Por Lidia Torres*
O ano de 2025 tem sido marcado pela alta do preço do café no Brasil. O café arábica, que é uma das espécies mais comercializadas no país, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2025), também têm atingido maior valor de comercialização. Um dos motivos que explicam a alta do preço do grão é o cenário de mudanças climáticas.
Regiões produtoras de café que foram atingidas por chuvas excessivas, granizo e/ou seca, por exemplo, tiveram quedas significativas na produção. Essa redução na oferta gera um aumento nos valores de comercialização, tanto do grão in natura quanto do produto industrializado que chega aos consumidores.
E neste cenário de preços recordes do café e de mudanças climáticas que afetam a produtividade das plantações, uma pesquisa realizada por Mayara Davoli Alvarenga, doutoranda em Desenvolvimento Econômico, orientada por Rodrigo Lanna Franco da Silveira, aponta que cerca de 40% dos produtores, entre 385 cafeicultores ouvidos entre 2022 e 2023, não adotaram nenhuma estratégia de gestão de risco de preço, deixando suas operações vulneráveis a quedas bruscas de preços ou eventos climáticos extremos.
O estudo realizado em cidades do Sul de Minas, Matas de Minas e Cerrado mineiro, principais regiões produtoras de café em Minas Gerais, revela que a maioria dos cafeicultores ainda não se protege contra as oscilações do mercado, o que a longo prazo, pode afetar o crescimento econômico do país, com implicações para a pobreza e a segurança alimentar.
Algumas estratégias possíveis para os produtores se protegerem dessas oscilações do mercado de café, como mostra a pesquisa de Alvarenga são:
- Contratos futuros: fixar preços de venda antecipadamente para evitar quedas no mercado.
- Operação de barte: É uma transação triangular envolvendo o produtor rural, a cooperativa e os fornecedores de insumos. O produtor adquire insumos no início do ciclo produtivo, comprometendo-se a pagar com sacas de café na colheita, conforme contrato pré-estabelecido. Se o preço do café estiver baixo, ele quita a dívida entregando as sacas acordadas; se estiver alto, pode optar por pagar em dinheiro pelo valor fixado e vender a produção no mercado. A cooperativa atua como intermediária, garantindo o cumprimento do contrato e repassando o pagamento ao fornecedor. Essa operação protege o produtor contra oscilações de preço e garante acesso a insumos mesmo sem capital imediato.
- Diversificação produtiva: plantar outras culturas ou investir em diferentes mercados para reduzir a dependência do café.
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A falta dessas práticas, como apontado na pesquisa, deixa os produtores mais vulneráveis a crises, impactando sua rentabilidade e sustentabilidade.
A escolha das regiões, segundo os pesquisadores, foi para buscar a diversidade das observações sobre os fatores de riscos nas lavouras. “São regiões bastante diversas, tanto em questões geográficas, quanto em relação a relevo, clima e a técnicas de manejo. Haveria diferenças nas condições a que eles estão expostos também, o que impacta bastante na forma de gerir a atividade e na tomada de decisão”, explica Alvarenga.
Os resultados preliminares indicaram que os três eventos de risco mais importantes, com maior percepção de severidade segundo os entrevistados, foram as flutuações nos preços dos insumos e do café e a seca.
Apesar dos entrevistados relatarem aumento na frequência de eventos climáticos extremos, poucos associam as mudanças climáticas à necessidade de ações preventivas para proteção de suas lavouras ou a própria diversificação de culturas em suas propriedades.
O estudo destaca que cerca de 150 produtores dos 385 entrevistados adotaram alguma medida atrelada à diversificação de culturas. Embora parte dos entrevistados cultive outros produtos além do café, na maioria dos casos trata-se de atividades complementares como a pecuária de pequeno porte, sem impacto significativo na renda principal. Ou seja, o café continua sendo a principal fonte de renda desses produtores rurais.
“Quando a gente analisa os fatores que determinam a diversificação, o resultado aponta que é só o tamanho do produtor, ou seja, quanto maior o tamanho do produtor, maior a tendência dele adotar diversificação”, destaca Lanna.
Assim, os pequenos produtores, que representam 75% dos cafeicultores brasileiros, segundo a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), seguem como os mais vulneráveis às oscilações do mercado.
Segundo os pesquisadores, as cooperativas surgem como peças-chave para a transformação deste cenário e os resultados da pesquisa destacam, por exemplo, a importância de programas educacionais e ações de conscientização que expliquem os riscos da atividade e seu impacto na rentabilidade da agricultura.
Alvarenga e Lanna apresentaram esses resultados de pesquisa em um evento internacional em 2024, em New Orleans, Lousiana, com outros autores: Priscila Coltri Pereira, Ivette Luna, Renata Ribeiro do Valle e Guilherme Almussa Leite. O artigo completo, intitulado The role of risk perceptions and risk attitudes on hedging decisions: evidence from coffee farmers, pode ser acessado no site do evento.
Além de ser parte da pesquisa de doutorado de Alvarenga, o trabalho faz parte do Projeto Coffee Change, do CNPq, e do Centro de Inteligência Artificial da Unicamp, Brazilian Institute of Data Science - BIOS, da Fapesp. A pesquisa estará disponível em repositórios da Unicamp quando finalizada e certamente será divulgada no site e Instagram do projeto Coffee Change.
*Lidia Torres é especialista em Jornalismo Científico pelo Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (LABJOR) e doutoranda em Ciências Sociais, ambos pela Unicamp.