Revista Rua


Poesia: línguas, sentidos, prazeres
Poetry: languages, senses, pleasures

Thalita Miranda Gonçalves Sampaio

"[...]canções de amor se parecem
porque não existe outro amor.[...]”
(Zeca Baleiro, Mundo dos Negócios)
 
            Consideramos que a linguagem não se apresenta como algo plano e de significado estático. Ela toma o formato de discurso a partir do momento que levamos em consideração as condições de produção da materialidade simbólica, numa relação com a memória. Desse modo, a linguagem passa a ser sistemas de signos, cujos sentidos não estão fixos, mas sim à deriva do jogo significante. Buscamos compreender neste trabalho os modos pelos quais o deslizamento polissêmico mostra-se nos procedimentos metafóricos da música Babylon (2000) do compositor Zeca Baleiro, pensando o poético enquanto propriedade da língua, pois segundo Pêcheux:
 
o poético não está fora da linguagem, não é algo restrito a um conjunto de efeitos especiais a ser usado em determinadas ocasiões. Ao contrário, pode-se conceber como uma propriedade da ordem da língua essa capacidade de deslizamento poético. Um deslizamento que incide no corpo da língua, em sua materialidade significante. (PÊCHEUX 2004, apud, MARIANI, s/d, p. 1)
 
            O poético é dado como propriedade da língua, pois é somente pela língua que há a possibilidade do deslizamento, da metáfora, do jogo entre as palavras e seus fonemas, seus significados, seus sentidos, por este aspecto a composição musical como toda a arte, está de certo modo, ligada ao desestabilizado dos sentidos, pois a música articula o poético da língua.
            Ao pensarmos em sentido, pensamos então em movimento. A língua enquanto estrutura se desloca de seu afixamento e passa a ser fluida uma vez que há um atravessamento ideológico, histórico e social daquele que a coloca em funcionamento, que por sua vez, ao formular o faz para alguém que também é atravessado. A língua passa então a ser possibilidade. É esse o real da língua e o que há são interpretações. Tomamos como deslizamento polissêmico essa possibilidade do simbólico presente na língua, que segundo Orlandi (2001, p. 36) “na polissemia, o que temos é deslocamento, ruptura de processos de significação. Ela joga com o equívoco”.
A análise do discurso é uma disciplina de interpretação. E por ser uma disciplina de interpretação trabalha com o não estabilizado na língua. Língua aqui, como possibilidade do simbólico, base ao mesmo tempo estruturada e furada. Ou seja, possibilidade do simbólico como inscrição de processos de significação nos quais se materializam a tensão entre o estabilizado e o não estabilizado, o mesmo e o diferente e o diferente no mesmo. Falar do simbólico em termos discursivos é falar desses processos de modo não estanque, é falar da paráfrase e da polissemia perpassando a fluidez do simbólico. (MARIANI, 2007, p. 13)