* Por Lidia Torres
Animais dispersores de sementes garantem que parte das árvores da Amazônia (90%), da Mata Atlântica (90%) e do Cerrado (60%) consigam se reproduzir e garantem a manutenção das florestas. No entanto, o declínio acelerado de aves, mamíferos, peixes e outros dispersores naturais está comprometendo a diversidade vegetal e, consequentemente, a capacidade dos ecossistemas de sequestrar carbono, agravando as mudanças climáticas.
Um artigo publicado na Nature Reviews Biodiversity por pesquisadores do Brasil, Estados Unidos, Suíça, Panamá, Alemanha, Espanha e Portugal ressaltaque estratégias globais de conservação têm negligenciado o papel desses animais na restauração florestal. Segundo os cientistas, sem ações para reverter a perda de dispersores, iniciativas como o plantio de árvores e créditos de carbono podem não alcançar seus objetivos.
Como os animais influenciam o carbono florestal
Mauro Galetti, diretor do Centro de Pesquisa em Biodiversidade e Mudanças do Clima (CBioClima) e um dos autores do estudo, explica que animais como tucanos, antas, cutias e macacos são responsáveis por "plantar" as árvores que armazenam carbono. "Para se ter uma copaíba, por exemplo, a floresta precisa ter tucanos e macacos para dispersarem suas sementes", afirma em entrevista para a Agência Fapesp.
Um estudo recente na Science mostrou que a redução de aves e mamíferos diminuiu em 60% a dispersão de sementes em florestas tropicais. Portanto, a perda desses animais altera a composição das florestas, reduzindo sua capacidade de absorver dióxido de carbono.
Mecanismos da dispersão e vulnerabilidades
Quando um animal frugívoro consome um fruto, a semente passa por seu sistema digestivo, onde recebe tratamentos químicos ou mecânicos que facilitam sua germinação. "Sementes consumidas por animais germinam mais, mais rápido e em locais mais seguros", explica o pesquisador à Agência Fapesp. Sem esse processo, muitas plantas não conseguem se reproduzir eficientemente.
Algumas espécies dependem exclusivamente de um dispersor. Galleti destaca que a castanha-do-pará só tem um dispersor, a cutia. Se a cutia desaparecer, o serviço ecológico que ela presta também desaparece. Em diferentes biomas, outros animais assumem papéis fundamentais. Na Amazônia e no Pantanal, peixes como pacus e tambaquis são essenciais para a dispersão em matas ciliares.
Falta de políticas e impactos econômicos
Enquanto polinizadores, como abelhas, recebem atenção por seu impacto direto na agricultura, os dispersores de sementes são menos considerados em políticas públicas. Os efeitos da perda de dispersores são mais lentos e difíceis de medir, mas comprometem o funcionamento das florestas a longo prazo.
O artigo destaca que ainda não há uma quantificação global dos custos econômicos desse declínio, que inclui perda de estoques de carbono, redução de produtos florestais e menor resistência a eventos climáticos extremos. "A restauração não consiste em apenas plantar árvores, é preciso considerar quem vai manter o futuro dessa floresta, que são os animais dispersores. Há alguns anos acreditava-se que ao plantar a floresta esses animais iriam até ela. Mas não é assim que acontece. É muito mais complexo ter uma floresta restaurada funcionando", afirma o pesquisador à Fapesp.
O artigo Drivers and impacts of global seed disperser decline está disponível em: www.nature.com/articles/s44358-025-00053-w.
* Esta notícia foi elaborada a partir da matéria de Maria Fernanda Ziegler, publicada na Agência FAPESP.
* Lidia Torres é especialista em Jornalismo Científico pelo Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (LABJOR) e doutoranda em Ciências Sociais, ambos pela Unicamp.