Dos não-lugares à cidade senciente


resumo resumo

Lucia Santaella



cidade, o processamento da informação enraíza-se e é distribuído por toda a trama do cotidiano”. O que disso se espera é que sistemas de informação urbana serão capazes de “sentir e responder aos eventos e atividades que transpiram em torno deles. Imbuída da capacidade de lembrar, correlacionar e antecipar”, a cidade senciente poderá monitorar reflexivamente nosso comportamento dentro dela, tornando-se um agente ativo na organização de nossa vida diária (ibid., p. 111).

Outra obra fundamental para se pensar e compreender as cidades sencientes ou cidades inteligentes é a coletânea organizada por Shepard sob o título de Sentient City. Ubiquitous computing, architecture, and the future. Os diferentes artigos convergem para a discussão sobre as consequências, em seus mais variados aspectos, para os meios urbanos e seus modos de vida em que todos e tudo estejam interconectados e como a ubiquidade está transformando nossa relação com o mundo. Nossas cidades estão ficando cada vez mais inteligentes à medida que capacidades de processamento de informação estão se enraizando e se espalhando por toda a infraestrutura urbana. A ligação da computação ubíqua com as mídias locativas permite que as cidades sejam não só lidas, mas também escritas, pois qualquer informação que corre pelas redes pode ser acessada e compartilhada de qualquer lugar para qualquer outro lugar, por meio de tecnologias e serviços baseados em localização.

  Entretanto os diagnósticos e prognósticos não desenham apenas horizontes luminosos. Um dos aspectos mais importantes, e porventura preocupantes, da cidade senciente tem o nome de atenção ao contexto. Os dispositivos de rastreamento não se limitam a sentir onde alguém ou algo está, mas também rastreiam com quem se está e em que hora do dia. Além disso, essa informação em tempo real é correlacionada com os dados históricos dos padrões de mobilidade de alguém, disponibilizando a história, as relações sociais e as preferências pessoais, tornando possível predizer o que uma pessoa quer, o que ela necessita, mais ainda, o que uma pessoa é, e em que direções ela está preparada para agir. Em suma, um quadro muito bem encenado no filme Minority Report (2002), de Steven Spielberg.

Embora haja aspectos benignos em tal tipo de rastreamento, por exemplo, quando são aplicáveis aos sistemas de saúde e de segurança, há um conjunto de questões inquietantes que nos perseguem, entre elas, a que diz respeito aos limites em que se dá a perda da autonomia do indivíduo e das instituições civis e governamentais. Afinal, às vidas e instituições deveria ser preservado o direito inalienável de ter e guardar seus segredos.