Cantando a chuva: As mudanças nas representações da chuva nas músicas sobre Fortaleza


resumo resumo

Sílvia Helena Belmino
Luminiƫa-Anda Mandache



1. Introdução

Tá bonito para chover1. Essa é a maneira como os cearenses se referem ao céu azul escuro e a temperatura amena anunciando a chegada da chuva. Ela é um fenômeno climático com um forte apelo simbólico na cidade de Fortaleza, capital do Ceará, estado situado no Nordeste do Brasil. Ausente de setembro a fevereiro na maior parte do estado, torna-se um desejo coletivo em 19 março, dia do santo padroeiro do estado, São José. Ele é considerado pelos católicos o responsável pelas primeiras chuvas do ano. O dia é comemorado com missas, rezas, procissões e muita esperança para que seja confirmada uma boa quadra chuvosa anunciada no Encontro dos Profetas da Chuva2. O estado do Ceará possui cerca de 90% do território no semiárido, um clima caracterizado por apresentar longos períodos de estiagem (seca), altas temperaturas (média anual de 27°) e chuvas escassas e mal distribuídas. O fenômeno climático manifesta-se tanto de maneira econômica, como social e cultural.

A música é uma das formas de manifestação cultural deste fenômeno climático. Este artigo busca refletir sobre músicas que trazem a chuva em Fortaleza como tema. Ao cantarem as chuvas na cidade, os/as artistas tocam em questões estruturais do planejamento urbano; em imaginários sobre a chuva e sobre a seca; na relação do turismo com o sol; na memória da cidade; e no humor, uma característica cultural marcante. Essas composições musicais mostram diferentes possibilidades dos/das artistas viverem a urbe, inventarem-se nela e serem afetados/das pela paisagem natural, pelo cotidiano ou pela desigualdade social tão presente nas imagens e no imaginário da capital cearense.

O objetivo deste artigo é compreender como a chuva é cantada por diferentes gerações de artistas e como as mudanças culturais e sociais que Fortaleza experimentou a partir dos anos 1970 aparecem nas composições. Para tanto, levantaram-se algumas questões. De que modo os artistas apresentam os fenômenos climáticos nas composições? De que maneira os problemas sociais e econômicos são evidenciados nas composições sobre a chuva em Fortaleza? E, por fim, como os artistas fortalezenses representam culturalmente as chuvas no contexto atual da capital cearense?

Para tentar responder às questões mencionadas acima, selecionou-se uma música de quatro artistas cearenses de gerações, gêneros e estilos musicais diferentes. São os/as seguintes compositores/compositoras: Ângela Linhares e Gigi Castro (Chove em Messejana); Lídia Maria ( Repanguelejando); Ednardo e Augusto Pontes (Água Grande); Daniel Medina (Lágrima de Índio). A seleção do corpus deste artigo deu-se a partir do banco de dados do projeto Fortaleza em Música, desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa de Imagem, Consumo e Experiência Urbana (GICEU), que possui 240 músicas que trazem a capital cearense e seus lugares como tema. Desse banco de dados, foram selecionadas as músicas que falam sobre a chuva em Fortaleza, compostas por artistas de duas gerações distintas. Com base nas músicas selecionadas, analisamos as transformações ocorridas na cidade e como o novo imaginário sobre o fenômeno climático se manifesta na atualidade.

Como arcabouço teórico para este artigo, trabalhou-se com autores que possibilitaram a compreensão da relação do/da artista com o lugar a partir dos conceitos de experiência (Morgin, 2009); de imaginário (Maffesoli, 2007; Pesavento, 2002; Silva, 2017); dos estudos sobre a seca no Ceará e suas implicações sociais e políticas (Martins, 2006; Rios, 2006) e aspectos da cultura cearense (Carvalho, 2003; 2013). Convém ressaltar que esta pesquisa é um olhar sobre Fortaleza a partir das canções que a tematizam e tem por objetivo perceber como essas músicas apresentam/mostram lugares, espaços e a cidade.

Com as análises das composições, percebeu-se a nostalgia de uma Fortaleza de 30 ou 40 anos atrás entre artistas que surgiram nas cenas musicais nos anos 1970 e 1980, cuja imagem da seca é associada à migração de nordestinos para as regiões Sul e Sudeste do Brasil ou do interior do estado para a capital. Acompanha a esse mesmo período histórico o processo de autoconstrução das periferias brasileiras e da cidadania insurgente (Holston, 2008). Para Holston, as experiências das periferias urbanas da década de 70, “particularmente [as experiências] ligada à moradia ilegal, a construção de casas e ao conflito de terra chegaram ser o contexto e a essência para uma nova forma de cidadania urbana3” ( 2008, p. 4). Essa cidadania, a qual o autor denomina de insurgente, vai ser essencial para a construção da democracia após o período da ditadura militar. Já entre os artistas mais jovens, as composições mostram as desigualdades sistêmicas existentes em Fortaleza, a pobreza urbana e a violência do passado colonial contra os povos indígenas. Eles se utilizam de humor, de ironia e brincam com a linguagem para referenciar essas temáticas.

Interpretamos essa alteração de percepções e experiências associadas à chuva, às mudanças estruturais e políticas mais amplas ocorridas nas últimas duas décadas no Nordeste brasileiro. Essas mudanças vêm reconfigurando representações passadas do imaginário nordestino (Muniz De Albuquerque, 2011) de novas formas. Sentimentos e representações da chuva na música são algumas das expressões dessas mudanças nos imaginários políticos regionais, como mostra nossa análise de dois grupos geracionais de artistas neste artigo.

 

2. Contexto: água e poder político no Nordeste brasileiro

 

Eu sou fio do Nordeste

Não nego o meu naturá

Mas uma seca medonha

Me tangeu de lá pra cá

Lá eu tinha o meu gadinho

Não é bom nem imaginá

Minha linda vaca Estrela e o meu belo boi Fubá.

(Patativa do Assaré, Vaca estrela e boi Fubá, 1981)

 

Antes de fazer parte do circuito turístico nacional (Belmino, 2018; Correia Dantas, 2007), a cidade de Fortaleza era conhecida como a capital do sertão, como argumenta Gilmar de Carvalho: “É bom não perder de vista que Fortaleza é o estuário das levas de retirantes, uma grande cidade sertaneja” (Carvalho, 2013, p. 18). Durante décadas, a seca cearense foi mostrada nas obras de escritores, de poetas como Rodolfo Teófilo (A Fome, 2002), Raquel de Queiroz (O Quinze, 2006), Patativa do Assaré (Cante lá que eu canto cá, 1982), de produções midiáticas como filmes, novelas e, também, em revistas de distribuição nacional como o lugar de muita miséria e atraso.

A relação dos fortalezenses com o sol sempre foi contraditória. Em fevereiro de 1942, o astro-rei recebe uma vaia de pessoas que transitavam pela Praça do Ferreira após afastar uma nuvem escura que anunciava a vinda da chuva. Esse acontecimento inspirou três obras, O dia em que vaiaram o sol na Praça do Ferreira, de Gilmar de Carvalho (1983); também foi retratado por Morzart Sorriano Aderaldo (1989); e nas pesquisas de Alberto Galeno (2000) sobre acontecimentos e fatos ocorridos na Praça do Ferreira. Por outro lado, o soneto de Francisco Paula Ney Fortaleza enaltece o sol utilizando a metáfora A Fortaleza – a loira desposada do sol. Até hoje, políticos e intelectuais, usam esse trecho do soneto para ressaltar as belezas das praias ensolaradas da cidade. A chuva, embora seja desejada em todo o estado, tem significados distintos para os habitantes dos diferentes biomas cearenses. A música Súplica Cearense, composta em 1960 por Gordurinha e Nelinho, aborda o problema causado pelo excesso de chuva no sertão. Trata-se de uma experiência tão ruim para o sertanejo quanto a seca. Entretanto, observa-se uma mudança de abordagem dos dois fenômenos climáticos nas produções musicais a partir dos anos de 1990. Apesar disso, a imagem da seca ainda prevalece no imaginário nacional sobre o Ceará.

Em virtude de uma longa trajetória de períodos de estiagem, a relação do cearense com a água ainda é conflitante. As águas dos açudes, das cacimbas ou das cisternas tornaram-se a expressão de uma relação de poder político no período mais crítico das grandes secas 1915, 1932 e 1982. Ter ou não ter água é uma condição para permanecer ou deixar o lugar. Para a historiadora Kênia Rios:

 

No sertão do Ceará, quem tem o poder não é somente o dono da terra, mas o dono da água. Todo o discurso que gera poder escorrega pelas correntezas nem sempre abundantes do ter a água ou da possibilidade de fornecê-la aos que não têm. (Rios, 2012, p. 249).

 

O estudo de Donald Nelson e Timothy Finan sobre as políticas estatais destinadas a ajudar os nordestinos a enfrentarem a seca persistente, a partir do século XIX, enfatiza o clientelismo como característica dominante dessas políticas. Além disso, eles argumentam que:

 

[...] o atual ciclo de seca e resposta a essa emergência [...] tornou-se uma forma institucionalizada de adaptação à crise reconhecível e articulada dentro do modelo mais amplo de clientelismo. Quando, no entanto, os moradores locais vêm implorar a chegada da seca porque ela aciona o mecanismo governamental de alívio, declaramos irônica essa forma de adaptação no sentido de que o processo de alívio reitera as causas subjacentes que tornam as pessoas tão dramaticamente vulneráveis no primeiro lugar4. (Nelson; Finan, 2009, p. 303)

 

Em outras palavras, a fragilidade climática persistente que os nordestinos vivenciam, aliada ao clientelismo político, os mantém em situação de vulnerabilidade, pois dependem de intervenções periódicas do Estado. Esta realidade não se limita ao século XIX, mas continua a perdurar. Em dezembro de 2022, por exemplo, Jair Messias Bolsonaro, após não ter sido reeleito presidente do Brasil, cortou a verba destinada à compra de água potável para sertanejos nordestinos5. A decisão do ex-presidente Bolsonaro deve-se ao fato do Nordeste votar nos últimos vinte anos em candidatos do Partido dos Trabalhadores nas eleições presidenciais e regionais.

O sol era o grande vilão e a ele era atribuída a morte de animais, da lavoura, a falta d’água e a desnutrição dos trabalhadores do campo, que se viam, muitas vezes, obrigados a deixar a terra em busca de outros lugares para sobreviver. No início da década de 1990, a capital cearense passa por uma transformação imagética, por meio de ações estratégicas de comunicação e marketing, e uma das consequências é a mudança no significado do sol. Ele passa a ser sinônimo de prosperidade e não mais de atraso. Sai o sol da seca e entra o sol do mar (Belmino, 2018).

A pesquisa de Eustógio Wanderley Correia Dantas (2007) destaca os mecanismos políticos públicos e privados que mediaram e apoiaram essa transição, na trajetória de desenvolvimento do Nordeste, de uma estratégia alicerçada na agricultura para outra baseada no turismo. Seu estudo também aponta que essa decisão teve impactos posteriores na dinâmica urbana interna das cidades nordestinas e estimulou entre elas uma competição por turistas. No caso de Fortaleza, como mostraremos mais adiante, o turismo também trouxe um desenvolvimento desigual, progressivamente levando aos atuais níveis de desigualdades que caracterizam a cidade, por meio da gentrificação (deslocando moradores que viviam em locais com potenciais turísticos para áreas mais distantes).

Fortaleza descobre a “vocação turística” e, com isso, lugares indicados para compor este cenário recebem uma atenção especial por parte da governança. De acordo com a pesquisadora Irlys Barreira (2012), diferentes narrativas são construídas — em sites de turismo, campanhas eleitorais e propagandas — para que seja consolidada essa habilidade cearense para o turismo. Nesse sentido, Barreira (2012) explica que, à medida que o negócio turístico se expande, mudanças simbólicas e físicas ocorrem na cidade. “Novas funções para velhos equipamentos e controles para ‘usos indevidos’ configuram parte significativa das políticas e dos investimentos culturais e comerciais. Nunca é demais lembrar que as narrativas da cidade são também narrativas para o consumo.” (Barreira, 2012, p. 201). Portanto, o Nordeste remodelou os espaços urbanos e patrimônios para ter uma relação mais orgânica entre o passado e o presente e, com isso, promover uma imagem moderna para o mercado de cidades turísticas.

O historiador Durval Muniz de Albuquerque Junior (2011) situa a criação do Nordeste como objeto de estudo e objeto de poder político na segunda década do século XX como parte da formação discursiva nacional-popular brasileira. Para Albuquerque Junior, o Nordeste é produto de operações de homogeneização e uma invenção histórica, mas não sem consequências, pois esse processo gera dimensões concretas para aqueles que são sujeitos (e objetos) dessa criação. A criação do Nordeste é possível por meio de mecanismos particulares de poder que colocam a região na posição de colonizada e miserável. Enquanto a obra do Albuquerque Junior investiga representações desse Nordeste — associado à miséria, à seca e ao atraso —, o presente estudo vem defender que tal imaginário não é homogêneo ou atemporal. Assim como as políticas desenvolvimentistas particulares permitiram a construção do Nordeste, as políticas implementadas a partir de 2000 possibilitaram o questionamento desse antigo imaginário e a criação de novas subjetividades que desafiam o Nordeste de 100 anos atrás.

 

3. Experiência e imaginário da chuva nas canções

A chuva foi objeto de estudo com abordagens distintas por diferentes pesquisadores. O trabalho do historiador Emy Falcão Maia Neto Do banho ‘de chuva’ e outras ‘danações’: sociabilidades nos ‘tempos de meninos’ em Fortaleza (1890-1940) traz a relação entre os moradores de Fortaleza e a chuva entre 1890 até 1940, a partir do relato de alguns adultos sobre a sociabilidade com a água quando eram crianças, dos banhos nas chuvas, nas lagoas e nas poças d’água nas ruas de Fortaleza.

A música e a cidade são estudadas por diferentes áreas do conhecimento e perspectivas teóricas metodológicas. Ao considerar a perspectiva comunicacional, ressaltam-se as contribuições dos estudiosos brasileiros com as pesquisas sobre música, gênero, consumo e performance (Soares, 2014; Trotta, 2013; Trotta; Monteiro, 2008); mídias de conectividades, narrativização (Janotti Junior; Queiroz, 2021); cenas musicais ( Janotti Junior, 2013); estudos sobre as cidades musicais, territorialidade e política de Micael Herschman e Cíntia S. Fernandes (2018); sobre regulamentação das músicas nas ruas no contexto de megaeventos (REIA; HERSCHMAN; FERNANDES, 2018). A pesquisa de Alan Mendonça (2021), intitulada Fortaleza cantada: um diálogo lítero-musical sobre a cidade, um dos trabalhos que dialoga com a nossa proposta, restringe-se a uma cena musical específica, enquanto a nossa não faz um recorte cronológico ou de gêneros musicais. Nesta pesquisa, também percebemos a música como um processo comunicativo e, como tal, nos permite, com ajuda de outras disciplinas, compreender a construção simbólica da cidade.

Portanto, a pesquisa proposta aqui tem foco e categorias analíticas distintos daqueles dos trabalhos supracitados. Trata-se de um estudo interdisciplinar que busca conhecer as representações/imagens/imaginário da cidade apresentadas nas músicas por meio das letras e das entrevistas realizadas com os compositores. Assim como conhecer as experiências, as subjetividades e vivências dos artistas de diferentes gerações com a chuva, um fenômeno climático tão simbólico no estado.

Afinal, qual a relação da música com a cidade de Fortaleza? Notamos na música uma forma ou um dispositivo de narrar o espaço urbano. É a maneira pela qual o artista reflete sobre questões sociais, sentimentais, simbólicas e históricas da cidade. Compreendemos a cidade como um encontro entre a natureza e o social (Lefebvre, 2006; Mafessoli, 2004), e com isso, percebemos na música uma forma de construção simbólica ou imaginária da realidade dos espaços urbanos, das práticas culturais, das paisagens naturais e das características climáticas. Ademais, o imaginário urbano criado pela música pode ser visto como a evocação de uma memória afetiva e de uma experiência em um espaço/tempo determinado (Silva, 2017). O artista traz nas composições o mundo em que vive — violência, amor, nostalgia, cotidiano e desigualdade — e esse mundo torna-se um conjunto de referências que compartilha com outras pessoas (Mafessoli, 2004). Assim, o compositor transmite a experiência mental/física com a cidade para seu público por meio de canções.

A experiência do artista começa nos caminhos, nos percursos, ao deparar-se com sons, cheiros, paisagens, toques e sentimentos presentes nos lugares/espaços da urbe. Ele atém-se aos destaques românticos e nostálgicos, diferente de um olhar mais técnico que a percebe como um lugar que deve ser controlado e disciplinado. “A forma da cidade. Sua imagem mental não corresponde em nada ao conjunto que o urbanista e o engenheiro projetam, não se decidem numa prancha de desenho os ritmos que tornam a cidade mais ou menos suportável e solidária.” (MONGIN, 2009, p. 56). Assim, como explica o autor, as experiências narradas pelos artistas são misturas de vivências mentais e físicas. Para Olivier Mongin (2009), a cidade é um espaço que possibilita experiências múltiplas que podem ou não ser consumadas. É essa diversidade que alimenta a imaginação do artista.

A música traz uma narrativa sobre um lugar na cidade que não somente descreve a paisagem, mas também revela sentidos que vão além do que é dito nas letras ou na melodia. Ela desloca o ouvinte para o cotidiano, direciona o olhar para aquele espaço da cidade, traz imagens e produz imaginários. O imaginário é visto aqui como uma produção de ideias e imagens que criam e representam de maneira coletiva o real (Pesavento, 2002). As realidades de Fortaleza, vivenciadas cotidianamente pelos músicos, assumem formas metafóricas nas canções para denunciar desigualdades, violências, abandono, dores e mortes.

Os compositores escolhidos para este artigo mostram o sentimento de pertença ao lugar. E é na chuva, um fenômeno climático, que esse sentimento se manifesta, seja para amenizar os efeitos do sol que os obrigaram a abandonar o lugar; seja por evidenciar as contradições tão presentes em uma das capitais mais desiguais do Brasil; seja pela alegria do barulho das primeiras gotas de água nas telhas das casas, sentidas pelos idosos, ou da possibilidade de banho de chuva — a alegria das crianças (Maia Neto, 2012). Como nos lembra Mafessoli (2004), os artistas captam o espírito do lugar.

 

4. Metodologia de pesquisa: Fortaleza em música

Este artigo é o resultado parcial do projeto de pesquisa intitulado Fortaleza em Música, desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa Imagem, Consumo e Experiência Urbano (GICEU), vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal do Ceará (PPGCOM/UFC), que tem por objetivo cartografar e analisar as canções que tematizam Fortaleza, a fim de compreender a relação entre experiência, imaginário e construções simbólicas dos lugares/espaços com as produções musicais. O projeto Fortaleza em Música cadastrou cerca de 200 músicas e 50 entrevistas com compositoras e compositores. Foram elaborados a partir dos dados um livro ilustrado (álbum de Figurinhas) e um aplicativo para celulares com a geolocalização de lugares musicados na cidade.

Para a seleção do corpus, utilizou-se como critério a presença da chuva nas letras das canções. Em um universo de 250 músicas, optou-se por quatro composições de cinco artistas cearenses de geração, gênero e estilos musicais diferentes. São os/as seguintes compositores/compositoras: Ângela Linhares e Gigi Castro (Chove em Messejana, 2012); Lídia Maria (Tá Repanguelejando, 2019); Ednardo e Augusto Pontes (Água Grande, 1974); e Daniel Medina (Lágrima de Índio, 2017).

Na nossa escolha por esses quatro artistas consideramos dois fatores: primeiramente, procuramos encontrar artistas que cantassem sobre a cidade fazendo referência direta à chuva, focando no seu significado cultural e social; em segundo lugar, pretendíamos encontrar artistas de diferentes gerações, considerando que diferentes experiências geracionais estão imbuídas no processo de criação. Ou seja, a escolha destes quatro artistas foi motivada pela questão mais ampla que abre este estudo: como as diferentes gerações de artistas se relacionam com a cidade ao longo do tempo? A chuva, como fenômeno cultural e social, é aqui apresentada como a linguagem ou o meio que carrega diferentes afetos e mudanças nas relações dos artistas com a cidade. O fato de todas as músicas pertencerem ao mesmo gênero musical (MPB) e de dois artistas se identificarem como mulheres e dois como homens, facilita a comparação e a análise. Além disso, as canções selecionadas trazem nas sonoridades características locais/regionais, sejam nas melodias ou nas letras, o que proporciona uma facilidade na compreensão do sentimento da população fortalezense em relação à chuva.

Para a análise das quatro músicas aqui estudadas, criaram-se categorias analíticas usando como base: a) letras das músicas; b) temporalidade da criação; c) os laços afetivos dos/das artistas com a cidade; d) as relações culturais com a chuva; e e) questões socioeconômicas.

Complementamos a análise temática dessas músicas com dados de entrevistas realizadas com os/as artistas, como detalhou-se no tópico de metodologia. Dois artistas se identificam como mulheres e dois como homens; um vive atualmente em São Paulo, outro no Rio de Janeiro e dois em Fortaleza; três ilustram a cidade nas décadas de 1970 e 1980 e os outros dois após 2010. Realizou-se uma análise temática de quatro músicas (Russell, 2011) e contextualizou-se as letras com as informações obtidas por meio de entrevistas semiestruturadas, realizadas online pelos integrantes do projeto entre os anos de 2018 e 2021.

As perguntas do roteiro de entrevistas foram elaboradas pensando nas seguintes temáticas: experiências dos artistas com a cidade durante a chuva; e a relação com os lugares, bairros e espaços cantados no processo da criação musical. A análise temática resultou em duas categorias inter-relacionadas que serão discutidas no próximo tópico, junto com a triangulação de informações obtidas nas análises temáticas e nas entrevistas. No tópico seguinte, mostra-se como as categorias resultantes das análises são explicadas a partir das diferenças geracionais e classe social.

 

5. Pesquisa e análises

Antes de aprofundar na apresentação dos dois tópicos da análise, achou-se importante apresentar os sujeitos da pesquisa: quem são; suas obras; e a relação com a cidade. Ângela Linhares e Gigi Castro moram atualmente em Fortaleza. Chove Messejana foi composta em 2012 e ficou entre as finalistas do Primeiro Festival de Música da Assembleia Legislativa do Ceará. As duas participaram de movimentos sociais na década de 80 no bairro Messejana, um dos bairros mais extensos e antigos de Fortaleza. Ângela Linhares foi professora da Universidade Federal do Ceará e Gigi Castro trabalha em uma instituição não governamental de proteção à criança e ao adolescente.

Ednardo mora no Rio de Janeiro. Na época em que a música Água grande foi composta em parceria com Augusto Pontes, iniciava sua carreira em São Paulo na década de 70. É um cantor e compositor conhecido nacionalmente e sua obra é uma combinação de elementos rurais e urbanos.

A música de Daniel Medina foi inspirada tanto na música de Ângela Linhares como na de Ednardo, pois foi através das músicas desses artistas que ele explorou a cidade na adolescência. Atualmente mora em São Paulo e trabalha com música. Lágrima de Índio, a canção escolhida para análise, teve um longo processo de criação; iniciou em 2013 e finalizou em 2018. “Cinco anos de idas e vindas entre trabalho constante, longos períodos de gaveta, abandono e, por fim, desistência, que também se dá o nome de conclusão da canção”, explica Medina.

Por fim, Lídia Maria que nasceu e criou-se na Barra do Ceará, filha de trabalhadores da indústria e do comércio, formou-se em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Ceará. Foi na região que hoje compõe o bairro Barra do Ceará que os primeiros colonizadores aportaram em Fortaleza. Ali hoje encontra-se o marco zero. É um dos lugares mais populosos da capital e, também, um dos com menor desenvolvimento econômico. A música escolhida, Tá Repanguelejando, foi inspirada em um meme criado no período de carnaval e descreve a Fortaleza da sua infância nos anos 1990 na Barra do Ceará.

Uma característica comum entre as músicas é a dualidade para descrever Fortaleza e o efeito da chuva na cidade. Em um país tão díspar como o Brasil e em uma cidade tão dividida economicamente como Fortaleza – classificada, recentemente, como uma das cidades mais desiguais do mundo (Moreno et al, 2008) –, o uso do antagonismo não surpreende. É como se a imagem da cidade fosse construída através de opostos: chuva versus seca; pobre versus rico; indígena versus branco; amor versus sofrimento; norte versus sul; e migração versus permanência. Vista dessa forma, a chuva se torna uma metáfora para diferentes emoções que essas contradições inspiram.

 

5.1. Nostalgia, seca e chuva

Nostalgia é o “nome que damos à saudade agridoce de tempos e espaços anteriores” (Niemeyer, 2014, p. 1)6 tendo a temporalidade como característica fundamental, pois revela uma relação que existe entre o passado, o presente e o futuro (Ange; Berliner, 2015). Dessa maneira, os artistas aqui estudados discutem o movimento dentro da cidade e do país junto com a passagem do tempo. Eles alimentam a nostalgia de um sentimento de espera/desejo da cidade por chuva. O sentimento nostálgico se mostra mais presente nos artistas que vivenciaram na juventude a chegada de agricultores em busca de sobrevivência na capital. Os mais jovens não tiveram essa experiência.

Para os artistas que vivenciaram a cidade na juventude dos anos 1980, a chuva evoca a nostalgia de uma Fortaleza que não pode ser separada do sertão e, consequentemente, da seca. Ângela Linhares, por exemplo, associa a chuva ao amor romântico e ao desejo, enquanto Ednardo à ânsia de retornar a Fortaleza. Como a seca empurrou os brasileiros do interior para a cidade e do Nordeste para o Sul em busca de uma vida melhor, o movimento migratório dos nordestinos foi expressivo entre as décadas de 1970 e 1980. Ângela Linhares, ao falar sobre essa relação, compara a capital com o sertão:

 

Fortaleza é um sertão pobre, vasto e imenso. Eu acho que no fundo, Fortaleza é um sertão triste, um sertão empobrecido, não é pobre, ele é riquíssimo não é? [...] Essa coisa, eu gosto muito de Fortaleza, que é esse sertão, no fundo, no fundo há um sertão em Fortaleza. As pessoas vieram do sertão e trouxeram todo o sertão dentro delas, pra essa água de mar, e eu acho que o mar já leva e traz gente, mesmo que simbolicamente, mas essa dupla faz de Fortaleza um lugar mais, é… como eu disse assim um lugar sempre na fronteira. [...] Mas a Fortaleza tem esses dois lugares e o sertão também, o sertão é o nosso mais profundo do ser. Eu digo triste, mas… mas não é uma coisa triste como se pensa, quando eu digo assim é porque ele é mais fundo, é a própria… é uma forma própria de olhar onde a cultura da necessidade impera. (Entrevista em 30.11.2020)

 

O depoimento de Ângela nos remete ao que Maffesoli (2004) atribui às referências compartilhadas, de diferentes ordens e essencialmente simbólicas, com o outro. Elas constroem socialmente a realidade, ou seja, constituem o mundo comum. Portanto, “Estou no mundo que eu constituo” (Maffesoli, 2004, p. 48). Assim, o conjunto de referências da artista sobre a capital cearense remete à relação dela com as práticas culturais sertanejas presentes na Fortaleza de sol e mar.

A música Água grande de Ednardo mostra a chegada da chuva e a decisão de retornar à terra natal. Aqui, a chuva é vista como uma força motriz para voltar para Fortaleza, para o Nordeste. “A volta ao útero se reforça com a chegada da chuva, a decisão de fazer o caminho de volta, cuja senha foi um aviso de chuva me chamou.(Carvalho, 2013, p. 29).

 

Janeiro e nada
Fevereiro e nada
Marçabril e águagrande despencou
Um aviso de chuva me chamou
Marçabril e águagrande despencou
Um aviso de chuva me chamou
Adeus São Paulo
Está chovendo pras bandas de lá
Também estou com pressa

Está chovendo pras bandas de lá

 

No entanto, os artistas que experimentaram a cidade nos anos de 1990 não têm a mesma vivência e memória com chuva dos compositores anteriores. No início dos anos 90, Fortaleza passa por um processo de transformação imagética com o reposicionamento do sol da seca para o sol do turismo. A música Lágrima de Índio, de Daniel Medina, procura enfatizar as desigualdades que continuam a permear e dividir a cidade. Para Lídia Maria, como mostrará mais adiante, a memória da chuva das décadas anteriores não está presente na música escolhida. Mesmo assim, os dois jovens artistas carregam em suas canções a experiência dos nordestinos, levando sua cultura e modos de vida para a cidade nas décadas de 1970 e 1980. Lídia Maria evoca uma Barra do Ceará, bairro natal, que lembra a vida no interior do Ceará. Medina, que não vivenciou um bairro popular, busca nas lembranças da avó essa experiência:

 

Então, nem todo mundo curte essa coisa do mar não, assim, né, meu avô, minha, minha família conseguiu comprar, quando se mudaram do interior pro, pro, pra capital, minha avó era indignada porque ele, ao invés de comprar um terreno pras bandas da praia, ele comprou um terreno lá no, no, no Zé Walter, comprou o terreno ali no, no, Parque São José. Então, assim, era, a pessoa vinha do interior, mas queria continuar no interior, eu queria comentar isso aí, são, são muitas cidades, né? (Entrevista em 17.08.2022)

 

Há um sentimento nostálgico das pessoas que migraram do sertão para Fortaleza. Elas guardam a imagem do lugar como elas deixaram. Um lugar que não existe mais. Uma imagem congelada no tempo em que migraram. Esse tema encontra-se presente na obra de Ângela Linhares e Ednardo Para Ângela Linhares:

 

Mas você está pensando que você deixou o seu interior, e o interior está parado, e as pessoas estão paradas, estão paradas, não pense assim não. Elas se modificam e quando você chegar lá, você vai encontrar outra cidade, você não vai encontrar a mesma cidade. Então, você pode voltar se você quer voltar, tudo o que eu queria era poder voltar. (Entrevista 30.11.2020)

 

O sentido ou o não sentido do espaço urbano se faz para nós a partir de nossas experiências, vivências, memórias e das contribuições dos meios de comunicação. São as imaginações provenientes de livros, cinema, músicas, revistas e, também, de relatos cotidianos de jornais, redes sociais, aplicativos e de televisões que nos trazem os acontecimentos das ruas, das cidades e dos lugares.

 

5.2. Chuva, desigualdade social e novas subjetividades

A questão da desigualdade social na cidade, como algo ilustrado pela chuva, é um tema apresentado com mais clareza na obra dos artistas mais jovens. Além disso, são eles que escolhem descrever em suas canções lugares da cidade associados às classes populares. No entanto, a escolha de Ângela Linhares por Messejana em sua música não é acidental. Apesar de nunca ter morado em Messejana, o bairro, distante do litoral, é um local onde ela atuou como ativista na década de 1980. Sua paixão pelas artes e ativismo são emblemáticas para o que Messejana significa para ela, como ilustrado na frase “Messejana é minha alma nua”. Na década de 1980, Linhares se engajou na criação de aulas de artes para crianças em situação de rua, em áreas mais pobres da cidade. Nesse sentido, Linhares é uma representante da classe média brasileira formada por intelectuais de esquerda, que teve um papel fundamental de resistência política no período da ditadura militar, estando presente na periferia das grandes cidades brasileiras (Araujo et al., 2013), incluindo Fortaleza, conduzindo um trabalho político e cultural ao mesmo tempo.

Mesmo assim, o sentimento de descontentamento face às desigualdades persistentes na cidade é mais explícito e direto na música dos jovens artistas. Até recentemente, grupos historicamente marginalizados no Brasil eram sujeitos dos discursos ou retratos dos intelectuais de classe média7. As mudanças socioeconômicas posteriores a 2003, graças às políticas públicas implementadas pelo Partido dos Trabalhadores em nível federal e às modestas reduções da desigualdade social, criaram espaço em lugares geralmente ocupados por grupos privilegiados para pessoas de grupos historicamente marginalizados. Foi um momento histórico que permitiu cidadãos de grupos marginalizados frequentarem universidades e ingressarem na classe média ou classe C, como ilustra a pesquisa de Sean Mitchell, Ben Junge e Charles Klein (2018) em três cidades brasileiras.

Os dois jovens artistas aqui apresentados são em grande parte frutos desse processo de transformação. Um deles faz parte de um grupo recipiente dessas políticas e o outro pertence à classe política e intelectual que apoiou essas reformas, embora não seja um beneficiário direto delas. Portanto, a desigualdade da cidade e todo o passado colonial violento são o pano de fundo na música deles. Para eles, chuva não é amor ou afeto, mas sim transtorno, que expõe o investimento desigual da cidade em saneamento, infraestrutura e, também, como os moradores respondem a essa desigualdade nas quadras invernosas.

Lídia Maria é a única que tem vivência em bairros pobres de Fortaleza. Essa experiência com a desigualdade e a diferença de classe reflete-se nas composições e na sua trajetória artística, como ela mesma explica:

 

A partir do momento que eu canto aquela música, eu saio, eu deixo de ser uma pessoa de periferia pra ser uma, né, eu estou inserida, eu sou aceita. Então, muitos sabiam e, talvez, muitas pessoas ignoravam o fato de eu morar na Barra. Eu lembro, se eu falar que morei na Barra aí rola né, talvez, hoje menos. Rolava esse tipo de piada ‘Nossa, é longe’. Já teve um compositor aqui, um compositor querido, um grande compositor inclusive, que fez uma brincadeira “Lídia a gente vai se juntar e vai alugar um apartamento aqui perto, pra você morar aqui perto. Porque a Barra é muito longe e tal”. Um compositor já de outra geração, bem mais velho, ‘A gente já fez isso pro fulano, anos atrás’ e não sei, é esse tipo de piada. (Entrevista 05.02.2021)

 

A jovem compositora descreve a música como uma via de aceitação social, pois a arte a permitiu ser “inserida” ou “aceita” pelos estratos socioeconômicos superiores. A música anuiu a mobilidade entre o centro e a periferia, entendidos como dois mundos separados. O estudo de Moisés Kopper e Matthew Richmond sobre periferia descreve-a não apenas como um espaço físico geográfico em oposição aos centros urbanos, mas também como uma arena de sociabilidade e expressão cultural e, mais importante, “um berço de projetos políticos de emancipação de populações menos favorecidas” (Kopper; Richmond, 2020, p. 9).

A cidade de Fortaleza engloba de um lado o centro econômico e turístico situado no litoral e a periferia em direção ao interior da cidade. A cidade foi construída em cima de uma história de desigualdades regionais e locais, portanto, os padrões de desenvolvimento desigual que ainda preserva (Garmany, 2011) podem explicar por que esta cidade é uma das mais desiguais do mundo. A Barra do Ceará, local de origem de Lídia, situa-se no litoral, mas é considerada parte da periferia devido aos seus indicadores de desenvolvimento baixos, ilustrando mais uma vez a ideia de que a periferia não é simplesmente uma região geográfica (Kopper; Richmond, 2020). Um estudo, feito com dados do censo de 2010, concluiu que dos 119 bairros que formam Fortaleza, Barra do Ceará ocupava a 101ª posição (0,21) no índice de desenvolvimento humano. Na primeira posição do ranking está o bairro Meireles, situado à beira-mar, com índice de desenvolvimento humano de 0,95. Os cálculos do índice de desenvolvimento humano levaram em conta a renda, os níveis de educação e a expectativa de vida da população de cada bairro da cidade (Prefeitura de Fortaleza, 2014). A Barra do Ceará e sua região foram frequentemente alvo de deslocamento devido à sua posição no litoral, que atraiu o interesse imobiliário. No entanto, a região continua a existir graças a uma história de mobilização local que remonta a meados do século XX e é objeto de vários estudos acadêmicos (Barreira, 1992). O investimento em turismo nas últimas décadas apenas amplificou e ilustrou as desigualdades existentes (Gondim; Hallewell, 2004). De certa forma, pode-se dizer que a região a que pertence à Barra é um espaço de resistência frente à especulação imobiliária. O comentário de que a Barra é longe dá a entender que o centro é a bússola social da cidade: o que conta, o centro cultural e econômico, o lugar onde Lídia “deveria” estar como uma artista reconhecida. Isso implica que a Barra, mesmo não sendo longe geograficamente do centro econômico, e estando situada na orla marítima, e vista como um lugar situado “longe”. Nesse caso, o artista mais velho percebe essa distância como cultural e econômica.

A divisão geracional é também enfatizada por Lídia. As gerações mais velhas persistem em ler a cidade em termos binários e os perpetuam com suas afirmações, enquanto os mais jovens, como a dela, ousam desafiá-los. Lídia não hesita a esse respeito:

 

Eu sou da Barra, entendeu? Eu não nasci no bairro nobre da cidade, entende? Hoje em dia pode ser tudo mais misturado, mas eu já tenho 32 anos, então há vinte anos atrás você morar na Barra do Ceará era outra história, entendeu? Você com dez anos de idade ali, tipo assim, tudo era mais longe, as diferenças sociais eram bem maiores. (Entrevista em 05.09.2022)

 

Lídia deixa claro que não nasceu na parte rica da cidade, origem da qual parece se orgulhar. Ao dizer que hoje tudo está “mais misturado”, ela faz referências implícitas à redução das desigualdades sociais possibilitada pelas políticas de inclusões sociais implementadas pelo Partido dos Trabalhadores. Nesse sentido, seu depoimento lembra a cena final do filme Que horas ela volta de Anna Muylaert (2015). No final do filme, Jéssica, uma jovem nordestina, e sua mãe, uma ex-empregada doméstica, tomam um café em um conjunto de xícaras brancas e pretas. Val, mãe de Jéssica, arruma os copos e comenta “É tudo diferente isso aqui, preto no banco, o branco no preto. É diferente que nem tu.” Esta frase resume o entusiasmo trazido por políticas que desafiam desigualdades centenárias no Brasil. Jéssica, nordestina filha de migrante que passou a vida toda trabalhando como doméstica em São Paulo, é admitida em uma das mais prestigiadas universidades do Brasil. Assim como Jéssica, Lídia está quebrando padrões históricos anteriores e é explícita sobre esse processo e o que isso significa para ela.

As políticas socioeconômicas implementadas após 2003, durante a Maré Rosa no Brasil, criaram mais mobilidade social para população de baixa renda e, também, novas subjetividades políticas (Junge, 2018). O estudo de Charles Klein (2019) em São Paulo também mostrou como esses jovens brasileiros da periferia invertem a cidade (flip the city em inglês) por meio de práticas ativistas que questionam noções de centro ou de periferia. Charles Klein pesquisa ativistas da Zona Sul de São Paulo e suas manifestações artísticas e argumenta que esses movimentos culturais são expressões de “subjetividades cosmopolitas insurgentes”. Jovens ativistas dessas áreas sugerem inverter a cidade e romper com os estereótipos que sugerem que a periferia é um lugar de marginalidade e inferior ao centro. Em vez disso, eles sugerem que a periferia é também o centro da vida cultural. Outros estudos recentes na cidade de São Paulo documentam os movimentos juvenis progressistas ativos em lugares considerados periféricos e apontam para a diversidade e energia da vida cultural nesses lugares (Almeida, 2012; Moreno, 2018). Entretanto, com poucas exceções (Mandache, 2023), não há tantos estudos sobre os processos de mudança cultural ocorridos em outras cidades brasileiras do Nordeste, como Fortaleza nesse caso.

Jéssica e Lídia fazem parte da geração descrita nesses estudos e suas subjetividades políticas demonstram a necessidade de corrigir padrões anteriores de desigualdade. Lídia Maria fala sobre seu local de nascimento não como um local associado à pobreza ou à criminalidade, como as narrativas midiáticas podem sugerir, daí a necessidade de Lídia Maria contestar a afirmação e recusar a “oferta” de mudar para uma parte “melhor” da cidade.

Portanto, em sua música, ela dá voz às diferenças e às experiências de classe. Em sua música, ela descreve, por exemplo, como jovens de diferentes classes sociais vivenciam a chuva em Fortaleza. Enquanto os ricos, da Beira Mar ou a região com os indicadores de desenvolvimento humano mais elevados, parecem impactados e com receio dos incômodos provenientes da chuva, os do José Walter, também um bairro popular, desfrutam de sua presença:

 

Acordei em Fortaleza sem um pingo de sol

Desci a Praia da Barra enrolada num lençol

E o povo metido a besta que mora na Beira Mar

Tava tudo alagado ninguém sabia nadar

Os meninos do Zé Walter sem medo de se molhar

Com os malucos do Benfica começaram a gritar

Tá repanguelando

 

Neste trecho, Lídia Maria faz uso do humor e da ironia para abordar a desigualdade social tão presente na paisagem e no cotidiano de Fortaleza. O uso dos elementos de sentido nas letras de Lídia Maria são aspectos da linguagem que merecem atenção. De acordo com pesquisas recentes sobre memes políticos no Brasil (Medeiros et al., 2021), o humor e a ironia são formas de linguagem usadas por jovens no Brasil para comunicar posicionamentos políticos. Neste caso, a população da área mais abastada da cidade é descrita como “metidos a besta” que não sabem nadar, sugerindo que não conseguem lidar com as dificuldades decorrentes de uma chuva forte. Já as crianças do bairro popular José Walter abraçam a chuva e não têm medo, se molham, sugerindo que se divertem. É comum nas áreas periféricas da capital cearense crianças aproveitarem coletivamente a chuva com brincadeiras e banhos, uma imagem cotidiana durante a quadra chuvosa que a artista traz para a composição. Mostra que essa prática de sociabilidade ainda se encontra presente nas áreas periféricas de Fortaleza.

Daniel Medina, o segundo jovem artista, pertence a um segmento da classe média que apoiou esforços para reduzir as desigualdades socioeconômicas no Brasil. Para ele, a chuva é algo que expõe claramente as discrepâncias:

 

E o pessoal fala muito que Fortaleza não tem uma estrutura para receber chuva, cidade nenhuma tem estrutura para receber chuva, quando é muita chuva. Então, o Ceará tem essa questão com a chuva, né? Então, quando pode chover, que quando chove, é chuva demais. Quando chove, chove demais e Fortaleza tem essa história de alagamento, é uma história que é uma história contínua. (Entrevista em 17.08.2022)

 

Ele reconhece que a chuva lembra a população de Fortaleza de uma história contínua de financiamento inadequado em infraestrutura em áreas menos desenvolvidas economicamente. Ele aproveita a chuva na cidade para trazer o apagamento dos povos originários. E homenageia e visibiliza o passado indígena da região e para as áreas menos poderosas economicamente:

 

Todos debaixo d’agua

Tabajaras, quanta mágoa

Quanto medo em tua cara

Quanta água em tua taba

Dorme, seja

Dorme, Messejana seja aqui

E ali onde Peri

Beijou Ceci beijou Peri

Beijou Peri beijou Ceci

Ou é tupi or not tupi

Dorme, curumim

Que a chuva enfim

Vai te pegar

Chuva, curumim

Que é chôro.

 

O trecho acima faz referência aos indígenas das etnias brasileiras Tupi-Guarani e Tabajaras, reconhecendo o medo e o sofrimento em decorrência do processo de colonização. A chuva também é uma metáfora para a tristeza e o choro resultantes desse sofrimento. A letra faz referências aos personagens Ceci e Peri do romance O Guarani8, do escritor cearense José de Alencar. O compositor faz alusões à literatura, ao idioma dos povos originários e, ao mesmo tempo, fala sobre bairros e ruas de uma Fortaleza contemporânea. A música leva o ouvinte a ver a chuva como uma continuidade do passado.

A referência aos povos indígenas também é algo que aponta para as diferentes sociabilidades e consciências políticas dos artistas mais jovens. Nos últimos 20 anos, a situação indígena ganhou maior visibilidade no Brasil e no exterior, e a música do Daniel Medina é um exemplo de como essa visibilidade também está presente na cultura popular. Todos esses exemplos apontam para um outro olhar sobre a chuva que se apresenta com os artistas mais jovens. Ela é uma porta que se abre para o passado colonial do Brasil e para a necessidade de desafiar os padrões anteriores de desigualdades por intermédio de intervenções políticas.

 

6. Considerações Finais

Se a água, representada aqui pela chuva, é um símbolo da fertilidade para o agricultor, a seca, a falta de precipitação, seria a negação à vida. Contudo, a seca, assim como a enchente e a geada, as chamadas crises climáticas periódicas, não são as únicas responsáveis pelas grandes calamidades. O que faz da seca um flagelo social e parte da história da região, hoje chamada de Nordeste, é a questão política e econômica. A falta de água foi mostrada nos principais meios de comunicação jornais, literatura, música, teatro como causa da fome, da pobreza e da morte, quando, na verdade, ela esconde uma trajetória de miséria anterior (FRANÇA JÚNIOR, 2003). Porém, a miséria é sobretudo resultado da falta de intervenção política. As mudanças ocorridas no Brasil nos últimos vinte anos, por meio de políticas específicas voltadas para as desigualdades históricas do Brasil e do Nordeste, também produziram mudanças no imaginário da chuva. Essas políticas foram capazes de levar a uma maior redução das desigualdades sociais entre as diferentes regiões do Brasil. Mas, mais importante, estudar a chuva foi e é caminho importante para entender as mudanças sociais e imaginárias associadas ao Nordeste brasileiro. Interpretamos a mudança de significado da chuva, em músicas compostas por artistas de duas gerações, como mudanças do imaginário no Nordeste. Enquanto uma geração mais velha associa a chuva à seca e à miséria, a geração mais jovem desafia as desigualdades históricas ao trazer para as conversas atores esquecidos por artistas das gerações mais velhas, como os povos indígenas.

No tocante aos artistas, esta pesquisa possibilitou conhecer as subjetividades e os olhares deles/delas sobre a cidade a partir das experiências cotidianas. A nostalgia presente entre os artistas mais velhos e a denúncia da desigualdade social, do apagamento dos povos originários, entre os mais jovens, reforçam as questões abordadas anteriormente. Convém ressaltar que essa diferença não traduz um maior ou menor engajamento político de uma geração em detrimento da outra, uma vez que ao longo dos anos as formas de ativismos políticos se diversificaram. Acredita-se que isso seja decorrente do imaginário construído sobre chuva atrelada à seca, presente entre os artistas que compuseram as músicas inspiradas nesse antagonismo tão presente nas décadas de 1970 e 1980. Já os compositores dos anos 90 e 2000, que presenciaram as transformações imagéticas do Ceará, com estratégias de comunicação e de marketing para tornar o estado um produto turístico, afastaram-se dessa relação entre a seca e a chuva, prevalecendo nas letras das músicas a violência e a desigualdade social.

Um dos grandes desafios desta pesquisa foi trazer a música como ferramenta para compreender as implicações sociais, econômicas e culturais de um fenômeno climático em uma cidade com uma população de dois milhões e setecentos mil habitantes. As músicas sobre a chuva em Fortaleza mostram as realidades econômicas e sociais de uma cidade multifacetada e apresentam construções simbólicas particulares de diferentes gerações. Além disso, permitiu a compreensão das transformações culturais e urbanas. Acredita-se que a fomentação de estudos sobre as novas representações do Nordeste no cinema contemporâneo, nas mídias sociais ou em outras práticas culturais, contribuiu para revelar a natureza e a magnitude dessa mudança no imaginário associado a essa região nos últimos 20 anos.

 

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Data de Recebimento: 08/08/2023
Data de Aprovação: 05/05/2024


1  Tá bonito pra chover trata-se de uma expressão idiomática muito particular do Nordeste brasileiro, que se refere à presença de nuvens escuras no céu antes das precipitações.

2 Profetas da Chuva preveem boa quadra invernosa, Globo Play, 2015. Disponível em: https://globoplay.globo.com/v/3886894/

3  Tradução livre. Texto em original: “It the book argues that their experience of these Brazilian peripheries - particularly the hardship of illegal residence, housing building and land conflict - became both the context and the substance of a new urban citizenship.” (Holston, 2008, p. 4).

4  Tradução livre. Texto em original: “[...] the current cycle of drought and emergecy relief [...] has become an institutionalized form of adaptation to crisis recognizable and articulated within the larger model of patronage. When, however, local residents come to implore the arrival of drought because it triggers the government-relief mechanism, we pronounce this form of adaptation ironic in the sense that the process of relief reiterates the underlying causes that make people so dramatically vulnerable in the first place” (Nelson; Finan, 2009, p. 303).

5 Disponível em: https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2022/12/23/governo-federal-suspende-operacao-carro-pipa-no-nordeste.ghtml

6  Tradução livre. Texto em original: “nostalgia is the name we commonly give to a bittesweet longing for former times and space” (NIEMEYER, 2014, p. 1).

7  Tem poucas exceções notáveis, como, por exemplo, os diários de Carolina Maria de Jesus que visibilizam as experiências duma mulher favelada nos anos 1950 (de Jesus, 1962).

8  O romance O Guarani escrito por José de Alencar em 1857 conta a história de amor entre Peri, um indígena, e Ceci, uma mulher branca. Mostra a miscigenação entre indígenas e brancos.