereadores etc.) implique o pluripartidarismo. Bolsonaro, significando enquanto presidente da República, disputa, então, os sentidos de máscara na pandemia, confrontando as decisões judiciais, o discurso científico e o próprio imaginário (manter o decoro) sobre o cargo que ocupa e simboliza na nossa democracia.

 

5. Gesto de conclusão

Neste artigo, analisei materiais que significam momentos distintos da história recente brasileira, sejam as Jornadas de Junho, em 2013, seja a pandemia de Covid-19, em 2020. Entendendo que as palavras são “encharcadas” de sentido, em dadas condições de produção, e que os efeitos de sentido se constituem historicamente, analisei o discurso jornalístico sobre sujeitos mascarados e máscara, textos, reunidos em um corpus, que contribuem para um estudo discursivo do assunto, considerando a opacidade (não transparência) e a polissemia (não univocidade) de sentidos na língua, por o discurso poder vir a ser outro, no deslizar da significação. Para fundamento dessa análise, logo, compreendi que tanto as Jornadas de Junho, e os protestos de black blocs à época, quanto a pandemia de coronavírus, atualmente, funcionam enquanto acontecimentos discursivos (no encontro do inter e do intradiscurso, atualizando a memória social), a partir dos quais novas discursividades são formuladas e passam a circular na imprensa, principalmente no tocante à proibição ou à obrigatoriedade do uso de máscara no espaço urbano, objeto linguageiro que impulsiona esta pesquisa.

Inicialmente, diante da incompreensão da imprensa sobre o acontecimento discursivo das Jornadas de Junho, sentidos entraram em disputa, em um processo de construção imaginária do consenso, pelo discurso “sobre”, nos jornais. Os sujeitos ligados ao grupo black bloc, tática reconhecida (funcionamento do imaginário) pelo traje de vestes e máscaras negras e pela inscrição radical de gestos no espaço urbano (depredamento de prédios privados e de patrimônio público, por exemplo, simbolizando a crítica ao capitalismo e a determinadas gestões da coisa pública), foram, em grande parte, significados na mídia como “baderneiros” ou na oposição entre “punks” e “ativistas do paz e amor” (os “outros” seriam os pacíficos), a exemplo de R1.

A narratividade jornalística também significou os sujeitos mascarados nas Jornadas de Junho pelos momentos de “confusão” entre os manifestantes e a força policial (ver R3-R5). Interessante observar, ainda, a partir de uma decisão da justiça do Rio de Janeiro, que pretendia identificar, obrigatoriamente, manifestantes mascarados (parafrasticamente, proibia a ação de black blocs no espaço), que os recortes (R6-R7) materializam a disputa de sentidos de máscara, ora em defesa do uso desse equipamento, ora tentando proibir esse objeto em manifestações na cidade maravilhosa. Assim, se na música “Noite dos Mascarados” Chico Buarque pede para o mascarado não se revelar (“Mas é Carnaval / Não me diga mais quem é você”), o discurso oficial, pelo instrumento da lei e pela força ostensiva da polícia, passa a proibir o uso de máscara (distintivo black bloc) em manifestações. Contudo, em protesto àquela decisão judicial, os black blocs cariocas, afetados pela memória carnavalesca, fizeram “bailes de máscara”, o que acabou silenciado pela polícia (Me diga quem é você). A cidade, não nos esqueçamos, “abriga o social — o polido — que, no entanto, se realiza administrativamente como o policiado, referido à (manutenção da) organização urbana” (ORLANDI, 1999, pp. 3-4).

Com o acontecimento discursivo da pandemia de Covid-19, porém, sentidos outros de máscara irrompem na imprensa. Se o equipamento funcionava para (não) distinguir sujeitos manifestantes nas Jornadas de Junho, metaforizando um grupo com ações táticas anti-capitalistas, esse elemento se torna, muitas vezes, um produto ou um item disputado em farmácias, desde o surgimento do novo coronavírus no planeta. Diante da crise sanitária, e antes mesmo de a OMS declarar o surgimento da Covid-19 no planeta uma pandemia, os textos jornalísticos, como em R8-R10, escutaram especialistas sobre a eficácia da máscara no combate ao contágio viral, ideia que, geralmente, não era acreditada pelas fontes naquele momento, seguindo recomendação da OMS. Em um dos textos analisados, usar máscara facial como método combativo ao coronavírus foi associado a uma fake news.

Em um segundo momento, a polêmica sobre o uso obrigatório de máscara facial contra a propagação de Covid-19 passou a ser significada pela narratividade jornalística de outra forma, com um certo consenso construído pelo discurso médico-científico a respeito desse equipamento, a exemplo de R11-13, confirmando a máscara enquanto “barreira física” para conter a disseminação do novo vírus. Apesar disso, e devido à leitura partidária (R15) da pandemia, reinventando “a polarização política” entre “cloroquiners” e “quarenteners” (ou entre os espectros de direita e de esquerda), ocorre uma disputa simbólica da Presidência para ignorar ou não fazer cumprir orientações científicas de combate à Covid-19 no país. E, como usar máscara facial passa a significar, nessas condições de produção, seguir a orientação dos especialistas para frear a transmissão viral, a figura de Jair Bolsonaro, investido de sentidos de presidente da República, passa a comparecer a atos públicos sem máscara no rosto (R14), desacreditando, inclusive, mecanismos legais obrigando todos a “utilizar máscara de proteção facial”.

Os acontecimentos discursivos das Jornadas de Junho e da pandemia de Covid-19, assim, atualizam a memória sobre mobilização social no Brasil e o convívio com o “outro” no espaço urbano (o “outro” mascarado, responsabilizado pela “baderna”, o “outro” enquanto possível responsável pela transmissão do novo coronavírus, por exemplo). E, ainda que amanhã nem tudo volte ao normal — até porque o normal, o logicamente estabilizado, é uma construção da prática discursiva —, metaforizando a promessa de Chico naquela música, o discurso resulta nesse lugar onde os sentidos são constituídos, formulados e circulam, não apenas afetando os sujeitos mascarados, mas simbolizando-os, em uma disputa de/por versões, na cidade manchetada pelos jornais.

 

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Data de Recebimento: 06/08/2020
Data de Aprovação: 02/10/2020

 

 

 

[1] O recorte é uma noção importante para a proposta de análise discursiva do material, por isso, proponho, com Orlandi (1984, p.15), recorte enquanto “unidade discursiva”, não um fragmento frasal ou sintagmático, mas uma unidade discursiva relacionada à “linguagem-e-situação”, “um fragmento da situação discursiva”.

[2] Na análise desenvolvida em Brito et al. (no prelo), situamos o discurso jornalístico pelo digital em relação a formulações com isolamento social/físico e distanciamento social/físico, cuja significação ocorre tanto parafrástica quanto metaforicamente, com as expressões significando o “mesmo” e o “diferente” nos textos jornalísticos, antes e durante o acontecimento discursivo da pandemia de Covid-19.

[3] Em “Segmentar ou recortar”, Orlandi (1984, p. 11) compreende que polissemia pode ser a fonte (não a origem, vale frisar) de sentido, em contraste com a paráfrase, considerada a matriz de sentido, de maneira que a “polissemia (expansão) é regulada por sua relação com a paráfrase (contenção), ou melhor, polissemia e paráfrase se limitam reciprocamente”.

[4] Doravante, marco em itálico gestos de paráfrase sobre o material de análise e deixo aspeadas formulações recortadas dos textos analisados.

[5] Desde o início da pandemia, integrantes da equipe de Jair Bolsonaro testaram positivo para o novo coronavírus; ver material da Agência Brasil: https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2020-03/gsi-confirma-coronavirus-em-quatro-integrantes-da-equipe-de-bolsonaro. Em julho, o presidente também contraiu a doença, segundo nota oficial: https://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2020-07/bolsonaro-tem-novo-teste-positivo-para-covid-19.

[6] O governo Bolsonaro tenciona, regularmente, os ritos das instituições democráticas, mantendo-se no poder em meio a uma “crise institucional”. Em maio de 2020, após o Supremo Tribunal Federal criminalizar o “gabinete do ódio”, formado, majoritariamente, por apoiadores do presidente, Jair Bolsonaro afirmou que “ordens absurdas não se cumprem”, formulação lida como agravemento dessa “crise institucional” entre os poderes (ver https://www.terra.com.br/amp/noticias/brasil/politica/bolsonaro-ameaca-nao-cumprir-decisoes-do-stf,58784c0d733a385fa1766ce05632b7daqxj3mgfj.html). Em junho do mesmo ano, o presidente também “elevou o tom” em relação ao Supremo, que seguia conduzindo uma investigação sobre aliados da Presidência. À época, Bolsonaro prometeu “chutar o pau da barraca”, em uma formulação interpretada por parte da mídia como possível indício de intervenção militar (ver https://www.cartacapital.com.br/politica/bolsonaro-ameaca-ministros-do-stf-estao-abusando/amp/ e https://piaui.folha.uol.com.br/materia/vou-intervir/).