Onde a sociedade abraça e esconde a arte: Vocação cultural e identidade cataguasense


resumo resumo

Inácio Manoel Neves Frade da Cruz



Introdução

 

Exponho tudo isso, na verdade para confessar uma enorme frustação.

Se eu tivesse nascido alguns quilômetros depois, ou antes, de Cataguases, digamos, em Ubá ou Laranjal, talvez hoje pudesse me orgulhar de ser o escritor mais conhecido de minha cidade - e, por falta de concorrência, quem sabe, até o melhor. Nascido em Cataguases, só me resta lamentar e me enfileirar atrás dos grandes. Mas, pensando bem, se não houvesse nascido em Cataguases, muito provavelmente eu nem seria escritor.

(Luiz Ruffato, 2012)1

 

Este artigo procura oferecer uma reflexão sobre a maneira uniforme de contar a história de Cataguases, cidade localizada na Zona da Mata/MG. O encadeamento de acontecimentos a serem guardados na memória coletiva exalta uma ancestralidade mitológica personificada no cinema de Humberto Mauro, sobretudo no Ciclo de Cataguases, e na literatura modernista da revista Verde. Compreendida como algo espontâneo que se desdobra do sobrenatural, visualmente, a suposta ambiência cultural é enquadrada em uma moldura arquitetônica rubricada, entre outros, por Francisco Bolonha, Oscar Niemeyer, Aldary Toledo, Gilberto Lemos, Edgar Guimarães do Valle, Carlos Leão e pelos irmãos do escritório MMM Roberto. A monumentalidade impregnada na memória artístico-cultural reivindica uma origem modernista na qual pioneirismo regional se confunde com vanguarda, ensejando uma alegoria que faculta a seus habitantes uma predisposição ao consumo e produção de manifestações artísticas intelectualmente refinadas. Uma porção do material que reflete a imanência do aspecto cultural associado ao lugar vem sendo produzida sob a forma de folders, guias patrimoniais, informes, filmes e livros de ficção, documentários, fotografias, TCCs, dissertações e teses, catálogos, entrevistas, suplementos, músicas, álbuns de figurinhas, baralhos, entre outros. Na margem oposta, percebe-se um rebaixamento e descarte institucional das lembranças daquilo que não se conecta diretamente ao campo literário inspirado pelo modernismo de província (Marques, 2011) da revista Verde,2 nem ao terreno cinematográfico, desagarrando-se da paternidade de Humberto Mauro.3

A substituição da mão-de-obra escravizada e o advento da Estrada de Ferro Leopoldina4 contribuíram para trazer à cidade e região novas levas de imigrantes europeus que se tornariam elementos importantes para o seu crescimento. A mídia local repercutia a percepção de um núcleo urbano inclinado para as artes, como atesta a matéria do jornal Evolução, de 06 de setembro de 1914, ao afirmar que “[...] Destes quatro mil e quinhentos a cinco mil habitantes que aqui vivem, grande parte, talvez dois terços da população tem uma inclinação especial para as belas-artes. [...]” Se a representação da vocação está dada antes da ação dos protagonistas Verde-Mauro, o reconhecimento em relação a uma relativa autenticidade do Caso Cataguases tem início na década de 1950. Desde esse período, a cidade5 se vê retratada e admirada em programas de rádio da metrópole e se lê em revistas especializadas em arquitetura, literatura e cinema no cenário nacional e no exterior.6 Ao já exposto acrescento que não é objetivo deste texto fazer crítica ou questionar o aspecto da qualidade estética da experiência artístico -cultural ali desenvolvida. Feita a ressalva, volto à ideia de que para se afirmar como ambiente moderno, com vocação para as experimentações artísticas de vanguarda, os mentores de sua identidade fecham os olhos para a cultura produzida por praticamente todos os segmentos sociais que não se encaixam no quadrante dos adoradores do modernismo. Cria-se um mito da vocação cultural no qual a formulação e socialização de mensagens visuais, orais e escritas têm o condão de distorcer e amplificar a sensibilidade dos moradores locais em relação a um hipotético gosto natural pela arte, conformando uma massa predisposta a apreciar e consumir produtos culturais, quanto mais eruditos, melhor. Um dos propósitos desta narrativa é esconder o projeto político que se alicerça na desigualdade social e de escolaridade entre os operadores da arte cataguasense e a referida massa. Segundo o professor Marcos Vinícius Oliveira:

 

[...] o valor de qualidade em Cataguases é um projeto exclusivista de educação privada, arte moderna e alta cultura, oferecido ao restrito círculo dos iniciados, ou melhor, privilegiados por relações de parentesco ou de interesses mútuos, afinidades políticas, convergências ideológicas. Embora a ideia de “museu a céu aberto” pareça uma concessão à democratização da cultura, a manutenção de um sistema de forças econômicas que tende mais à concentração do que à distribuição, mantém o acesso ao poder transformador da experiência estética fora do alcance da maioria dos seus habitantes. (Oliveira, 2011, p. 71)

 

Márcio Seligmann-Silva (2022b) ao discutir sobre a capacidade da arte em produzir resistência aos silenciamentos impostos pelo projeto colonial, mostra como o dispositivo estético é capaz de criar “a linha divisória entre os dignos de direitos e de solidariedade e aqueles que são a ‘carne’ da máquina colonial” (Seligmann-Silva, 2022b, p. 2). Essa perspectiva teórica salienta que a história elaborada e socializada pela branquitude equivale a uma “mirada folclórica branca sobre aspectos da estética negra e indígena” (Seligmann-Silva, 2022b, p. 6). Se uma das estratégias do projeto colonial é apequenar o outro, a arte e os artistas não brancos possuem a capacidade de manter relativamente preservados os fios que os atam à ancestralidade, permitindo a composição de um contra-dispositivo-estético. A capacidade de desconstruir os padrões morais e estéticos hegemônicos contribui para descentralizar as memórias compartilhadas pela coletividade, sugerindo resistência e contestação às narrativas dos grupos dominantes que visam disciplinar os corpos, subalternizando-os. Daí a importância da visibilidade, isto é, da quebra do racismo epistemológico que é perceptível em função do descarte e rebaixamento dos temas relacionados aos descendentes de africanos escravizados. No caso específico de Cataguases, as vozes contra-hegemônicas ficam soterradas em uma camada profunda, recolhidas em um silêncio melancólico que precede o esquecimento.

Nesse enredo da vocação cultural, personagens como o Mestre Messias dos Santos7 ou Aristides Alves Ferreira8 jamais alcançam a linha de frente das narrativas que veiculam a ideia de cidade laboratório, lócus privilegiado para elaborações artísticas. Observados pela perspectiva do elitismo cultural, estes personagens e suas obras quase nunca são estudados, como se não fizessem parte da sinfonia identitária arrolada na localidade. Teixeira Coelho (1997) chama a atenção para um tipo de política cultural que privilegia um conjunto de signos e práticas adotadas como sinal distintivo de uma superioridade existente ou a ser alcançada. Coelho (1997) explica que o elitismo cultural pode abraçar e acastelar os modos culturais percebidos como eruditos, atinentes a uma estirpe supostamente superior, como pode também incidir sob a máscara de um elitismo popular, pautado no reconhecimento das versões populares da cultura. Para o autor, tanto “Num caso como no outro, o elitismo cultural implica a desvalorização e a marginalização do modo cultural visto como oposto”. (Coelho, 1997, p. 163) Como em todo o país, nesse processo de distinção (Bourdieu, 2008) é sabido que a cultura popular está sempre em desvantagem, entretanto, no município em tela ocorre um autêntico descarte, inviabilizando qualquer tentativa de se fugir a uma identidade submissa à alta cultura. Temos aí um obstáculo em relação às manifestações artísticas (populares e eruditas) que perfazem o patrimônio cultural e identitário de Cataguases, posto que poderiam ser tratadas como legítimas e complementares e não como concorrentes.

Erudição e vanguarda são palavras-chave atribuídas ao devir cataguasense, como se o inventário das diferenças artístico-culturais apresentasse apenas variações em torno de uma estética de matriz modernista mais ou menos transgressora, situação que permite diferenciar o lugar em relação aos outros municípios do seu entorno. Ao discorrer sobre um território de resistência negra, o Clube dos Cutubas, na cidade vizinha Leopoldina, Margareth Franklin (2012) já alertava sobre o fato de que os produtos culturais eminentemente elitizados induzem a uma amnésia, quando não há uma condenação ao esquecimento, de inúmeras manifestações não menos culturais, porém “originárias das classes populares, das senzalas, terreiros, favelas, vilas operárias” (Franklin, 2012, p. 13). É sob essa perspectiva que procuro direcionar o olhar para alguns dos artistas que não costumam ser lembrados e incluídos nos catálogos culturais de Cataguases. No que diz respeito ao estudo documental aqui empreendido, que incluiu a leitura dos jornais Cataguases [1906-1980] e Evolução [1914-1915], além do material produzido institucionalmente pelas fundações culturais e Secretaria Municipal de Cultura, a metodologia de pesquisa pautou-se em uma abordagem qualitativa (Goldenberg, 2011). Também foram analisadas entrevistas com artistas e produtores de arte locais realizadas no percurso de uma pesquisa de doutorado vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais/UFJF.9

Os argumentos aqui arrolados, têm como fonte de inspiração os estudos conceituais sobre a condição decolonial (Walsh, 2013, 2017; Bernadino-Costa, Maldonado-Torres, Grosfoguel, 2018; Segato, 2018, 2021)10 e buscam reconhecer a legitimidade e dignidade da cultura compartilhada por pessoas de fora dos quadros da elite intelectual cataguasense. Vamos ao encontro de outras subjetividades presentes naquela sociedade, promovendo uma esquiva em relação à imposição de um modelo cultural eurocentrado por parte de um pequeno coletivo de privilegiados, que desconsidera a contribuição das camadas sociais marginalizadas, sobretudo das pessoas oriundas dos grupos de indígenas e afrodescendentes. Como sugere Márcio Seligmann-Silva (2022a) em seu livro Virada testemunhal e decolonial do saber histórico, é primordial debater e desconstruir a mentalidade colonial que se desdobra violentamente nos quatro cantos da nossa sociedade. A propósito dos constrangimentos físicos e morais inerentes à coação colonial, Rita Segato (2018) nos fala em uma pedagogia da crueldade, na qual se enquadra e converte tudo aquilo que não se associa ao modelo normativo vigente. A antropóloga argentina faz alusão a uma captura daquilo que fluía de maneira errante e imprevisível, instalando em seu lugar a inércia e a esterilidade. Neste caso, trata-se de não aderir a uma história única (Adichie, 2019), invariavelmente composta por homens, brancos/europeizados, cristãos, que, com suas narrativas fantásticas, camuflam o viés conservador permissivo da manutenção do poder de suas elites. Busco caminhar em direção oposta a um enredo constituído com os velhos retrógrados de sempre, com os seus indefectíveis disfarces iconoclastas modernistas. Vou falar sobre personagens oriundos do grupo dos subalternos,11 com tipos diversos de vínculo com o lugar, propositalmente esquecidos, posto que sombreados pelo mito da vocação cultural cataguasense.12

 

O flautista

Apesar de não ter nascido na localidade, Patápio Silva [1880-1907]13 é um dos primeiros personagens de fora dos quadros da elite a ganhar fama e reconhecimento nacional no campo da arte. O flautista deu início a sua formação musical em Cataguases, onde passou boa parte da infância e adolescência. Foi discípulo de Paulo Augusto Duque Estrada Meyer, no Instituto Nacional de Música (RJ), gravou para a Casa Edison e participou de concertos com orquestras afamadas. Segundo observadores da época, sua breve carreira foi pontuada por um alto coeficiente musical que desfilava técnica e criatividade (Garcia, 2006). O historiador e crítico de cinema Paulo Emílio Salles Gomes (1974, p. 30-31) salienta a má vontade de Cataguases para com dois homens supostamente eminentes de sua história: um judeu, Gustavo Cohen [1848-1910]14 e um negro, Patápio Silva.

Inserido na Zona da Mata mineira e institucionalmente criado em um contexto de extermínio e expulsão de indígenas, escravização de africanos/afrodescendentes e de destruição do bioma da Mata Atlântica para o cultivo do café, Paulo Emilio Salles Gomes sugere que o lugarejo era tão conservador quanto tantos outros disseminados pelo Brasil, em cujo ambiente “desejava-se apenas que os pretos ficassem em seu lugar. Quanto aos judeus, esses causavam cisma e as ‘manadas de ciganos’, medo” (Gomes, 1974, p. 31). Salles Gomes (1974) reconheceu a postura elitista dos grupos que detinham a autoridade para escrever e narrar a história, traçando os primeiros rabiscos no desenho da identidade cataguasense. A minoria dominante local acabou por empurrar para as sombras o flautista Patápio Silva, artista apreciado por onde passou:

 

[...] morrera em Florianópolis o único talento excepcional que Cataguases conhecera, mas sem reconhecer, Patápio Silva, artista da flauta e do flautim, glória autêntica que a cidade desdenhou: ela o vira engraxate e era preto. Durante muito tempo Cataguases só cultuará os pioneiros e os seus descendentes com carreira brilhante na jurisprudência e na política. (Gomes, 1974, p. 31).

 

Do culto aos pioneiros da toga à devoção aos literatos e cineastas atuantes na primeira metade do século XX, interessa chamar a atenção para a maneira categórica como Cataguases conseguiu dissimular em sua história um artista reconhecido nacionalmente no campo da música. Que conjunto de motivações poderia ter provocado tamanha amnésia? A sobreposição das marcas fenotípicas e culturais associarem-se à ancestralidade africana é, sem dúvida, uma das razões para as exposições dos fatos sobre a cidade cultural mencionarem os projetos arquitetônicos de Oscar Niemeyer, ladeados por jardins de Burle Marx, salpicados por azulejos em painéis de Portinari e Anísio Medeiros, entremeados aos poemas dos modernistas15 e se esquecerem que por ali também soaram solos de flauta de Patápio Silva.

Dotado de uma experiência de vida que lhe permitiu, ainda muito jovem, percorrer cidades dos Estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro, tocando em bandas com artistas locais, o músico foi profundo conhecedor dos ritmos populares, mas mantinha-se atento ao círculo erudito, como sugerem as lições com o maestro Duchesne. Habituado inicialmente aos lundus, valsas e polcas supostamente entoadas em melodiosas reuniões na barbearia de seu pai, adquiriu a bagagem erudita no Instituto Nacional de Música.16 Em um plano mais amplo, que trata a cultura musical no final do período imperial, Luiz Felipe de Alencastro aponta para um impasse em que os ritmos e estilos pareciam cada vez mais sujeitos a contaminações e pergunta: “Como entalar nas senzalas o som das marimbas, agogôs e tambores?” (Alencastro, 1997, p. 45).

Trabalhos acadêmicos (Garcia, 2006; Oliveira, 2007; Silva, 2008) sobre a vida e obra de Patápio atestam que o flautista foi admirado no interior do Rio de Janeiro e Minas Gerais e, não menos, pela fina flor dos simpatizantes da música em diversas capitais brasileiras, granjeando reconhecimento por suas performances em todos os círculos por onde se apresentou. Contudo, mais uma vez, é interessante ressaltar o menosprezo dos narradores da epopeia cultural cataguasense em relação ao artista precocemente falecido em Florianópolis. Como demonstra o Dicionário Cravo Albim, é em Cataguases que Patápio Silva adquire gosto pela música:

 

Filho do barbeiro Bruno José da Silva e de Amélia Medina da Silva. A família transferiu-se para a cidade mineira de Cataguases, onde aprendeu o ofício do pai, no qual trabalhou desde os 12 anos de idade. Desde pequeno interessou-se por música, aprendendo a tocar em flauta de folha-de-flandres, que adquiria com negociantes árabes. Por volta dos 14 anos de idade, estudou solfejo e teoria musical com o maestro italiano Duchesne, que vivia em Cataguases. Conseguindo comprar uma flauta de chaves, nessa mesma época ingressou na banda de música da cidade. Um ano mais tarde, deixou Cataguases para percorrer bandas de cidades do Estado do Rio e de Minas Gerais, tais como São Fidélis, Miracema, Pádua e Campos, o que o tornou, já na época, muito conhecido. (Dicionário Cravo Albim, http://www.dicionariompb.com.br/patapio-silva/biografia)

 

Carmem Garcia ensina que Pattápio17 “foi capaz de chegar ao topo, conquistando todos os prêmios em concursos dos quais participou, tornando-se um virtuose em seu instrumento, estudando apenas em solo nacional” (Garcia, 2006, p. 5). O talento excepcional, aliado a um certo desejo de semelhança, permitia-lhe esquivar-se parcialmente da sua condição social e frequentar alguns círculos elitizados. Exemplo disso ficou registrado quando, em 1902, já com vinte e dois anos, voltou a Cataguases para rever o pai e acabou travando contato com a família Ventania, cuja inclinação pela música culminava em soirées dançantes, na residência da Praça Santa Rita. Desse encontro resultou seu primeiro – e talvez o único – concerto na cidade ao lado da professora Honorina Ventania,18 que fez as partes de soprano e piano (Fundação Cultural, 2000, p. 87).

No ano 2000, a Fundação Cultural Ormeo Junqueira Botelho trouxe à baila uma sucinta biografia de Patápio Silva na publicação Os 100 do Século em Cataguases. Como estratégia de preservação de sua memória, ao mesmo tempo em que se procurou rever a obra do flautista, criou-se um conjunto de chorinho composto por músicos locais. O Sexteto Patápio Silva fez o seu primeiro show, na Praça Santa Rita, exatamente no ano 2000. O sexteto gravou CD e manteve por um breve período a rotina de apresentações. Pouco antes do fim do conjunto, ganhou destaque uma mini-temporada em fevereiro de 2013 – quatro noites de shows – no Rio Scenarium, espaço tradicional para a execução do samba, MPB, choro, forró e da gafieira na noite carioca. Neste mesmo ano de 2013, as apresentações foram se tornando rarefeitas até que o grupo se desfez.

 

O músico, compositor, etnohistoriador, artista plástico...

Messias dos Santos [1942-2011] é cataguasense, cantor/compositor, pintor e historiador.19 O Dicionário Cravo Albin informa que o Mestre Messias contribuiu dando canja em shows de D. Salvador, Luis Eça, Sidney Miller, Guto Graça Melo, Mariozinho Rocha, Amauri Tristão, Sérgio Mendes, entre outros. Como professor enveredou pelo campo da Etnologia e da Etnomúsica. Participou de programas em rádio, como o de Sérgio Bittencourt, na Rádio Nacional e de televisão, como o de Bibi Ferreira, na TV Tupi. Teve músicas gravadas por artistas, tais como, Rosinha de Valença, Lenny Andrade e Elza Soares. Entre inúmeras produções audiovisuais, foi filmado por Cecília Lang no documentário Messias dos Santos, delicadamente nobre.20 Já no fim da vida externou a vontade de voltar ao seu quinhão natal. Sem conseguir, morreu em Santa Teresa, bairro tradicional do Rio de Janeiro, admirado por moradores da vizinhança e turistas. Fora dos círculos sociais compostos por uma parcela ínfima de sua intelectualidade, seus conterrâneos cataguasenses desconhecem sua negritude, seu repertório artístico e a rica biografia desse artista popular.

Os primeiros vinte anos da vida de Mestre Messias permitem reconstituir alguns aspectos da trajetória de pessoas pertencentes aos grupos subalternizados. Trata-se de um menino oriundo do meio rural, que se torna empregado em uma indústria têxtil local, permanecendo ainda por um tempo a reboque dos donos das fábricas. A criança ficou órfã de pai aos dez anos, época em que a família saiu da roça para a cidade. Naquele período, sua mãe tinha sete filhos e, como estratégia de sobrevivência, acabou obrigada a deixá-los sob a guarda de fazendeiros da região. Fugindo pela mata, foi a maneira como Mestre Messias empreendeu sua chegada em Cataguases. Aos quatorze anos, Messias dos Santos já estava empregado na confecção de tecidos local. A produção têxtil capitaneada pela família Peixoto contribuía para esvaziar a roça enquanto compunha os quadros urbanos do setor secundário. Ainda jovem, Messias acabou por ingressar na banda de música da Companhia, entrando em contato com instrumentos de sopro e percussão, aprendendo a ler e a escrever música pelo método da Artinha (Princípios de Organização da Escrita e do Solfejo) do Maestro Pierre. Daí em diante iniciou o estudo do violão, do trompete e da percussão.

Antes disso, teve seu primeiro contato com a música através da sanfona de oito baixos tocada por seu pai, Augusto Severino dos Santos, mestre de Folia de Reis e sanfoneiro dos bailes da região rural.21 Na maior parte do material que versa sobre a cultura produzida por cataguasenses – ou em Cataguases – não há notícias sobre algum aspecto da obra deste artista e nem ao menos o relacionam ao município. Suas escolas públicas e particulares e até mesmo as faculdades ignoram seus quadros, esculturas e músicas. O poder público municipal e as fundações culturais nunca se comprometeram em conectá-lo efetivamente com a cultura produzida na modernista cidade. Por não exibir uma arte que condissesse com o modelo da alta cultura à la Cataguases, os indivíduos que se ocuparam em escrever sua história se desinteressaram pela obra do artista e a cidade virou as costas ao Mestre Messias. Pouco depois de sua morte, o artista recebeu de André Luis Câmara a seguinte mensagem:

 

Ao saberem de sua morte, amigos emocionaram-se num brinde ao Mestre, na esquina do Bar do Gomez, e lembraram sua obra-prima, Jongo diminuto e uma canção que diz assim: “…pra te encontrar na madrugada/ e te guardar dentro das cores”. Marcos Nogueira, o Marquinhos das marionetes, reconhecido pelos maravilhosos bonecos que faz de Cartola, Tim Maia, Raul Seixas, Gilberto Gil, entre outros, se lembra da época em que morou com Messias, em dias de completa pindaíba. “Certa vez ele vendeu um quadro. Chegou em casa e falou: ‘agora é nós’! E fomos jantar fora e beber pelos restaurantes de Santa Teresa durante alguns dias, até o dinheiro do quadro acabar”. Messias dos Santos era assim. Ao partir para a Eternidade, aos 68 anos, dele ficam um chapéu, um sorriso e uma herança de cores, acordes e versos [...].22

 

Como foi relatado anteriormente, como aconteceu com seus antecessores, a vida e a arte de Mestre Messias dos Santos são completamente sombreadas na totalidade das obras que contam a história do município. As marcas estéticas que perpassam sua música e pintura revelam um artista cujas performances não coincidem com a agenda cultural que se desdobra do binômio Verde/Mauro, incansavelmente reinventada pelo poder público municipal, pelas fundações culturais e legitimada por um pequeno coletivo de intelectuais cataguasenses. Rapidamente caído no esquecimento, nenhuma menção a ele é feita quando justificam os empreendimentos locais no campo da arte. Nem festival de música, nem designação de rua, avenida ou mesmo praça, o nome Messias dos Santos parece não fazer sentido para a quase totalidade dos moradores de Cataguases.

 

O ator, acrobata, palhaço...

A percepção que valoriza as tradições eurocentradas e se desinteressa por toda expressão cultural passível de ser conectada à matriz africana, assim como no resto do Brasil, é patente no devir do município de Cataguases. No quesito antirracismo, a vanguarda parece passar longe. A leitura detida das publicações sobre arte e cultura nos jornais locais permite detectar a mídia operando de forma pedagógica na perspectiva de desvalorização dos indivíduos afrodescendentes. Marco Aurélio Luz (2011) discorre sobre uma forma de repressão ideológica conjugada a um rebaixamento do universo cultural negro, condenando o grupo a ser visto e se enxergar em condição inferior aos outros que o cercam. A propósito do assunto, apresento um recorte do Diário Oficial Cataguases, da década de 1960, no qual já na manchete o autor da notícia marca a ferro e fogo a cor do munícipe mundialmente conhecido. O fato de pertencer à trupe italiana Os Rastelli e de fazer arte na Europa, não o livrou de ser tratado como o “Aristides Alves Pereira, de cor preta, que daqui saiu acompanhando um circo [...]” (Grifo meu), (Jornal Cataguases, 11 de junho de 1961).

Mais um personagem literalmente ausente em todos os escritos sobre a história de Cataguases, Aristides Alves Pereira pertenceu à trupe italiana herdeira do malabarista e acrobata Enrico Rastelli e, salvo a nota no jornal Cataguases, não consegui encontrar mais nenhuma menção sobre sua carreira em nenhum estudo sobre personagens e manifestações artísticas locais. Entretanto, quando pesquisei na grande rede seu nome associado ao grupo Rastelli, percebi que Aristides, conhecido internacionalmente como Chocolate, foi um dos mais prestigiosos palhaços brasileiros a fazer sucesso na Europa. Seu nome é mencionado na Circopedia no verbete The Rastellis e em outros sites e blogs alusivos ao mundo da palhaçaria.23 Além disso, foi possível identificar um pequeno vídeo no youtube dos Rastelli, no qual pode-se observar o Aristides (Chocolate) em atuação com o referido grupo.24

Nem a peculiaridade da história sobre um suposto aventureiro que, acompanhando um circo, saiu de Cataguases em direção ao Rio de Janeiro e foi parar numa companhia artística da Europa teria sido capaz de creditá-lo na história grande de Cataguases. E não foi só isso: nos anos 1960, Aristides atuou em um filme no continente europeu. Como atesta a matéria do jornal, os cataguasenses puderam ver os malabarismos de seu conterrâneo na obra cinematográfica “Europa à Noite”, exibida por três dias no Edgard Cine Teatro, em junho de 1961. Teria Aristides participado de outros filmes que não foram exibidos em cinemas brasileiros? Quem se interessaria por Aristides?

Sem dúvida, no conjunto das cidades interioranas, uma figura do naipe de Aristides Pereira caberia como uma luva em qualquer alusão ao campo cultural. Entretanto, como foi relatado anteriormente, os mentores da vocação cultural tornam invisíveis, para não dizer enxotam do mito, os personagens ou manifestações artísticas que não caibam sob as asas do modernismo ou de uma arte elitizada, supostamente de vanguarda. Já que estava na Itália, tivesse Aristides feito uma ponta num filme de Federico Fellini, Michelangelo Antonioni, Roberto Rossellini ou Pier Paolo Pasolini, por exemplo, e ele ganharia o salvo-conduto para a ritualização do mito. Decerto, lá do velho continente, receberia missivas de jornalistas e intelectuais cataguasenses. Talvez nem o enxergassem como o “Aristides Alves Ferreira, de cor preta, que daqui saiu acompanhando um circo [...]” (grifo meu), (Jornal Cataguases, 11 de junho de 1961, p. 1).

 

O Mestre da Folia, do Mineiro Pau, do Futebol...

Nascido em Abaíba (distrito de Leopoldina) em 1928, José Júlio é um morador tradicional do bairro Vila Reis, onde criou no ano de 1986 um grupo de Folia de Reis que realizou sua última performance em 2018. O Seu José Júlio, como é conhecido no bairro, é neto de Escolástia Maria da Conceição, supostamente oriunda de uma fazenda próxima ao município de Pirapetinga/MG. Quase centenário, o artista popular faz questão de ressaltar que sua avó chegou a ser escravizada e pertencia a um senhor conhecido como Chiquinho Reis, dono da fazenda São Pedro, localizada em Abaíba.25 José Júlio foi um dos convidados a participar do projeto Memória e Patrimônio Cultural de Cataguases e ao ser entrevistado em 2012,26 a respeito da Folia de Reis, queixou-se que ninguém mais valoriza nem quer “aprender esse costume” e lembrou que quando se reunia com o Zé Vielo “eu cantava em duas casas, ele cantava numa. Ele cantava duas, eu cantava uma” [...]. (Alonso, 2012, p. 172). Além do grupo de Folia, o artista popular também foi jogador de futebol e participa, agora esporadicamente, de grupos de Bate-pau, conhecidos como Mineiro-Pau. Sobre o aprendizado do Mineiro-pau, ele nos relata que:

 

[...] lá onde a gente morava tinha um senhor muito, daqueles bem de idade mesmo, chamava Rafael. Já tava cambetando, mas tinha aquela preocupação com criança, aquelas coisas, e ele inventou esse Bate- pau. Falou, vou trazer uma coisa para vocês, vou deixar para vocês aí. E eu vou fazer um Bate-pau. Aquilo ele começou a ensaiar. A gente ia para lá, para um curral de boi e fazíamos aquelas coisas todas. (Entrevista com José Júlio, 2012, p. 146)

 

José Júlio garante que o bate-pau tradicional é trovado. Segundo ele, na atualidade é cantado de cor, antigamente não. As cantigas iam fluindo na base de um certo improviso. Conhecedor de saberes que se propagam pela oralidade, o ancião assegura ter herdado dos antigos moradores do lugar uma cultura que vinha de longe e remetia aos costumes dos ancestrais. E, assim, mais ou menos no improviso, José Júlio oferece uma pequena amostra do mineiro-pau:

 

Eu tenho revirado o mundo

E o mundo tem me revirado

 Você me conta sua vida

E eu vou te contar meu passado

Chora Mineiro-pau, Mineiro-pau, Mineiro-pau

O que entrou por cima, hoje vai sair por baixo

Eu estou comendo o pão que o diabo amassou com o rabo27

 

Como salienta Márcio Selligman-Silva (2022b) sobre o olhar do branco que só avista folclore na cultura negra e indígena, o serpentear das folias e dos grupos de mineiro-pau desfilando música, expressão corporal, espiritualidade e poesia por lares e outros espaços de uma Cataguases habitada por uma gente pouco ou quase nada contaminada pelo modernismo, acaba acondicionado na gaveta da cultura popular e nem sequer é lembrado nas narrativas veiculadas pelo poder público que alçam a cidade à condição de terra da arte. Por outro lado, apesar do apoio eventual por parte dos grupos políticos mandatários, via Secretaria Municipal de Cultura, a promoção de apresentações em logradouros públicos, ocorre completamente desconectada de uma política educacional capaz de inserir efetivamente a cultura regional nos currículos escolares. Faz-se da concessão do ônibus gratuito para buscar e levar a turma e do cachorro-quente com refrigerante, oferecido aos talentos caipiras, o valor desembolsado para ostentar uma peça do marketing no âmbito da cultura raiz.

Fora do contexto onde desenvolvem habitualmente suas performances, a aparição em praça pública é observada com certa curiosidade pelas pessoas que circulam na porção central da cidade. Vistos pelo senso comum como espécies de peças de museu ambulantes, os indivíduos envolvidos em folias de reis e bate-paus seguem reinventando suas tradições, esquivando-se de uma violência cada vez mais refinada, que chega a não parecer propriamente violência e sim legítima superioridade (Gonzalez, 1988). O José Júlio ainda guarda na memória casos de uma época em que a oposição entre brancos e pretos costumava ser regulada pelo exacerbamento da intolerância e rebaixamento moral em relação aos segundos (Luz, 2011). Em uma dessas histórias, fica clara a posição de enfrentamento e resistência em relação à autoridade do agente da polícia por parte de um dos indivíduos presentes a um festejo. O artista nos conta que, nos idos de mil novecentos e quarenta:

 

[...] o delegado chamava Zé Ferreira, tinha um delegadozinho lá, aí gritou: - O baile dos preto acabou! Todo mundo, o sanfoneiro não toca mais! Aí tinha um senhor lá que ficou pobre de tanto fazer coisa errada. Matava e pagava pra sair da cadeia, matava e pagava pra sair da cadeia, aí foi dando terreno dele até que ficou sem nada. E esse moço lançou dum revólver, um embornalzão comprido, cá embaixo e falou: - Não, sô Zé Ferreira. “Que os preto acabou, os branco acabou também. Senão, nós vamos comer eles todos no tiro aqui”. E o Zé Ferreira falou: - Não, então volta. [...] (Entrevista com José Júlio, 2012, p. 165).

 

Assim, de lembrança em lembrança, o nosso interlocutor oferece algumas pistas sobre as relações de poder assimétricas entre os diferentes grupos presentes naquele período. O fato de o delegado reconsiderar a ordem para acabar com o baile dos pretos, denota um certo temor da autoridade policial em relação a uma iminente tragédia. Exatamente por essa razão, é importante sublinhar a centralidade da agência, isto é, da capacidade de reação [“do senhor que ficou pobre de tanto fazer coisa errada”] para se desvencilhar de uma gama de problemas vividos, aí incluído o entretenimento, pela condição de subalterno e marginalizado. Com uma firmeza de espírito essencial para enfrentar aquela situação emocional aguda, o baile dos preto foi garantido graças a um anti-herói, obviamente, para o delegado Zé Ferreira.

 

Isabel Escolástica, a rainha da banda

Residente em Cataguases desde os anos 1970, a família da matriarca Dona Bertolina pode ser compreendida como uma espécie de fonte inesgotável, em se tratando de talentos musicais. O filho e os/as netos/as de Dona Bertolina, durante décadas, compuseram a Banda Escolate, liderada por Isabel Lopes Ferreira, a Escolástica, falecida em 2003 e pelo patriarca Antônio Jacinto Lopes, mais conhecido como Antônio Escolate, falecido no ano de 2017, período em que ocorreram as últimas apresentações do grupo. Atualmente, já sem a presença dos líderes, a banda Escolate praticamente desapareceu do espaço público cataguasense, performando de maneira muito fortuita e pontual.

Em sua formação original, a banda Escolate era composta por Isabel (Escolástica) nos vocais, Luzia no surdo, Agripina no tarol, Bertolina (a neta da D. Bertolina) no repenique, Escolatinho no trompete, Antônio Escolate (o pai do restante da banda) no trompete e Félix no surdo. Tal composição dava forma a uma sonoridade de herança africana, pontuada pela marcação do surdo e pelas viradas do repenique, ladeados pelos instrumentos de sopro que reproduziam os refrões das marchinhas e músicas populares presentes nos repertórios das rádios e das charangas dos principais estádio de futebol do país.

Antes de receber o convite que os fez mudar para Cataguases, os descendentes da antiga Dona Bertolina já se apresentavam em público, chamando a atenção de industriais e industriários cataguasenses. Até o ano de 1973, os Escolates residiam no município vizinho Miraí28 e costumavam se apresentar aos domingos nos pátios da fábrica Manufatora, em Cataguases. A tentativa de baratear o custo das idas e vindas de todos os membros da família/banda de música, acabou ensejando o convite para que se deslocassem definitivamente, fixando-se na cidade de Cataguases. E nesse compasso, para poder tocar em e para Cataguases, a família de instrumentistas, conduzida pela ancestralidade da Dona Bertolina, foi escolhida e escolheu se estabelecer na terra por onde passaram músicos como Patápio Silva e Mestre Messias.

Uma das peculiaridades da rica história da banda Escolate foi a sua participação, desde o final dos anos 1970 e ao longo de toda década de oitenta, como a charanga oficial do Operário Futebol Clube em seus jogos no Estádio Carlos Peixoto. Devido às pequenas dimensões disponíveis para as arquibancadas no estádio, praticamente todos os presentes no campo de futebol – aí incluídos jogadores e comissão técnica – acabavam por apreciar o inesgotável repertório da banda Escolate. O certo é que, até o momento, pouco ou quase nada se estudou sobre a genialidade dos Escolates. Em atividade no espaço público e privado, nas greves de servidores em portas de agências bancárias, em visitas de políticos e personalidades ilustres à cidade, em inauguração de ponte, posto de gasolina, padaria, boutique, em cerimônias de casamento, batizado, enfim, para ouvir a banda Escolate, bastava estar em Cataguases.

 

Concluindo

O tópico Cor ou Raça do Censo Demográfico 2022 (IBGE) dá a conhecer uma Cataguases majoritariamente branca. Se somarmos o número absoluto de pessoas que se identificam como pretos, pardos ou indígenas, ainda assim o total é inferior ao contingente de brancos. Comparada com a vizinha Leopoldina, a discrepância torna-se ainda mais perceptível.29 Os números que apontam para uma cidade que se enxerga de maioria branca não devem ser pensados para validar a tese da vocação cultural, todavia, tais informações são importantes fontes para se pensar no perigo de uma história única, expressão cunhada pela escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie (2019) e que exprime a condição de sujeição quando se está vinculado a uma única referência histórica, moral e estética. A questão pontual percorrida neste ensaio diz respeito não apenas à capacidade de se enxergar personagens a habitar outras Cataguases, ela aponta para a possibilidade de descentralizar o protagonismo no campo da arte, cenário cujas relações de poder desde os tempos do Ciclo de Cataguases e do Movimento Verde, até o momento, permanecem inalteradas. Por exemplo, uma das principais fundações culturais estabelecidas na cidade, o Instituto Francisca de Souza Peixoto, Chica, é subvencionada pela empresa têxtil da família Peixoto. À Chica, juntam-se a Fundação Cultural Ormeo Junqueira Botelho e a Fundação Simão José da Silva [atualmente, Fundação Bauminas], constituindo três grupos de capitalistas residentes na região, que se interessaram por investir parte do capital excedente em arte e cultura. É essencial advertir que não é o escopo deste texto questionar o mérito e a qualidade do trabalho desempenhado pelas fundações culturais. Também não há dúvida, de que nas últimas décadas, cada uma das três, individualmente, realizou tanto quanto ou mais no campo das artes e cinema, em âmbito local, do que o poder público, via Secretaria Municipal de Cultura.

A ressalva não me desobriga a salientar que algumas ações promovidas pelas referidas entidades pública e privadas, muitas vezes acabam legitimando e retroalimentando as alegorias que dão vida à ideia de vocação cultural. Em uma delas, o jargão Sou Moderno, sou de Cataguases se materializa em plástico adesivo e ganha os vidros para-brisas dos carros. Cria-se um círculo vicioso cuja exagerada visibilidade de um grupo é o passo seguinte para o sombreamento dos demais, e dessa forma se constrói uma identidade que atende apenas a uma dúzia de leitores de Blaise Cendars e Ascânio Lopes, admiradores de Ganga Bruta e da arquitetura modernista. Basta dar um passo atrás e se distanciar minimamente, para perceber que essa cidadela idealizada pelos intelectuais êmicos é muito pobre e pequena diante do que se pode ver para além do dossel da vocação cultural. Definitivamente, não é a Cataguases dos domingos de futebol suburbano, dos sanfoneiros, dos grupos folclóricos, dos rocks nas quebradas e cachoeiras, da poesia que permeia a sinuca e pinga nos botequins, do celão, das igrejas evangélicas, das umbandas, do carteado apostado, dos maloqueiros, das festas em praça pública, do carnaval de rua, da música composta e cantada nos bairros, enfim, daqueles que estão encarcerados e pelos que movem seus corpos pelas ruas, interagindo e moldando não só o equipamento público legado pelos modernistas.

Assim, não seria desproposital argumentar que, do sagrado ao profano, as narrativas sobre a Cataguases essencialmente modernista escondem tesouros culturais de outras montas. Para ficar com apenas um exemplo, neste recorte regional, é praticamente inaudito o potencial artístico presente nas casas de religiões de matrizes afro-brasileiras. A força do mito pode ser detectada quando colocamos no espelho dois tipos de pinturas distintas relacionadas ao universo religioso local: a) a obra com toque fauvista, Via Crucis de Jesus Cristo, pintada [em 1995] nas paredes laterais da Igreja Matriz de Santa Rita, pela artista plástica cataguasense Nanzita [1919-2007]; b) os orixás e as entidades cultuadas na Tenda Espírita Filhos de São Jerônimo, pintadas em todas as paredes do terreiro de umbanda. O autor é o Pai Nilo, zelador da casa.30 O sacerdote conta que não é artista plástico e não lhe é permitido entregar-se ao ofício da pintura a qualquer hora, isto é, o processo artístico implementado na Tenda Espírita Filhos de São Jerônimo ocorre sob transe mediúnico, o que ajuda a entender quando afirma não ser bom de desenho. Para esta análise, interessa frisar a ausência em informativos locais de ilustrações ou fotografias com as imagens pintadas em um território sagrado de matriz africana, enquanto as paredes trabalhadas por Nanzita já foram incorporadas a diversos guias culturais locais. Estatuária, pontos cantados, batuques e técnicas pictóricas: quase ninguém vê, mas é a arte pulsando na umbanda cataguasense.

Por tudo isso, seria interessante colocar o mito da vocação cultural a serviço efetivamente da coletividade. Quanto ao núcleo do problema, isto é, a produção e a circulação do conhecimento, um dos caminhos está dado: investir na renovação das agendas de pesquisa ao nível local, inserindo atores e saberes até então praticamente desconhecidos dos cataguasenses. As ações com o objetivo de descentralizar o olhar em direção ao feudo arquitetônico traçado na região central da cidade e ao binômio Verde-Mauro, passam pela reorientação da pauta das fundações culturais, pelo incremento da oferta de estudos formadores gratuitos, como já é o caso do curso Tecnologia em Cinema e Animação, oferecido em Cataguases pela Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), e pela reconstrução dos currículos no âmbito das escolas municipais. Como foi dito, a questão ultrapassa a mudança de direção do olhar para quem atua nas brechas. A ideia é promover a ocupação de espaços até então cativos no campo da arte e cultura, o que leva a lembrar o professor Luiz Rufino (2021) quando diz que descolonizar é um ato educativo. A conexão entre arte e educação precisa desaprender o que foi canonizado com o intuito de “fazer vigorar um modelo único de ser e saber” (Rufino, 2021, p. 20). Alinhada às atividades desenvolvidas pelas fundações culturais, a Educação Patrimonial promovida pela Secretaria Municipal de Cultura é um dos instrumentos capazes de proporcionar esse enriquecimento no repertório identitário da cidade, conectando-se ao currículo escolar e contribuindo para que as crianças e adolescentes possam reinventar novos lugares de memória, onde o mato que nasce no campinho de futebol do bairro é tão sagrado quanto as espécies vegetais trazidas [e já destruídas, como é o caso do Colégio Cataguases] por Burle Marx para os jardins da elite cataguasense.

 

Referências

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Data de Recebimento: 27/10/2023
Data de Aprovação: 17/05/2023


1  Fragmento de texto publicado no endereço eletrônico: https://valor.globo.com/eu-e/noticia/2012/11/01/uma-cidade-de-escritores.ghtml [acesso em 03-05-2024]

2  Nomeado por especialistas como Movimento Verde, a sucessão de publicações de uma revista modernista, intitulada Verde, entre os anos de 1927 e 1929, pode ser compreendida como uma das primeiras manifestações literárias brasileiras de cunho modernista produzida fora dos circuitos metropolitanos. Alguns de seus principais integrantes: Enrique de Resende [1896-1973], Antônio Martins Mendes [1903-1980], Rosário Fusco [1910- 1977], Ascânio Lopes [1906-1929], Camilo Soares [1909-1982], Christophoro Fonte Boa [1906-1993], Francisco Inácio Peixoto [1909-1986], Guilhermino César [1908-1993] e Oswaldo Abritta [1908-1947]. Em 1978 a Metal Leve S. A. publicou uma edição fac símile dos exemplares da Verde que circularam entre 1927 e 1929.

3  Nascido em Volta Grande/MG e criado em Cataguases, Humberto Mauro é um dos mais importantes cineastas brasileiros, com parte significativa da filmografia realizada na primeira metade do século XX. Em 1925, o curta-metragem mudo Valadião o cratera, filmado em uma câmera Pathé Baby, 9,5mm inaugura o Ciclo de Cataguases. Sangue Mineiro [1929] é o último filme do ciclo. A extensa filmografia de Humberto Mauro pode ser pesquisada na obra Humberto Mauro: o pai do cinema brasileiro, de André Felippe Mauro (1997).

4  O ramal de Cataguases foi inaugurado em 1877. A ferrovia mencionada ligava Cataguases ao Porto Novo da Cunha, hoje Além Paraíba. Daí até o Rio de Janeiro o viajante poderia se servir da Estrada de Ferro Dom Pedro II.

5  Apesar da grande abrangência do rádio, ao fazer menção a Cataguases que se vê retratada pela crítica nacional e internacional, estou tratando dos grupos com maior escolaridade, interessados no debate sobre arte e cultura, que, por conseguinte, detêm o poder de definição a respeito dos signos a serem rememorados em sua história. Cria-se uma narrativa que hipostasia uma situação pontual, magicizando o espaço urbano, ao passo em que reinventa um território predisposto a abrigar em seu seio aqueles que fazem da arte seu trabalho e fonte exclusiva de renda.

6  Cito aqui dois exemplos da abrangência do Caso Cataguases: em 1952 foi publicado um artigo sobre o Caso Cataguases na tradicional revista francesa L'Architecture d'Aujourd'hui, de Roberto Assumpção de Araújo, intitulado Audaces d’Architecture et d’Art. No mesmo ano, conclamando a população a sintonizar os rádios, era anunciado pelos jornais locais que a Rádio Tupi iria irradiar, no dia 19 de outubro, um programa sobre Cataguases.

7  Messias dos Santos [1942-2011], sobre quem falaremos adiante, é um artista cataguasense e notabilizou- se, entre outras atividades, como músico, compositor e pintor.

8  Em Cataguases, sabe-se muito pouco sobre Aristides Alves Ferreira, um filho da terra que trabalhou na Europa, participando de um conjunto musical humorístico intitulado Os Rastelli. Adiante, voltaremos a falar brevemente sobre a condição racializada como ele é apresentado à cidade pelo Diário Oficial do Município.

9  Sobre o assunto, conferir: CRUZ, Inácio Manoel Neves Frade da Cruz: Modernidade e homens de cultura: vocação cultural, religiosidade e outras ambiguidades no município de Cataguases. 287f. Tese. Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais/UFJF, Juiz de Fora, 2013.

10  Antônio Bispo dos Santos, mais conhecido como Nego Bispo, construiu uma crítica à sociedade colonialista

com base na ideia de contracolonização. Boa parte de sua vida e obra pautou-se no reconhecimento da

legitimidade e autenticidade dos saberes e das vivências dos povos africanos em território brasileiro, elaborando uma resposta contundente aos mecanismos de dominação que penetram nas camadas populares. Em sua obra A terra dá, a Terra quer, Nego Bispo (2023, p. 03) argumenta que, sobretudo, por adotar a língua do opositor é preciso contracolonizar, enfraquecendo as palavras que subjugam os não alinhados ao mundo eurocentrado.

11  Esse estudo pauta-se na noção de subalterno presente na obra da estudiosa indiana Gayatri Chakravorty Spivak (2014), categoria que compreende o conjunto de indivíduos oprimidos e excluídos, destituídos de um mínimo de representação política. Todavia, a autora chama a atenção para a situação em que o intelectual pós-colonial julga poder falar pelo marginalizado, enquanto deveria estar ocupado em abrir espaços para a verbalização por parte dos excluídos, bem como uma escuta que assegure a condição de dignidade para a totalidade do grupo (Spivak, 2014). Ao trazer à tona uma série de personalidades negligenciadas pela conservadora sociedade cataguasense, tenho como objetivo ocupar um espaço até então reservado ao velho racismo epistemológico, como diria categoricamente o professor Abdias do Nascimento. Enfim, trata-se de contribuir com a abertura de janelas para debates sobre as relações de poder implicadas na construção da identidade de Cataguases e não de falar pelos subalternos que por lá viveram.

12  O fenômeno caracterizado como mito da vocação cultural cataguasense deve ser compreendido a partir de um conjunto de indícios que permitem imaginar uma cidade cujo designo é a modelagem de uma monocromática feição artístico-cultural que deságua obrigatoriamente em um ambiente propício a experimentos no campo das artes. Sobre alguns dos mais atuantes atores sociais e ideias que delimitam as narrativas constituintes do mito, conferir: https://www.scielo.br/j/rbh/a/MLpgJ6SvP3FSDD6hcFysPxp/?format=pdf&lang=pt

13  Patápio Silva nasceu em Itaocara – RJ, em 22 de outubro de 1880 e faleceu em Florianópolis, em 24 de abril de 1907.

14  O judeu polonês Gustavo Cohen não era médico, entretanto, para a história local é um personagem pioneiro na área da saúde e deve ser citado como um dos fundadores das sociedades de assistência humanitária que posteriormente iriam se fundir no Hospital de Cataguases.

15  Um exemplo dos textos modernistas relidos exaustivamente em solenidades públicas, transformados em realidade bruta por sua elite intelectual, é o poema Homenagem aos homens que agem, escrito por Mário e Oswald de Andrade. A composição em verso que se ufana de Cataguases como referência para a arte brasileira, havia sido prevista para ser publicada em um livro que nunca foi lançado, cujo título seria O Oswaldário dos Andrades. O texto legitima a suposta aptidão da cultura dos cataguasenses para a criação, nunca como meros repetidores. O poema foi publicado em dezembro de 1927, na quarta edição da Verde: Revista Mensal de Arte e Cultura.

16  Informações extraídas do Dicionário Cravo Albim, no endereço eletrônico: http://www.dicionariompb.com.br/patapio-silva/biografia

17  Segundo Garcia (2006, p. 5) o flautista “acrescentou mais um ‘T’ ao seu nome passando a assinar ‘Pattápio’, com a finalidade de criar glamour neste nome já tão exótico”. Ao longo do artigo mantenho a grafia original.

18  Honorina Ventania era a filha mais velha do médico e político Pio Marques Ventania, figura atuante no final do século XIX na sociedade cataguasense e região.

19  Uma das poucas participações do artista em eventos locais se deu no espetáculo teatral “Carta aos Ases”, encenado em 1967. Dirigido por Simão José da Silva, a peça teve músicas concebidas por P. J. Ribeiro e Messias dos Santos. (Branco, 2006, p. 160).

20  Conferir o link: https://www.youtube.com/watch?v=OvN3LFy9AEA

21  Informações extraídas do Dicionário Cravo Albin, no site: http://www.dicionariompb.com.br/messias- dos-santos/biografia

22  Conferir o endereço eletrônico: http://andreluiscamara.wordpress.com/2011/02/28/mestre-messias-1942- 2011/

23  Conferir: http://www.circopedia.org/Oreste_Rastelli; https://www.circonteudo.com/colunista/mr-chocolat/ e https://www.circonteudo.com/colunista/mr-chocolat/

24  Sobre a atuação do artista, conferir o vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=sJwYXAdGHbs

25  Distrito de Leopoldina/MG.

26  A entrevista na íntegra encontra-se publicada em: ALONSO, Paulo Henrique (Coord.). Memória e patrimônio cultural de Cataguases. Vol. 4. Cataguases: Instituto Cidade de Cataguases/ICC, 2012.

27  Conferir a entrevista com o José Júlio no livro “Memória e patrimônio cultural de Cataguases”, volume 4. p. 143-176.

28  O município de Miraí procura granjear visibilidade pelo fato de ser a terra natal do cantor e compositor Ataulfo Alves [1909-1969], autor da música Meu pequenino Miraí. Neste sentido, foi inaugurado, em 2005, o Memorial Ataulfo Alves que, atualmente, encontra-se fechado a visitações. Entretanto, quando o sambista nasceu, Miraí era apenas uma freguesia pertencente à Unidade Administrativa de Cataguases, que, por essa razão, poderia reivindicar a paternidade em relação ao artista. Assim como os outros, o descarte se dá pelo desencaixe da arte de Ataulfo com a pretensa cultura erudita.

29  Segundo o Censo Demográfico 2022 (IBGE), o município de Cataguases possui 31.285 pessoas que se declararam como pretos (10.700), pardos (20.547) ou indígenas (38), enquanto os que se identificam como brancos somam 34.939. Em Leopoldina, município vizinho, a contagem acompanhou a tendência nacional, com 28.500 pessoas se declarando pretas (10.857), pardas (17.616) ou indígenas (27) e 22.613 brancas.

30  As informações sobre a Tenda Espírita Filhos de São Jerônimo e o Pai Nilo, são tributárias do projeto de pesquisa e mapeamento das casas de religião de matrizes afro-brasileiras intitulado Casas de religiões de matrizes afro-brasileiras na microrregião de Cataguases: percursos, tradições e reinvenções, desenvolvido através do Núcleo de Estudos Afro-brasileiros/NEAB, na Unidade Leopoldina da Universidade do Estado de Minas Gerais/UEMG.